segunda-feira, dezembro 29, 2025

BB do outro lado


Hoje, dia em que tanto se falará da BB, aqui fica outro BB, o genial Bertolt Brecht, comunista como já não está na moda alguém ser. O seu "Sobre o pobre B.B.", traduzido por António Cícero:


"Eu, Bertolt Brecht, sou das florestas negras.

Minha mãe me trouxe para as cidades

dentro do ventre. E o frio das florestas

estará comigo ao me cobrir a laje.


Na cidade de asfalto estou em casa e a caráter,

com todos os últimos sacramentos

ministrados: jornais, tabaco, conhaque:

desconfiado, indolente e enfim satisfeito.


Sou amável com os outros. E visto

meu chapéu-coco, como todo o mundo.

Digo: são bichos de cheiro esquisito

e também digo: e daí? Também sou, no fundo.


Às vezes, nas cadeiras de balanço,

coloco algumas moças, de manhã,

e digo: em mim vocês têm, eu garanto,

alguém em quem não podem confiar.


À tarde me reúno com colegas.

Tratamo-nos de “gentleman”, então.

Eles dizem, com os pés à minha mesa:

as coisas vão melhorar, e não pergunto quando.


Na madrugada cinza, abetos mijam

e piam os pássaros, que são seus vermes.

Na cidade, meu copo se esvazia,

largo o charuto e durmo um sono leve.


Assentamo-nos, uma geração leviana 

em prédios que quiséramos indestrutíveis

(assim construímos os arranha-céus da ilha de Manhattan e as finas antenas sobre o Atlântico a nos divertirem).


Destas cidades ficará quem as atravessou, o vento!

A casa faz feliz quem nela come: quem a esvazia.

Sabemos sermos efêmeros

e que depois de nós o que virá será sem valia.


Nos terremotos vindouros, que não seja meu fado

deixar por amargura o meu Virginia se apagar,

Eu, Bertolt Brecht, largado nas cidades de asfalto,

oriundo das florestas negras, no ventre da mãe, tempos atrás.

Sem comentários:

BB do outro lado

Hoje, dia em que tanto se falará da BB, aqui fica outro BB, o genial Bertolt Brecht, comunista como já não está na moda alguém ser. O seu ...