sexta-feira, setembro 02, 2011

O regresso de Monsieur Morisi




Num café de Montreuil, nos arredores de Paris, a surpresa foi imensa, nesses últimos dias de abril de 1974. As imagens que a televisão trazia da "révolution des oeillets", que, à época, marcava a atualidade portuguesa em França, mostravam a chegada triunfal ao aeroporto de Lisboa de um homem de cabelos brancos, gabardine parda, olhar firme e determinado:

- "Mais c'est Monsieur Morisi!", exclamaram, surpreendidos, alguns clientes.

Era Álvaro Cunhal, o líder histórico dos comunistas portugueses, que tinha vivido clandestinamente em Montreuil nos últimos anos antes do 25 de abril, quando muitos achavam que essa figura mítica se encontrava em Moscovo ou em Praga. Para a vizinhança, ele era apenas o discreto "M. Morisi", como ontem me contou o deputado Jean-Pierre Brard, que foi "maire" da localidade e que, como militante comunista, conheceu pessoalmente Cunhal. 

Está ainda por fazer, de forma organizada e não sectária, a história do papel desempenhado pela França como terra de acolhimento dos exilados portugueses durante a ditadura. Neste tempo de "Festa do Avante", que tanto diz aos militantes comunistas portugueses, aqui fica esta pequena nota, dos tempos de um certo "M. Morisi". 

20 comentários:

Portugalredecouvertes disse...

Muito interessante esta história Sr. Embaixador!

a França foi uma grande "mãe" para milhares de Portugueses a escapar da ditadura ou simplesmente a procurar melhores condições de vida.

Cumprimentos

patricio branco disse...

a biografia de a c por pacheco pereira (q não li) deve dizer algo sobre esses anos de paris e o falso nome, ou pseudónimo, de sonoridade italiana, morisi.
mario soares tambem por aí andava, mas com o seu nome

Helena Oneto disse...

Houve tantos Monsieur Morisi por esse mundo fora...

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Patrício Branco: o que talvez não saiba é que Mário Soares escrevia então artigos para o "República" assinados com o nome de "Clain d'Estaing", que não seria um primo do futuro presidente mas apenas uma personalidade cujo nome tinha uma "sonoridade" equívoca...

Rui Franco disse...

Acabadinho de chegar de lá (da festa). Boa música, bom teatro e o resto... é para ser visto com humor.

Quantas vezes terei eu visto escrita a palavra "não" em letras garrafais? Amanhã talvez conte.

patricio branco disse...

não sabia, desconhecia totalmente esse pseudonimo giscardiano de mario soares.
Possivelmente, tanto o sr morisi como o sr clan d'estaing sim, sabiam um do outro, aproximações do exilio, de causas comuns, embora ideologicamente distintas.
Muita (pequena) história (petite histoire) está por escrever, como a destas curiosidades reveladas no blogue.
Bom titulo para filme, "o regresso de monsieur morisi".
Mais personalidades deviam andar por paris nesses tempos classicos da oposição à ditadura, manuel alegre, p ex, e outros.

Anónimo disse...

Confesso que não tenho capacidade de iniciativa para ler por auto recriação esta espécie de subterrâneos da liberdade, talvez como romance...

Claro que em post lê-se muito bem e com comentários idóneos. é toda uma aprendizagem...
É assim como quem lê o resumo dos Maias aos dezasseis anos ,porque ainda não adquiriu o tempo maduro de ler o tudo relevante das idiosincrasias do autor aderente ao argumento...

Julia Macias-Valet disse...

A historia é girissima : )

Mario Soares também vivia em Paris, no XVème, na rue Violet num apartamento que ha uma dezena de anos compraram uns amigos meus.
Se bem me lembro o prédio nao tem nenhuma placa que assinale o facto do nosso ex-presidente ali ter residido...vou-lhes dar essa idéia ; )

"Dans cet immeuble a habité Mario Soares, Président de République Portugaise (197?-198?)"...(pendant ses années de "Clain d'Estinité") ; ))

Helena Oneto disse...

No exílio em Paris, Mário Soares também viveu num modesto apartamento no boulevard Garibaldi (et pour cause:)!)no XVème arrondissement. Lembro-me, perfeitamente, de me ter regalado com as deliciosas pataniscas de bacalhau e o arroz de tomate que a Maria de Jesus fez, num pequeno camping-gaz!

