Placa ontem inaugurada na antiga EPAM
A questão tinha surgido ainda antes do 25 de abril. Em reuniões de milicianos ocorridas em vários locais de Lisboa, alguns de nós, politicamente mais radicais, alimentávamos dúvidas sobre se o "movimento dos capitães", que então se desenhava e sentíamos cada vez mais próximo da ação, comportava os "mínimos" ideológicos que então considerávamos indispensáveis: uma orientação socializante e, muito em especial, uma atitude inequívoca face ao fim da guerra colonial.
A implicação de alguns de nós no golpe foi, assim, condicionada e até, em alguns casos, reticente. Temíamos estar a dar aso e colaboração a uma qualquer "quartelada", com um resultado político duvidoso, que acabasse por se afastar das nossas ideias.
Na noite do 25 de abril, a intervenção de Spínola na televisão não nos sossegou, talvez antes pelo contrário. A mim, a leitura do programa do Movimento das Forças Armadas deixou-me algo alarmado. É que as ambiguidades sobre o processo político subsequente, sobre a questão colonial e mesmo sobre a PIDE/DGS eram mais do que muitas. Mal imaginávamos nós - mas devíamos ter imaginado, claro! - que esse texto fora produto de laboriosos compromissos e que era o denominador comum possível.
Lembro-me que, logo no dia 26, quando o novo comandante da unidade, coronel Marcelino Marques, se apresentou aos oficiais, eu tomei a palavra, em nome de um grupo de milicianos, para inquirir sobre o verdadeiro sentido da expressão, contida no programa do MFA, onde se falava de uma "política ultramarina conducente à paz", muito longe da disposição para encetar negociações com os movimentos emancipalistas africanos, que reputávamos essencial.
Esse terá sido o primeiro de vários momentos de alguma conflitualidade que eu haveria de titular, durante o tempo que se iria seguir, descontente com o caráter "recuado" da prática política do MFA. Poucas semanas após o golpe militar, no discurso que proferi, durante o juramento de bandeira dos cadetes, fiz uma forte crítica ao comportamento do MFA perante uma greve na TAP, numa implícita denúncia da recente detenção de dois colegas. Alguns jornais ressaltaram essa minha voz dissidente. Por virtude dessa tomada de posição, fui chamado ao Estado-Maior do Exército, onde me foi sugerida uma mudança de unidade, porque a minha continuidade na EPAM começava a tornar-se incómoda. Essa saída acabaria por acontecer, uns dias depois, quando me dissociei de uma punição dada a um soldado-cadete, já não sei bem porquê. Por isso, lá para o fim de maio ou início de junho de 1974, acabei por ser "empurrado" para a Comissão de extinção da ex-PIDE/DGS e LP. Só ontem, dia 25 de abril de 2014, regressei à EPAM.
Hoje, olhando para trás, confesso que não posso deixar de sorrir. Ou melhor, de rir um pouco de mim mesmo nesse tempo.
6 comentários:
Vinha pedir-lhe um favor. Passos Coelho disse hoje que é preciso regar a Liberdade e a Democracia. É que em Vila Real, " regar " é mentir, estás a regar, é estar a mentir. Ora como ele estudou lá,muito aprendeu em VR, ninguém melhor que FSC para explicar o verdadeiro sentido da expressão,aos que não conhecem a Bila !
E também há o Regadinho, aquela borga dos estudantes...
A propósito desses compromissos e das diversas correntes dentro do MFA eu lembro-me da "ponta de um iceberg" que observei na chegada de Fabião à Guiné como novo governador: no primeiro discurso terminou dizendo: "Por uma Guiné melhor num Portugal renovado"! No dia seguinte passaram o dia na rádio a dizer que houvera um lapso o que o novo governador queria dizer era "Por uma Guiné melhor e um Portugal renovado"!
tudo estava tremido, pouco definido, uns a puxar para um lado, outros para o outro, o pr
oprio spinola foi um compromisso, não era anticolonialista nem um verdadeiro democrata, foi o que era possivel e não se podia perder tempo.
curiosa tambem a escolha do 1ro pm, quem o indicou? e curioso que era civil.
apesar das hesitações de spinola, o problema ultramarino começou logo a ser negociado e mario soares voou logo para dakar para conversas com o paigc.
lembro me tambem dum encontro na ilha do sal entre spinola e mobutu.
em setembro, a demissão de spinola mostrava complicadas divergencias internas entre os militares.
até houve prisões politicas, nesses primeiros meses, à dta e à esqda, saldanha sanches e outros
trabalhar na comissão de extinção da pidedgs devia ser interessante.
Referente ao comentarista jj.amarante: Um "n" faz toda a diferença, naquele tempo, hoje nem com todo o alfabeto...ah ah ah ah ah
"por isso, lá para o fim de maio ou início de junho de 2014..."
presumo que seja 1974.
cumprimentos
pegando no comentário de jj amarante, lapso compreensivel, logo corrigido.
sobre fabião, tive oportunidade de assistir à partida de carlos fabião da guiné em finais de setembro ou outubro de 1974, foi um avião da tap buscá lo, no aeroporto de bissalanca o senhor mostrava se inquieto, como está a situação em lisboa, perguntava aos pequeno grupo que tinha chegado no avião.
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