Hoje, dia em que tanto se falará da BB, aqui fica outro BB, o genial Bertolt Brecht, comunista como já não está na moda alguém ser. O seu "Sobre o pobre B.B.", traduzido por António Cícero:
"Eu, Bertolt Brecht, sou das florestas negras.
Minha mãe me trouxe para as cidades
dentro do ventre. E o frio das florestas
estará comigo ao me cobrir a laje.
Na cidade de asfalto estou em casa e a caráter,
com todos os últimos sacramentos
ministrados: jornais, tabaco, conhaque:
desconfiado, indolente e enfim satisfeito.
Sou amável com os outros. E visto
meu chapéu-coco, como todo o mundo.
Digo: são bichos de cheiro esquisito
e também digo: e daí? Também sou, no fundo.
Às vezes, nas cadeiras de balanço,
coloco algumas moças, de manhã,
e digo: em mim vocês têm, eu garanto,
alguém em quem não podem confiar.
À tarde me reúno com colegas.
Tratamo-nos de “gentleman”, então.
Eles dizem, com os pés à minha mesa:
as coisas vão melhorar, e não pergunto quando.
Na madrugada cinza, abetos mijam
e piam os pássaros, que são seus vermes.
Na cidade, meu copo se esvazia,
largo o charuto e durmo um sono leve.
Assentamo-nos, uma geração leviana
em prédios que quiséramos indestrutíveis
(assim construímos os arranha-céus da ilha de Manhattan e as finas antenas sobre o Atlântico a nos divertirem).
Destas cidades ficará quem as atravessou, o vento!
A casa faz feliz quem nela come: quem a esvazia.
Sabemos sermos efêmeros
e que depois de nós o que virá será sem valia.
Nos terremotos vindouros, que não seja meu fado
deixar por amargura o meu Virginia se apagar,
Eu, Bertolt Brecht, largado nas cidades de asfalto,
oriundo das florestas negras, no ventre da mãe, tempos atrás.

Sem comentários:
Enviar um comentário