O meu aviāo era muito cedo. Devia partir do hotel, em Tóquio, cerca das seis da manhā. Na noite anterior, perguntei se haveria táxis à porta do hotel, a essa hora.
(Andar de táxi, no Japão, é uma experiência única. Os taxistas não falam uma palavra de outra língua que não seja o japonês, não entendem geralmente os nomes escritos em carateres não nipónicos, usam luvas brancas e gritam coisas incompreensíveis e ameaçadoras quando, dentro ou fora do carro, pretendemos abrir uma porta - que só se abre, automaticamente, por sua ordem. E, na irrepreensível limpeza do interior das viaturas, há nos encosto de cabeça uma espécie de naperons de renda, como antigamente por cá se viam nas prateleiras de certas casas. E não aceitam gorjetas, claro!).
Na receção do hotel, entre sorrisos, foi-me confirmado, por imensos "Yes, Sir!", que os táxis estariam por lá. Por prudência, entendi dever reservar um, por antecipação. Era possível? "Yes, Sir!", claro que era. Escrevi a hora a que pretendia o táxi e o número do meu quarto num papel, entregando-o ao empregado. Anuiu a tudo, guardou o papel, desejou-me "Good night, Sir!" e lá fui tentar dormir.
Dia seguinte. Seis da manhã. Receção do hotel. Outro empregado. Perguntei pelo meu táxi. "Taxi, Sir? Want a taxi, Sir?". Expliquei que tinha "encomendado" um, na véspera. Sorriu. Repetiu: "Want a taxi, Sir?" Enfureci-me: "I want MY taxi! I ordered a taxi for 6 o'clock!". O empregado, vendo o meu estado, fez uma cara de desapontamento e incompreensão: "Your taxi, Sir?". "Yes, my taxi, to go to the airport!". Um súbito sorriso iluminou-lhe o olhar: "Oh! Airport? Taxi, Sir! Follow me!" E lá me levou para a entrada, para apanhar o primeiro táxi que apareceu na fila. Despediu-se, às vénias. Sorridente. Missão cumprida. Comigo já a relaxar, de cabeça encostada às rendas do táxi, entre a vontade de dormir e o desejo de apreciar o nascer do dia na cidade estranha. Huntigton chamava a isto "Clash of Civilizations". Imagine-se agora o que deve ter sido a chegada dos portugueses ao Japão.
(Não resisto a terminar com a tese que ouvi um dia a um fulano, antigo colega de escola primária, que teimava em ligar a expressão "gueixa" ao termo português "gaja". Ele explicou-me: "O nosso pessoal, à chegada, lá no século XVI, começou a chamar ao pequename local "gajas" e, vê lá tu!, eles habituaram-se. Até hoje!")
10 comentários:
Essa das gueixas e das gajas, está bem esgalhada.
Marialvices.
JC
Recordo que pronunciavam "takusi" (taxi) e essa da porta do "takusi" que queremos abrir do exterior e que só o condutor pode abrir, surpreendeu-me também, no inicio!
O meu agente no Japão era um " kirishitan" (cristão )e tinha um jazigo de família no cemitério cristão de Yokohama.
Fizemos muitas vezes o balanço das palavras portuguesas que ficaram para sempre na língua japonesa, tais como o famoso "tempura", empanado de peixe e legumes fritos, delicados e sempre fresquíssimos, ( os japoneses comiam-nos crus ou cozidos), nome que viria das "têmporas" ou dias nos quais os cristãos não comiam carne.
E como esta, muitas outras palavras : "biidoro" (vidro), "botan" (botão), "furasuko" (frasco), "kappa" (capa-impermeàvel), "koppu" (copo),, "pan" (pão), "rozario" (rosário), "sabato" (sábado) "shabon" (sabão), ), "shōro" (choro), "shurasuko" (churrasco), "iruman" (irmão, missionário) .
Pessoalmente gosto muito da palavra "kandeya", que a "vela" substituiu.
E, a palavra "né", que se ouve quase em cada frase, e que seria "não é ?" !
Claro que esta influência não os impediu de , em 1639, em Nagasaky, suspender os Portugueses pelos pés, cabeça para baixo, para travar a expansão do catolicismo.
