Andar por Vila Real, neste tempo de eleições, lembra-me um ano em que por aqui fui candidato autárquico à presidência da Assembleia municipal. O meu principal adversário chamava-se Passos Coelho - não esse em que estão a pensar, mas o pai, médico na cidade. Foi há 17 anos. A lista pela qual eu concorria como independente, a lista do PS, estava à partida condenada à derrota, num concelho que, à época, era inabalavelmente PSD.
Estando no governo, tinha muito escassa disponibilidade para fazer campanha local. Intervim apenas num grande jantar na cidade, com largas centenas de pessoas, na presença de Almeida Santos, e num comício numa aldeia próxima. É desse que vou falar.
Uma noite, fui com o candidato à presidência da Câmara, Ascenso Simões, à Campeã. As freguesias rurais eram então a chave das sucessivas vitórias do PSD, dado que a cidade já então tinha "virado" à esquerda. Havia, por isso, que tentar inverter aquelas onde o desequilíbrio não era tão acentuado, onde havia hipóteses, ainda que remotas, de ganhar a Junta de Freguesia. A Campeã era uma delas.
O espaço coberto do comício, com toda a gente de pé, não era muito grande. Mas, surpreendentemente, estava bastante cheio. Embora a nossa entrada não tivesse provocado um especial júbilo, notei a juventude maioritária daqueles que nos iam ouvir e, cá para mim, devo ter pensado: "Isto é malta nova! Pode significar alguma coisa".
Lá fomos para o palanque e começaram as arengas. Depois dos responsáveis locais e do candidato à Junta, antecedendo a "estrela" que era o candidato à Câmara, falei eu, aí por uns dez minutos. Sem grande prática deste tipo de exercícios, não trazia a "cassette" que as repetidas intervenções eleitorais sempre justificam. Imagino que deva ter tratado das carências em acessos viários e em saneamento básico, bem como de uma ou outra ideia "desenvolvimentista", provavelmente referindo a Europa, que à época me ocupava.
Para o que aqui interessa, devo dizer que fui verificando que a reação das pessoas não era excessivamente entusiástica, face àquilo que eu dizia, "to say the least". Aquela gente jovem ouvia-me com um ar algo neutro, respondendo com manifesta parcimónia às palmas que, a espaços, alguns "claqueiros" partidários iam estimulando, estrategicamente espalhados pelo espaço do comício. Sem especial jeito para a função oratória, eu continuava a lançar algumas "catch-phrases" que achava adequadas ao terreno, às vezes num tom esforçadamente irónico e humorístico, com o mínimo de agressividade política que a situação justificava. No final, aqui entre nós, fiquei com a sensação que foi com algum alívio que o auditório me viu terminar o discurso. Talvez as palmas, simpáticas, com que foi acolhido o termo da minha intervenção significassem isso mesmo. Pouco mais.
Já no automóvel, inquiri da avaliação que os "experts" políticos locais haviam feito do exercício. "Não esteve mal", foi o mais entusiasmante que ouvi. Até que um deles disse, críptico: "A sala estava "composta". A banda foi boa ideia!".
A banda? "Que banda?", perguntei, surpreendido. Foi então que soube que, após o comício, subiria ao palco onde estivéramos uma banda de música "pimba". Aquela gente jovem que enchia o espaço, que eu ingenuamente pensara ali congregada pelo apelo da "boa nova" do socialismo transmontano, mais não estava do que a tomar lugar para o concerto que logo nos sucederia. Estava assim bem explicada a relativa "secura" da receção. No caminho de regresso a casa, fui imaginando a animação que deveria ir então por aquela sala, agora já liberta das palavras da política e tomada pelos êxitos de Ágata, Emanuel & companhia.