terça-feira, março 25, 2014

"Ni-ni"

A maioria dos observadores das eleições municipais francesas coloca o bom resultado obtido pelo Front National como o mais preocupante sinal do estado de espírito do eleitorado.

Não considero irrelevante esse facto, mas acho muito mais perigosa a deriva que se está a verificar no seio da direita democrática, representada pela UMP, que expressamente rejeita respeitar a "regra republicana" de aconselhar o voto, nos círculos onde os seus candidatos não possam ser eleitos, no candidato da área democrática que melhor colocado estiver para derrotar o representante da extrema-direita. 

A direita francesa confirma assim que passou definitivamente a não respeitar uma regra não escrita da política democrática desse país, que vigorou desde o fim da ocupação nazi e que, pela primeira vez, foi posta em causa pela liderança da UMP, titulada por Jean-François Copé, nas eleições legislativas de 2012. Para a direita, passa a valer uma linha já conhecida por "ni-ni" ("ni Front National, ni "front republicain" "). E não deixa de ser significativo que Copé seja agora seguido nesta orientação pelo antigo PM François Fillon, que, em 2012, usou uma formulação menos "neutral". Ao colocar-se numa equidistância entre a esquerda e a extrema-direita, como que equiparando-as em dignidade política, os conservadores franceses demonstram estarem crescentemente reféns de um eleitorado cujo "mainstream" se deslocou bastante para a direita. E isto não é uma boa notícia.

Termino lembrando duas coisas: que a esquerda apelou, em 2003, ao voto maciço no candidato da direita às eleições presidenciais, com vista a derrotar Jean-Marie Le Pen, e que também, no próximo domingo, a mesma esquerda apelou já a que o seu eleitorado vote nos candidatos da UMP, sempre que essa seja a forma de afastar candidatos do Front National. 

6 comentários:

Anónimo disse...

Atitude inadmissível, inconsciente ou perigosa de Copé e companhia. " Mutatis mutandis", igual à do Ocidente perante a Rússia. Estaremos outra vez em 1938? A História repete-se, com Vichy em França e a democracia vergada perante o inimigo na Europa. J.M. Le Pen, que nunca devemos desprezar, já veio dizer que Putin tinha toda a razão em relação â Ucrânia. Preparem-se para o pior. Ainda não vimos nada, apesar de, há setenta anos, termos visto tudo. A memória é curta.

Anónimo disse...

Pois é, mas eu recordo-me perfeitamente da emoção que os portugueses, tanto os de Portugal como os do exterior, viveram ao célébrer o 25 de Abril comparativamente à emoção com que se festeja hoje.
No 25 de Abril de 74 a raiva dos portugueses virou a festa e manifestações de alegria incomensuráveis...
Para mim aquelas manifestações tiveram o seu paralelo em França no 8 de maio de 1945 quando a Alemanha capitulou e as ruas encheram para manifestar a derrota do fascismo. Para mim as emoções têm aqui o seu paralelo.
Mas quem se lembra hoje do 8 de maio e da sua significação ?
E quem se lembra do 25 de Abril e da sua significação ?
De Gaulle foi um combatente do fascismo. Presenciou os efeitos des avassaladores do fascismo e deixou regras intransponiveis na orientação do seu Movimento que esta canalha de hoje esqueceu.
José Barros

Anónimo disse...

pensava que 20 por cento dos votos teriam direito a representacao em democracia...

a questao da eleiçao de candidatos do fn nao é uma questao sobre a extrema direita

é um sintoma de uma sociedade e democracias doentes

e essas sim deviam ser as preocupacoes dos politicos, nao a eleicao de um ou outro estarola do fn


cumprimentos



Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Anónimo das 13.50: o Front National é um partido legítimo e, não ofendendo as regras democráticas, tem o seu lugar natural na vida política francesa. A sua ideologia, porém, afasta-se de alguns valores que, até agora, iam da esquerda à direita democrática. Já não vão. É a minha opinião. Outras haverá, claro.

Defreitas disse...

Desde a colaboração do regime de Vichy que a direita francesa namora com o fascismo . Data dessa época o famoso slogan da direita " antes Hitler que os comunistas"! Conhecemos o resultado : 60 milhões de mortos. Hoje, o "ni-ni" é a mesma coisa.

No caso actual das eleições municipais francesas, a "porosidade" entre o FN e o UMP é flagrante. Como muito bem escreve, Copé deu desde há muito o sinal da partida para o mais vergonhoso enlace do fascismo e dos conservadores, esquecendo o exemplo da esquerda que votou como um só homem quando foi imperativo travar Le Pen na marcha para o Elysée.

O que lamento mais é o facto que a classe desfavorecida se tenha voltado para o FN, devido, segundo eles, à incapacidade dos dois principais partidos , socialista e UMP, a resolver os problemas .. Mesmo se a direita legou uma tal situação, a evolução aparece aos olhos dos interessados como lenta demais a produzir efeitos visíveis de todos. Claro que em 22 meses era difícil de tudo tratar ao mesmo tempo. Mas as pessoas menos politizadas reagem radicalmente sem analisar os factos.

Claro que todos sabemos que o FN não vai resolver os problemas e o seu programa deixa antever que os iria complicar ainda mais se chegasse ao poder; o que nunca acontecerá!

Resta que a direita conservadora francesa, UMP e CDI, estão bem de acordo com certas teses do FN , particularmente as que respeitam a emigração e a evolução da sociedade.

Mesmo se o peso do FN, contas bem feitas, não é superior a 4,8% dos votos exprimidos na primeira volta, enquanto os dois grandes partidos tiveram mais de 35%, o facto é que a sua presença nos conselhos municipais será fonte de disseminação de ideias e de valores contrários à democracia

Anónimo disse...

caro embaixador

também é essa a minha opiniao

mas a questao é, porque é que 20 por cento dos franceses procuram um partido como o fn? porque têm sucesso os dieudonnés e afins? e finalmente, sera que nao permitir a expressao desse tipo de ideias populistas desaguisadas e sem nexo é a melhor maneira de as fazer extinguir? temo que nao. que pelo contrario o comportamento e o panico do ps e da ump, em tudo têm ajudado ao crescimento do fn. o uso que durante anos foi feito da frente republicana obrigou o fn a ter que ser um partido melhor e mais organizado. o que era exactamente o que nao convinha..



cumprimentos





Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...