sábado, setembro 20, 2025

Liberdade


Há muitos anos, ao tempo em que eu estava como embaixador junto das Nações Unidas, Jorge Sampaio disse-me ter curiosidade em visitar o "The New York Times", no quadro de uma deslocação oficial que ia fazer a Nova Iorque. 

Foi muito fácil obter essa visita para o chefe de Estado português. Sampaio conversou com a direção do jornal e, regressado a Lisboa, mandou-me uma fotografia dessa "nossa visita a uma Bíblia laica", como está na dedicatória que escreveu.

O "The New York Times" é, de certo modo, uma instituição simbolizadora da liberdade de expressão, para os EUA e para o mundo. Nestes tempos em que Donald Trump mostra uma continuada intenção de abafar os media adversos, a coragem diária demonstrada pelo NYT é um exemplo. É um jornal que tem opinião, discutível, mas que não brinca com os factos. Ou, como manda a boa regra: todos temos direito a ter as nossas opiniões, mas não temos direito a ter os nossos factos, a ter "factos alternativos", como um dia crismou uma trumpista histórica, agora longe da Casa Branca, Kellyanne Conway.

Ontem, um amigo que vota no Chega (tenho amigos que votam no Chega, e nem por isso deixam de ser meus amigos, sublinho), mas que é levemente crítico de algumas atitudes de Trump (mas não, curiosamente, das sua proximidade com Putin), disse-me ter ficado escandalizado pelo facto de o NYT ter recusado publicar um artigo de Joe Biden, com medo à reação do presidente americano.

"Isso não pode ser verdade!", disse-lhe, de imediato. O mundo muda muito, a América tem mudado de forma impensável, mas eu tinha a certeza, quase absoluta, de que o jornal de que sou assinante digital desde há anos, não teria um gesto desses. E, minutos depois, confirmei isso mesmo.

"Onde leste essa notícia?" Ele não sabia. Eu desconfiava. Tinha-a lido, com certeza, num desses sites de falsidades e de teorias da conspiração que alimentam o quotidiano informativo de muita gente, onde se publica tudo e mais alguma coisa, onde não é necessário dar qualquer referência sobre as fontes. Leem, não se interrogam sobre a verosimilhança da notícia ou a credibilidade da fonte, e depois divulgam pelos amigos, que ajudam à "pirâmide". Como se ainda vivêssemos no tempo em que se pensava: "Se veio na imprensa é porque é verdade". 

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