Existe uma página na Wikipédia que indica muitas outras palavras.
Caríssimo, eu li em tempos não sei onde, acompanhado com uma montagem da chegada ao Japão,cuja, tinha dum lado, Japoneses e do lado português 2 brancos e 1 africano. Os Japoneses ao verem o africano fugiram. Foi há 500 anos.
Deve ter sido algum Vilhena o autor!
cumprimentos
La gueixa/gaja nao direi mas sacana/peixe(ou pobre pescador) isso ja e outra loica!
Quanto a luvas brancas mais que nos taxis abismei-me com os funcionarios do Metro, na plataforma, com luvas brancas, tendo a certeza que o "rebanho" entrava ordeiramente na carruagem.
Lembrei-me deles na semana passada durante a greve do Metro. Tinham dado uma ajuda....
Saudades de Londres
F. Crabtree
Francisco.
Eu achei muita graça na historia!
com carinho Monica
Caro Francisco
Aconteceu-me uma idêntica no hotel onde se rodou o Lost In Translation. Com a agravante de ser mulher...
E a descrição que faz é perfeita. Só lhe faltou o longo espanador com que o "meu motorista" limpava qualquer molécula de pó que o carro tivesse!
perdido na tradução, lost in translation, uma comica satira ao por em confronto japoneses e ocidentais, tal como esta divertida entrada que mete taxis e gueixas e portugueses com teorias interessantes sobre a influencia duma palavra portuguesa adoptada pelos japoneses para apontar o pequename local...
Curiosa a derivação destes últimos posts...
Primeiro, as mensagens subliminares, daquela espécie das visões cartesianas adaptadas à analise da sexualidade, que dissocia sexo prazer(moralmente condenável) de sexo para procriar(tédio aprovado pela moral)...
Também o pensamento (irritante)estanque de que as profissionais da profissão mais antiga do mundo não têm arte com inclusão na moral altruísta
(Coitadas até pela paciência de não poderem na maioria dos casos reservar-se o direito de admissão) aspeto desde logo refutado pela procura e entusiasmo da procura...
Daí que o termo gaja soa neste contexto, dada a origem apontada, muito mais... Afrodisíaco...
Agora o titulo do post, perdeu-se por aí no táxi, pois não me parece haver analogia com o termo "gaja" ...
Lembrei-me entretando do livro de James Clavell Xógum, em que a protagonista do romance oferece ao amado uma noite de delicias com uma gueixa(com admiração e atribuição de idoneidade de expert pela sua arte de estimulação sensorial...) como um presente, assim tipo uma flor no dia dos namorados...
(para os românticos, altruístas claro ...)
"Xógum de james Clavell é uma fascinante saga sobre o universo mítico dos samurais e das gueixas,..."
Os japoneses falam japonês, ponto!
E claro, que, há sempre táxis imaculados à porta dos hóteis, a qualquer hora do dia.
Eles por lá são muito organizados, rotineiros, o café é sempre igual, nada de manias, em chávena escaldada, meio cheio, com um cheirinho, etc...
Kampai, Sr. Embaixador.
Existem as "Geisha" e as "Geesha". Como infelizmente noutros países, em tudo o que os Americanos tocam, a "qualidade" baixa. As "Geisha" eram sinonimo de pessoas de grande cultura, na musica, no canto, na poesia, na dança e nas conversas ligeiras. A clientela satisfazia-se destes momentos e do prazer do que ela não podia ter. As "Geisha", existiam já no XV° século, e todas passavam pela escola das "Maïko".
Em missão comercial frequentemente neste pais, fui "presenteado" várias vezes com a presença à mesa de "Geishas". O problema é a barreira da língua, (Honi soit qui mal y pense !), porque à parte admirar o exotismo e a arte de servir o chá, nenhum diálogo podia existir entre o gaikokujin e a japonesa.
A confusão veio mais tarde, aquando da ocupação militar do Japão pelos Americanos. Durante esta época desenvolveu-se outro tipo de "hospedeiras" : as "Geesha girls", (deformação do termo "Geisha") , que se vestiam como as "Geisha" , o kimono e o obi, vestuário mais exótico para a soldadesca ocupante, e prestavam "todos os serviços".
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