domingo, fevereiro 14, 2010

Imprensa lusa

É um quiosque na avenue Friedland, junto à Étoile, no topo dos Champs Elysées, bem conhecido dos portugueses que vêm a Paris. Durante anos, em passagens episódicas, era lá que me abastecia de imprensa portuguesa, muito embora os preços fossem, já então, muito elevados. Desde que vivo em Paris, compro sempre aí os nossos semanários.

Os donos do quiosque são um casal bem disposto, que anos de contacto com clientes portugueses já aculturaram, arriscando mesmo algumas palavras na nossa língua, quando se torna necessário sair de algum beco de incompreensão.

Todos os dias, a partir de quatro e meia da tarde, se os aviões não se atrasarem, por lá chegam os pacotes da nossa imprensa. À volta do quiosque, numa cavaqueira que tem como pretexto a espera pelos jornais, está quase sempre, desde há muitos anos, um grupo de mais de uma dezena de portugueses. Para eles, a prioridade são "A Bola", o "Record" e  "O Jogo", como não podia deixar de ser. E alguns jornais diários, em especial daquilo a que os ingleses chamam "popular press". A política doméstica não parece mobilizá-los muito, pelo menos a julgar pela relativa indiferença com que sempre os vejo olharem para o "Expresso", "O Sol", a "Sábado" ou a "Visão".

Este já clássico ponto de encontro lusitano nos Champs Elysées - sempre só homens, claro! - é, as mais das vezes, marcado pelos debates acesos sobre futebol. O forte léxico utilizado nalgumas das conversas convoca um conjunto de expressões de raíz bem popular, coloridos e sonoros plebeísmos que trazem à memória o ambiente das aldeias portuguesas, com os falares diferentes a identificarem bem as regiões de origem. São gente simples, muitos já reformados, que gozam agora as horas livres que justamente ganharam, depois de uma vida dura de trabalho em França.

11 comentários:

Julia Macias-Valet disse...

Ora aqui esta o "monumento" de Paris que o meu pai visita quotidianamente quando passa uns dias em minha casa.

Helena Oneto disse...

Quando cheguei a Paris, também lá ia, às vezes, comprar o Expresso. Agora passo sem parar. A fotografia que o Senhor faz dos "habitués" do quiosque é uma autêntica maravilha! Não lhe escapou nada, absolutamente nada dos lusitanos que cruzo há mais de 30 anos!

Nos anos 80, en plena época dos atentados às bombas, houve uma que explodiu, a escassos métros do quiosque, matando um português e ferido muitos outros.

Helena Sacadura Cabral disse...

Senhor Embaixador quando aí estou -o que felizmente é frequente - não falho!
A descrição que faz é um retrato fidedigno daquilo a que já tenho assistido.

Anónimo disse...

"sempre só homens, claro!"
Oh! a sério?!!!Não percebi o Seu Claro... Como anuência nem me parece Seu... Uma constatação? E as Senhoras?!!! Vão à missa?

Pois eu também iria a esse quiosque... "Sempre" "só" os homens...
Era o que mais Nos faltava.

Todo o restante poema é simplesmente enternecedor... é tão bom lê-lo logo de manhã.
Isabel Seixas

Francisco Seixas da Costa disse...

Cara Isabel Seixas: Vá lá, "ouça o ambiente" e depois diga-me se não entende o "claro"...

Vasco Campilho disse...

Bem me lembro deste grupinho. Nos meus anos de Paris pouco frequentei esse quiosque - costumava comprar o Expresso na livraria do João Heitor - mas quando por lá passava era exactamente assim...

Anónimo disse...

Como o Sr. Embaixador conseguiu retartar ipsis verbis o panorama desse quiosque.
Obviamente só Homens! Até porque eu, sempre que passo, nem me identifico, tal é a conversa...
Maravilhoso!

José Mello

Anónimo disse...

"Debates acesos sobre futebol. O forte léxico... "
Claro...
Isabel Seixas

Unknown disse...

Uma dica: embora com uma oferta bem menos diversifiicada, também se vendem jornais portugueses no quiosque da Place Saint-Michel em frente à Libraire-Papeterie Gibert Jeune. Vendem-se há muitos anos, desde antes do 25 de Abril.
Adolfo Ayala - um figura portuguesa desses tempos, nos dias em que não havia A Bola - nesses dias ia aos Champs Élyseés e seguia directamente para o Foyer onde trabalhava!, ia lá comprar o Século e o Diario de Lisboa (carrissimos!). "Grand Seigneur", quando chegava ao Le Mahieu, na Rue Sufflot, com os jornais deixava-nos dar-lhes uma olhadela!

Anónimo disse...

"Convoca" belas expressões portuguesas, lá isso "convoca". Mas as Senhoras são convidadas a mamter-se à distância, por favor.

Anónimo disse...

Oh! Fiquem descansados eu só queria ir lá dizer que também sou do Sporting clube de Portugal...
Quanto á verborreia considero-a manifestação primaria mas popular decerto... Logo por que não?!
Não preciso de a protagonizar até porque sei ... Que não é sensual...
Façam bom proveito.
Mas deixem-me ir a Paris a ver quem me impede de ir lá...
Isabel Seixas

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...