Existe, em diversos setores da sociedade portuguesa, a convicção de que a concretização da futura Parceria Transatlântica para o Comércio e para o Investimento (vulgo TTPI) poderia trazer vantagens para o país. Porque penso dessa forma, coordenei, há meses, um processo que culminou num debate que moderei na Culturgest sobre o assunto e participei num exercício idêntico organizado pelo Instituto de Defesa Nacional, em diálogo com o delegado da Comissão Europeia em Washington.
O governo mandou preparar, entretanto, um estudo sobre o tema, no qual é feita uma análise prospetiva, em termos de vantagens/inconvenientes, desse possível acordo. Na semana passada, tive ocasião de abordar o assunto, uma vez mais, aquando das Jornadas Empresariais da AEP, no Porto.
Tinha a ideia de que o governo estava de boa fé nesta matéria, na qual tinha sido muito ajudado, ao tempo da anterior legislatura do Parlamento europeu, pelo presidente da Comissão que essa mesma instituição comunitária tinha encarregado de acompanhar o tema TTPI, o socialista Vital Moreira.
Verifico hoje, com alguma surpresa (para mim, a última) que, também aqui, a espertalhice liberal acabou por prevalecer sobre o alegado interesse em manter, sobre uma temática desta relevância, um consenso político nacional alargado. Com efeito, o "Público" de hoje revela que o governo português subscreveu, com 13 outros executivos da mesma laia ideológica, uma carta (secreta, claro) à Comissária indigitada para a pasta do Comércio a reclamar a inclusão de um "investor-state dispute settlement", que pretende limitar o papel dos tribunais nacionais na regulação de conflitos em matéria de investimentos, criando um mecanismo próprio quer se sobreponha à soberania dos Estados. Trata-se de uma leitura radical do mandato aprovado no Conselho, a qual, a fazer vencimento, seria um favor negocial antecipado num processo em que a Europa tem a estrita obrigação de proteger os interesses dos seus Estados.
O próprio novo presidente da Comissão, Jean-Claude Junker, que é oriundo da área conservadora mas não se costuma deixar dominar completamente pelas teorias liberais, foi muito claro na rejeição liminar desta posição. E esperamos que a sustente. Sabe-se que a Alemanha apoia Junker e se opõe à leitura (também) portuguesa. Por uma vez, talvez houvesse vantagem em que o seguidismo acéfalo de Lisboa face a Berlim tivesse sido respeitado...
Como se vê, nem em temáticas de Estado com esta seriedade, em que importaria manter um alargado consenso nacional interno, o governo se sabe comportar. Com franqueza e sem qualquer ironia, pergunto: será que o senhor ministro dos Negócios Estrangeiros, dr. Rui Machete, teve antecipado conhecimento disto?
9 comentários:
A atribuição de jurisdição a tribunais arbitrais quanto a conflitos entre empresas e Estados, para além de enfraquecer a posição negocial destes face às multinacionais, abre a porta a imprevisíveis mas potencialmente grandes indemnizações a pagar pelos Estados. Não deveria ser assunto em relação ao qual a posição portuguesa fosse estabelecida por uma carta nebulosa.
Se Rui Machete tivesse tido conhecimento dessa carta, nós já teríamos ouvido falar dela muito antes.
boa pergunta, creio que não.
Fiquei escandalizado ao ler esta notícia no «Público».
Portugal, a UE e, de um modo geral, o Ocidente estão montando uma superestrutura jurídica que coarta inelutavelmente o poder dos povos decidirem o seu destino. Receio que, mais decénio, menos decénio, a única saída venha a ser uma revolução mais sangrenta e global que qualquer outra no passado
José Neto
Senhor Embaixador:é cada vez mais evidente que seja qual for a area governativa que analisemos só vemos irresponsabilidade.
E,dado que factos como o que refere não são diviguldados com amplitude nos orgãos chamados de comunicação social, em especial TV e Radio públicas-mais empenhadas em crimes e similares- tudo passa quase despercebido.
...Um Anti-Cristo se levantou na EUROPA.
Os exemplos da Argentina, Equador e da Australia, no caso Philip Morris demonstram o lado mais negro das arbitragens internacionais. Porém, a não inclusão dessa mesma clausula irá levar, talvez, a um conflito de Estados Soberanos. Nesse caso, que instituição terá jurisdição ? O Tribunal Internacional de Justiça será a hipótese mais credível. A nível europeu, a "rule of law" e a separação de poderes são aspectos intrínsecos dos Estados e da democracia europeia. Porém, o que seria do investidor em países onde não há uma separação dos poderes e os tribunais sao monopolizados pelos governos ? A inclusão de tais claúsulas acabam por ser uma salvaguarda para os investidores, para que não haja nacionalizações abusivas. O que eu creio que pode ser feito é uma redefinição de certos conceitos como "fair and equal treament", "most favoured nation" de forma a não haver um uso abusivo dessas claúsulas.
O Secretário de Estado para os Assuntos Europeus, Bruno Maçães (guru e ex-assessor do PM Passos) foi o proponente pela nossa parte, ou seja, quem se chegou à frente e fez Portugal alinhar nessa história, circundando o Ministro. Maçães e Machete estão de costas voltadas, o que já não é segredo para ninguém no MNE (ao nível da hieraquia). Não espantaria pois que Maçães não tivesse dado, antecipadamente, conhecimento desta sua iniciatica (que, porém, foi do conhecimento prévio do PM Passos). Machete está claramente diminuído na sua acção como MENE, torpedeada pelo Vice-PM, Paulo Portas (que se calhar julga ainda ser um meio-MNE) e pelos seu S.E Bruno Maçães. Nunca um Ministro (de Estado e) dos Negócios Estrangeiros teve a vida tão dificultada, minada (e diminuída). Mas, as coisas são como são. Maçães dá-se mesmo ao luxo de numa reunião em substituição do Ministro, em Bruxelas, apresentar um “non-paper”, cujo teor era desconhecido dos serviços competentes e sobretudo do Ministro, relativo a uma matéria sensível. O que acabou por vir a constituir uma surpresa (pouco simpática) nessa reunião do conselho. Aos poucos, o ultra-liberal Maçães vai tomando as rédeas do poder no MNE. E já viu o seu chefe de gabinete demitir-se e partir para outra.
a)Rilvas
As teorias do Rilvas são o guião perfeito para um filme de espionagem.
a)Mata Hari
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