terça-feira, maio 13, 2014

Dois passos atrás

O meu amigo José Bouza Serrano, um embaixador da República que se diverte como ninguém com essa coisa das monarquias e da aristocracia, colocou hoje no seu Facebook uma foto de Philip de Edimburgo, que aqui "roubo".

Há uma arte que ninguém, como o príncipe Philip, duque de Edimburgo, marido da raínha Isabel II de Inglaterra, domina: estar sempre dois passos atrás da soberana, garantindo, não obstante, um lugar com suficiente proeminência na cena, a que a sua estatura também ajuda. Do príncipe, a História não reteve grandes tiradas e, bem pelo contrário, fixou mesmo algumas "gaffes". Não deve ser fácil ser príncipe consorte, mas, jogando o trocadilho, ele tem, no entanto, a sorte de sê-lo de uma raínha que é uma excelente profissional na função que exerce.
 
Conheci há já uns bons anos, na Noruega, uma simpática colega, diplomata equatoriana, de seu nome Marta Dueñas. Era casada com um norueguês "muito norueguês", daqueles que construíam (não sei se ainda constroem) as próprias casas familiares de madeira, ao longo de vários meses ou mesmo anos. Chamava-se Erik e recordo-me que tinha um humor já algo "sulista", por virtude do convívio com os amigos da mulher, como era o nosso caso.
 
Um dia, o Erik contou-me uma troca de palavras que teve com o príncipe Philip, durante uma visita de Estado da soberana britânica à Noruega. Como era de regra, após o jantar oficial, o protocolo ia convidando os diplomatas, por uma ordem vagamente próxima da respetiva antiguidade, para se aproximarem do rei norueguês - à época Olav V - e da sua convidada. Numa linha mais atrás, o príncipe Philip exibia o seu sorriso e deixava cair alguns comentários.
 
Quando a diplomata equatoriana e o seu marido foram apresentados aos reis, o duque de Edimburgo acercou-se de Erik e, num aparte só ouvido pelo dois, comentou: "você e eu temos uma coisa em comum: são as nossas mulheres que trabalham!" Erik não sabia o que dizer: ele próprio tinha uma exigente profissão e vir a ser toda a vida "consorte" da mulher era a última coisa que lhe passava pela cabeça. Mas não quis desiludir o príncipe e deixou escapar: "De facto, é um privilégio estar na nossa posição..." Não contava com a reação de Philip: "Privilégio?! Isto às vezes é muito aborrecido, pode crer! Para si não é?". O norueguês, que detestava cocktails e jantares oficiais, a que só assistia por virtude da profissão da mulher, achou que tinha ganho espaço para uma graça: "Ao menos, bebemos uns copos!" Ao que Philip, sorrindo, respondeu: "Pois hoje, a mim, de nada me valeu ainda ser marido da raínha! Ainda não consegui que me servissem um scotch..."    

5 comentários:

José disse...

Sempre é melhor um scotch do que um irish, um canadian ou um jack denials. Azar nítido. E a garrafinha de cow-boy?
Este Duque não é dos mais burros...

Silva.

Isabel Seixas disse...

Oh, resta saber se saberá fazer alguma coisita de casa, nomeadamente estrelar um ovo...Hum duvido que houvesse efetiva inversão de papeis , no caso e no contexto...Agora os dois passos atrás obviamente que são para bichanar, entre outras coisas.

Unknown disse...

Senhor Embaixador, sigo o seu blog diariamente há anos, e tendo já dado por mim, diversas vezes, com largos sorrisos dirigidos ao monitor, devo dizer-lhe que este seu "post" foi aquele que me fez cá vir comentar pela primeira vez. Aquilo que relata que aqui relata é uma delícia.

Muito obrigado pelas leituras diárias que nos oferece, pelas maravilhosas histórias que conta. Da próxima vez que o vir perderei a vergonha e dar-lhe-ei um cumprimento pessoal. A minha tenra idade não me permitiu ter coragem para o fazer, quando o vi recentemente no ISCTE, e a vergonha falou mais alto.

Cumprimentos.

João Faria

patricio branco disse...

são conhecidas historias e ditos do principe filipe divertidas como essa, mostrando um homem com grande sentido do humor

Anónimo disse...

Numa visita de Estado, ao entrar numa sala antes do jantar de gala, o Duque de Edimburgo abeirou-se de um diplomata fardado e cheio de condecorações e, pensando provocá-lo, perguntou: "Onde é que comprou tantas condecorações?". A resposta veio pronta: "No mesmo sítio em que Vossa Alteza comprou as suas". O Duque ficou sem palavras e seguiu caminho.

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