Contava há pouco a um amigo a irritação que sempre me provocam evocações pseudo-históricas que, por muito repetidas, se fixam no tempo e, agora com a pérfida ajuda da internet, passam mesmo a doutrina, consultadas com a "seriedade" da "cultura wikipédica". Estas deturpações, que são inócuas em "petit comité", tornam-se "virais", como agora se diz, perante mundos incultos e suscetíveis de acreditarem em qualquer patranha, desde o "milagre das rosas" às frases históricas de dona Filipa de Lencastre ao armar os seus filhos cavaleiros, relatadas por Oliveira Martins, ao qual Eça escreveu uma carta inquirindo "Estavas lá? Ouviste?". José Hermano Saraiva, na sua historiografia de almanaque, popularizada pela televisão, foi responsável por muitos desses atentados à verdade histórica, absolvida no imaginário popular pela sua fantástica capacidade histriónica.
Vinha isto a propósito de uma "palestra" a que, há dias, tive o azar de assistir, em que o prolixo orador, sem sequer se rir, deixou a sua "versão" sobre a origem do nome de Japão. Dizia ele que, perante uma famélica tripulação de uma caravela lusitana, um dos marinheiros, à vista pela primeira vez da costa nipónica, terá gritado, esperançoso: "Já há pão!". Presumiria ele, assim, que a chegada essa ilha permitiria saciar, de imediato, o apetite da esquadra lusa.
Para minha surpresa, o meu amigo não se riu. E logo acrescentou: "É capaz de ser verdade! Sabes de onde é que vem o nome de "gueixas", as dóceis acompanhantes que fazem parte da história do Japão?". Antes que eu respondesse, respondeu ele: "É capaz de ter sido o mesmo marinheiro que, já com a costa bem próxima, ao vislumbrar mulheres por ali, terá gritado: "Há ali gajas!". E assim nasceram as gueixas".
É, sem dúvida, uma versão que tem idêntico grau de verosimilhança...
11 comentários:
Oh, marinheiros...
Mas como anedotas não estão nada mal...
Alijó também tem uma historieta igual a esses gracejos geonomásticos. Acontece que não tenho o topete de dizer que os sérios estão todos do lado do coração e os ladrões no oposto! Muito menos a despropósito e sem fundamento explícito!
inócuas
Grande tirada, desde Eça à gueixa.
No caso de José Hermano Saraiva, não concordo muito com a alfinetada.
Pelo menos nos últimos 10/15 anos os programas dele não tinham a pretensão de serem documentários históricos de rigor. Não eram exercícios académicos. Nem ele se levava tão a sério. Eram de facto almanaques televisivos pitorescos: visitava terras, contava histórias, lendas, especulava sobre factos históricos. Mas ninguém ia ao engano. Os nomes dos programas diziam isso mesmo ("A alma e as gentes", e afins).
Era uma figura simpática e sinceramente acho que hoje, quando olhamos para a grelha televisiva, podemos suspirar por não termos ninguém capaz de fazer esse tipo de programas.
Essa de Alijó é curiosa, tendo eu raízes lá. Quer o anónimo contar-nos, "por gentileza", como dizem os brasileiros? Fiquei com água na boca!
podemos encontrar um bonito vídeo feito por lindas "gueixas" japonesas modernas:
About relation between Tanegashima and Portugal
https://www.youtube.com/watch?v=tPioHwZf9RU#t=44
e a maneira como eles interpretam a historia
Na wikipédia sobre Japão remete para o Wikcionário em que refere na origem etimológica que "O nome ocidental do país procede da pronúncia chinesa para os caracteres 日本 (rìběn), ou origem do sol (traduzido como terra do sol nascente), indicando que o Japão está a leste da China (onde o sol nasce).".
Numas poucas aulas que tive de mandarim apercebi-me que vários falantes dessa língua pronunciam o "r" de forma parecida com o nosso "j" e o "b" mais parecido com um "p". Talvez a pronúncia cantonesa fosse ainda mais parecida com Japão.
Noto da sua parte alguma má vontade em relação à Wikipédia que, embora precise de ser usada com cuidado, não deve ser menosprezada, sendo um instrumento de trabalho muito útil para iniciar uma averiguação sobre qualquer tema.
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~~ Imagino a maçada
de aturar uma palestra dessas...
~~ Criatividade de monoglota...
~~ Porém,
os disparates são hilariantes!
~~~~ Cordiais saudações. ~~~~
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Jó terá perguntado a Cristo onde era a cova dos ladrões: Ali Jó, respondeu apontando!
(quanto a mim Cristo Rei terá apontado para mais perto, mas já sou eu a especular)
Dona Filipa de Lencastre, e não...Filipe.
"histriónico" é capaz de ser exagerado, não?
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