domingo, maio 24, 2015

Sem saudades

Náo há nenhuma razão particular nem nenhum motivo próximo para que aqui recorde uma pequena historieta que o meu pai me contava, em criança, e que sempre muito me impressionou. Só o facto de a ter relatado a um amigo, hoje, durante uma conversa.

Era a propósito de um cavalheiro que, nos anos 20 do século passado, estava emigrado no Brasil. Era um homem relativamente abastado, pelo êxito obtido nos seus negócios. Para trás, deixara a família, numa aldeia nos arredores de Viana do Castelo. Cada três ou quatro anos, regressava à terra, nessas longas viagens de barco que o aproximavam ou separavam da mulher e dos filhos.

Invariavelmente, o convívio com a família distante "acabava mal". Depois de algumas discussões, que se agravavam nos últimos dias da sua estada na aldeia, acabava quase sempre por bater nos filhos, numa atitude que chocava os seus amigos.

Um deles ousou um dia perguntar-lhe a razão desse comportamente, tanto mais que os filhos manifestamente gostavam dele e sofriam com a sua ausência. A resposta do homem, na rudeza de uma cultura comportamental em que a exposição do afeto não era muito comum, foi surpreendente: "É porque gosto muito deles que lhe bato, nas vésperas da minha partida. Vou estar de novo fora muito tempo, até posso morrer por lá. Por isso, ao bater-lhes, espero que sofram menos com a minha ausência, que tenham menos saudades de mim"

8 comentários:

Graça Sampaio disse...

Que maneira estranha de mostrar-lhes o seu amor... (Nesses tempos, não se mostravam os afetos e muito menos os homens...

Anónimo disse...

Já contou essa.

Francisco Seixas da Costa disse...

Ao Anónimo das 22.40. Também temia isso, mas procurei e não encontrei. Podia dizer-me a data?

Anónimo disse...

Agora percebo a essência e profundidade das ultimas intervenções do Supremo Magistrado... o conceito é o mesmo...

Carlos Andrade - Espinho

Anónimo disse...

Procurei e ora aqui está, mas em versão condensada: http://duas-ou-tres.blogspot.pt/2013/03/aposentacao.html
Sempre às ordens.

Anónimo disse...

Lá se foi e memória de elefante do Francisco.
É a idade que não perdoa. meu caro.

Anónimo disse...

Um pormenor que espelha bem de como era a emigração para o Brasil no seculo IXX e inícios do seculo XX: A mulher e os filhos em Portugal e o marido procurando fortuna por lá, para quê!...

Anónimo disse...

car@ anonim@ das 17h52

como para quê?

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...