quinta-feira, junho 15, 2017

O tempo e a diplomacia


"Vais conseguir tempo para ler esse livro?" A pergunta tinha algum sentido e até era bem benévola, à vista dos quase vinte volumes que eu acabara de comprar, ontem à noite, na Feira do Livro. E, de facto, não tive resposta para ela. "Sei lá!", era o que me apetecia responder, apanhado no embaraço habitual que sinto quando entro em casa ajoujado de livros. É claro que podia dizer, como o outro, que só há uma coisa melhor do que ler um livro, que é comprá-lo! Mas essa resposta já está "gasta" cá em casa...

A monumental biografia do Barão de Rio Branco, a grande figura tutelar da diplomacia brasileira, de Álvaro Lins, é um clássico que eu já devia ter adquirido há muito. Encontrar esta 2a edição (a edição original é de 1945), de 1965, em estado novo, por pouco mais de cinco euros, foi um "achado" a que não resisti. Claro!

Álvaro Lins é uma figura intelectual brasileira muito interessante. O seu "Missão em Portugal" (que era proibidíssimo entre nós e que me recordo ter consultado, pela primeira vez, na Biblioteca Pública de Nova Iorque, em dezembro de 1972) é um relato do extraordinário período em que foi embaixador em Portugal, tendo Humberto Delgado refugiado na sua embaixada, com toda a negociação posterior com as autoridades portuguesas. Mas a biografia de Rio Branco é tida como a sua obra maior, para além dos estudos sobre Luís de Camões.

Quando cheguei ao Brasil, em 2005, corria o boato de que o secretário-geral do ministério das Relações Exteriores, o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, obrigava os funcionários com pretensões na carreira a lerem esta biografia.

Não sei se isto é verdade, mas eu não me importaria que, entre nós, a hierarquia diplomática obrigasse alguns funcionários diplomáticos a certas leituras que os ajudassem a perceber que o que fazem, por aqueles claustros das Necessidades e pelo mundo, se insere numa história muito longa que deve servir de ensinamento de fundo a toda a sua ação de representação do país. E que tem sempre de haver tempo para bem aprender esses tempos.

4 comentários:

Anónimo disse...

Livro muito oportuno quando outros diplomatas trazem agora à colação o tópico dos andaimes. O problema é que por vezes há pavões em cima dos andaimes...

Anónimo disse...

Quando é que alguém se decide a escrever A biografia de D. Luis da Cunha? A Gulbenkian de Paris patrocinou há uma década a de D. Rodrigo de Sousa Coutinho.

Há alguns anos apareceu num leilão um busto de D. Luis. Ninguém o quis comprar por cá e o Rijksmuseum de Amsterdam não deixou escapar a oportunidade. Pagou dez mil euros e o busto está exposto permanentemente no museu.Vi-o lá há seis meses.

Sigamos o exemplo do Brasil.

JPGarcia

Anónimo disse...

Por falar em (re)editar livros

Vocabulario Portuguez Latino de Raphael Bluteau 1712-1721 8+2 tomos

Um manancial. Cada entrada é um mundo, uma porta de entrada num Portugal do passado.

"Gato Sapato- chamaõ na India ao jogo, que em Portugal chamamos Cabra Cega; & deve ser porque neste jogo se costuma dar com hum sapato ao que esta com olhos vendados, donde parece se derivou o Adagio, Faz de mim Gato Sapato"


patricio branco disse...

pois será obra interessante e bem escrita essa biografia do barão, o pai da diplomacia brasileira, e boa de ler.
interessante deve ser também o relato de alvaro lins da sua embaixada em portugal e da convivência com o general humberto delgado enquanto refugiado ou asilado politico na embaixada do brasil em lisboa, ali mesmo ao lado do edifício sede da pide, a pide desejosa de agarrar delgado que ali estava a uns poucos metros, no edifício da embaixada, durante um ano ou mais. raiva do silva pais ou de quem seria o chefe na altura da policia. raiva de salazar, irritado com o brasil e com a sua policia, deixaram-no passar mesmo debaixo dos vossos narizes.
pois que conversas teriam tido, o embaixador e o general, nos tempos livres? talvez se encontre também esse livro do alvaro lins na feira do livro, talvez.
parece-me mesmo que já tive essa obra sobre a embaixada em lisboa, ou seria outra do lins, não era a sobre o rio branco, isso não. já não o tenho há muito, o livro do lins, e não o li.
e por esses anos, anos 70, comprei umas memórias dum embaixador do brasil em lisboa, outro. só me lembro que era volumoso e ttinha capa branca. adquirido no centro do livro brasileiro, ainda na rodrigues sampaio.
pois foi uma sorte encontrar a biografia do barão na feira e tê-la comprado, bom será também lê-la

Lembrar

Todos quantos acham que Mário Soares, se fosse vivo, se associaria a uma celebração do 25 de novembro fingem esquecer que o próprio Mário So...