Estar em Nova Iorque, como embaixador, aquando dos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, tornou-me testemunha de um agravamento súbito das regras de segurança que passaram a vigorar em toda a sociedade americana e que logo se espalharam pelo mundo. Em particular, assisti à compreensível histeria que passou a marcar as viagens aéreas, dando origem ao modelo, mais ou menos generalizado, que hoje vigora e que transformou a generalidade dos aeroportos em locais desagradáveis, morosos e fatigantes.
(Uma curiosidade: três décadas antes do 11 de setembro, nos anos 70, recordo-me que o "shuttle" aéreo entre Washington e Nova Iorque funcionava da seguinte forma: colocávamos a bagagem num balcão, recebíamos uma senha para a recuperar mais tarde, davam-nos uma outra senha numerada para embarcar, os lugares não eram marcados e pagava-se o bilhete às hospedeiras já a bordo, durante a viagem. Controlo de segurança era um conceito desconhecido. Aqui sim, pode aplicar-se com propriedade a expressão "bons tempos".)
Ontem, ao viajar na TAP entre Lisboa e Fortaleza, dei por mim a refletir sobre o facto dos talheres da refeição serem todos de metal. E a recordar que, aqui há uns anos, no serviço de bordo de muitas companhias aéreas, mesmo em primeira classe e classe executiva, só havia, durante muito tempo, facas de plástico, mesmo já em épocas anteriores ao 11 de setembro. O curioso é que essa medida de "segurança" coexistia com o uso corrente de garfos metálicos e de copos, bem como de pequenas garrafas de vidro, instrumentos que, no caso de uma ação violenta, seriam tanto ou mais perigosos que as facas. Sendo que os riscos não parece terem diminuído, já me tenho perguntado por que raio de lógica, nesses tempos, as facas eram de plástico e sã hoje de sólido metal. Que mudança de critério terá tido lugar na cabeça dos especialistas? E, já agora, qual é a razão pela qual, ainda hoje, não nos permitem viajar com uma navalha ou um canivete mas, logo de seguida, nos põem à disposição facas metálicas?
Não se veja no que acabo de escrever uma qualquer defesa do regresso às sinistras facas de plástico, aliás inusáveis em bifes e com as quais tive "acidentes" gastronómicos que só quero esquecer. Mas devo reconhecer que, tendo hoje direito no voo a uma faca operacional à mão, só os meus bons instintos (e o bom senso) me impediram de a utilizar para ameaçar um bando de energúmenos, exprimindo-se numa conhecida fala ibérica, que arengaram e gargalharam alto durante as mais de sete horas da viagem, não deixando descansar quem o consegue fazer em aviões ou quem, como é o meu caso, não conseguindo dormir, quer simplesmente ler, trabalhar e que ninguém o aborreça.