À margem de um encontro internacional, fui um dia apresentado à mulher do então ministro sueco do Comércio, Leif Pagrotsky. Sabendo-me português, dirigiu-se a mim num espanhol com ressonância latino-americana. Tal como o seu marido, era muito pequena de estatura e também muito morena, num contraste evidente com o estereótipo da sueca. Explicou-me ser de origem uruguaia e chamar-se Iskra. Não consegui conter a curiosidade e perguntei-lhe, um tanto a medo: "O seu nome tem alguma coisa a ver com um jornal?...". Ela sorriu, surpreendida: "Conhece o Iskra?" Confirmei que, como alguém com passado marxista, não me era estanho o nome do "Iskra", um jornal editado por Lenine. A simpática uruguaia-sueca, arquiteta de profissão, revelou-me que a sua mãe, comunista uruguaia e devota de Stalin, decidira dar-lhe esse incomum nome.
O jornal Iskra, publicado na clandestinidade, teve uma existência breve, nos primeiros anos do século XX. A palavra "iskra", em russo, significa "centelha" ou "faúlha" e o lema do jornal era "da centelha surgirá a chama", simbolizando a propagação da ideia revolucionária.
Lembrei-me do Iskra há horas, na RTP, antes de entrar no ar para uma conversa com Ana Lourenço, ao ver imagens da agitação que abala Marrocos.
Há seis anos, um vendedor de fruta tunisino Mohamed Bouazizi imolou-se em protesto. Começou aí a "primavera árabe" que levou à deposição do ditador Ben Ali e ao sucesso da democracia no país. Ele foi a "iskra" que espoletou todo o movimento.
Agora, num cenário político diverso, mas nem por isso sem algumas similaridades óbvias, um vendedor de peixe marroquino está a suscitar ondas de protesto no nosso segundo vizinho mais próximo (embora, em linha direta, a distância de Rabat a Lisboa seja menor do que a que separa as capitais portuguesa e espanhola).
Poderá este incidente ser a "iskra" para um movimento de natureza idêntica? E há a certeza de que o resultado de uma mudança política em Marrocos se fará no sentido do reforço da experiência democrática que por lá hoje vigora? Quando se lança o fogo numa pradaria, nunca se sabe para que lado acabará por soprar o vento.
7 comentários:
Atenção que agora temos aqui um Professor Doutor, o Lavouras, mas deve ter sentido vergonha e então afrmou isso no anónimato.
Uma correcção: o vendedor de fruta não foi assassinado pela polícia. Suicidou-se em protesto. Imolou-se em frente à esquadra.
Agradeço a precisão ao Anónimo das 18:01. Já corrigi
Caro Chicamigo
Ai, o vento! Para onde soprará?... Os bombeiros dizem a mesma coisa...
Abç Henrique, o Leãozão
Alguem com passado marxista continua marxista...
Tão simples como isso.É que não se entende que em Portugal,nos anos sessenta e setenta,sendo já conhecidos os
extreminios de milhões de russos ordenados por Stalin,alguem pudesse ser marxista.Se o era,continua a sê-lo!
Arrependidos,só na Biblia.
camarada anonimo
o marxismo é uma teoria para analisar a historia. nao é a unica. é uma ferramenta para historiadores etc. nao é um movimento politico. pode-se muito bem nao ser de esquerda e fazer analises historicas utilizando as teorias da escola marx. ou nao.
e a proposito do ze dos bigodes imagino que nao é o facto de um serial killer ser do benfica que implica que todos os benfiquistas sao serial killers, ou é? é que do ponto de vista logico a sua afirmacao é equivalente a esta.
se quiser falar dos seus espantos, angustias ou do que seja for basta dizê-los, penso que ninguem lhe levara a mal por isso. nao vale a pena, a meu ver, posso estar enganado, é utilizar argumentos que nem sequer do ponto de vista da logica estao correctos.
bem haja
Também pensava até uns meses atrás que, em linha direta, Rabat fosse mais próxima de Lisboa. No entanto, a acreditar em vários desses sites que calculam distâncias, afinal não é verdade. A diferença não é muita mas, a voo de pássaro, Lisboa e Madrid estarão separadas por 503 km, enquanto a distância entre Lisboa e Rabat será de 561 km. Por estrada Madrid está bem mais próxima (626 km contra 878, contando com o barco).
Luís Quartin Graça
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