Anónimo disse...

ERA UMA VEZ

Quando em 1970, casei e desbravei alguns países da Europa no meu arrojado "mini" conheci um casal(portuguesa e holandês, ambos ligados à Tap) que tiveram a amabilidade de nos receber em sua casa, um moderno apart em Amesterdão.

A seguir, fizeram questão de nos mostrar um cartaz que tinha sido colocado num corredor do prédio que dizia qualquer coisa pouco simpática sobre Portugal e a eterna guerra colonial.

Explicaram-nos que um exilado de respeito tinha falado dias antes na TV sobre o assunto e conquistado a opinião pública local: Mário Soares.

Ainda tão pouco politizados, o noivo recentemente chegado de Angola, aliviado do serviço militar obrigatório, cheios de sonhos para o futuro, ficámos desconfortáveis com a opinião da Holanda a nosso respeito

Pouco a pouco fomos despertando.
Uma peça aqui, uma leitura ali...

Na bagagem, um poster de CHE, comprado junto ao Sena, encomenda de um amigo.
Felizmente ninguém o viu na fronteira...

Eram assim os longíquos anos setenta, cá por casa.
De Cunhal só ouvimos falar muito mais tarde...

Helena Sacadura Cabral disse...

Amiga Júlia e caro Patrício Branco, deliciosos os vossos comentários e Garanto-vos que Clain d' Estinité é soberbo!

L M D disse...

Não sou, nem tampouco me revejo na ideologia comunista, mas que o PCP teve um papel fundamental na luta contra o Estado Novo,(pagaram um preço elevado por isso) e que o dr. Álvaro Cunhal era o expoente maximo dessa luta, disso não tenho duvidas.

Helena Oneto disse...

Querida Júlia, só agora vi o seu genial "jeu-de-mots"!

Anónimo disse...

Entrevistei Álvaro Cunhal para o DN em 1976. Nunca tinha ouvido nada, nadinha mesmo sobre M. Morisi. Ele também não me falou nisso...

Quanto a M. "Clain d'Estinité" (secundo o genial e subscrevo) o Mário também nunca me referiu tal nome. E tanto falámos, falamos e falaremos. Por uma tuta e meia? Não, nada.

E que tal deitar uma mirada pelo meu novo:

http://politicaoupulhitica.blogspot.com? Agradeço antecipadamente. Um homem tem de desabafar, não é só castanhas e javali... Mas a Travessa continua

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Henrique: Era M. Clain d'Estaing

Anónimo disse...

Meu caríssimo Francisco

Muito obrigado, eu vi, mas... copiei apenas a genialidade da Julia Macias-Valet

Julia Macias-Valet disse...

Helena (ao quadrado ; ) eu apenas segui (e adaptei) a genial idéia do Dr. Mario Soares na escolha do seu pseudonimo e a informaçao dada pelo senhor Embaixador.

Nunca tinha feito a ligaçao homófona heterográfica (ou sera parónima ?) entre o apelido do ex-presidente Giscard e ao facto de que os franceses lhe tinham confiado durante sete anos "leur destin".

Deixo-vos un video historico :
www.youtube.com/watch?v=4BrRVaTa-BI

Au revoir !

artur disse...

admira tanta gente tão bem informada e não conhecer a história do M. Clain d'Estaing, que já foi contada várias vezes pelo próprio nas Tv's.

Anónimo disse...

Lembro-me dos artigos de Clain d´Éstaing e achava piada à sonoridade... só que apenas vim a saber que era lá pelos anos 80.
A propósito do poster do CHE: em Agosto de 1974 deixei um pregado na parede do meu quarto de oficial miliciano do exército português algures no mato profundo da Guiné-Bissau. Quem terá ficado com ele?...

patricio branco disse...

m. morisi tambem era escritor e desenhador, mas escondia essas actividades em pseudonimos. Deve ter escrito em paris, imagino.
aliás os cunhais são uma familia de escritores, o pai avelino cunhal ("senalonga")e a irmã maria eugenia cunhal.
outro pcpeista escritor: carlos brito.

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