A ideia de que centenas de pessoas morreram afogadas num porão de um navio, no meio do Mediterrâneo, quando tentavam chegar às costas europeias, em busca de um futuro distante da miséria das suas origens africanas, é um murro no estômago de todas as pessoas com consciência.
Como sempre acontece perante casos destes, as boas almas europeias sobressaltaram-se, na maioria dos casos, presumo, com real sinceridade. E, para darem um ar "operacional", as autoridades anunciaram logo vão fazer reuniões de emergência e coisas de igual quilate (e talvez um "rigoroso inquérito", como por cá é moda...)
Não quero ser cínico, mas não consigo deixar de perguntar: o que é que vão fazer? Já sei que a resposta vai ser "lutar contra as máfias do tráfico de pessoas", que vivem à custa da exploração daquela pobre gente, com travessias de imenso risco.
Até aí estamos todos de acordo. E depois? Está a Europa disponível para acolher no seu solo os muitos milhares de africanos que chegam às costas da Líbia (onde hoje não há Estado)? E quantos? E como os distribui? Ou será que se está apenas a aproveitar esta indignação para, através do pretexto da luta contra as máfias, tentar, afinal, evitar que os africanos entrem no continente europeu? Será que a Europa está disponível para dar uma solução de vida a essa gente? Ou será que apenas pretende um modelo como aquele que existe em Ceuta, com centenas de pessoas penduradas nas redes de metal que encerram a primeira praça da nossa expansão? Não será isso, lá no fundo, o "sonho" europeu?
A Europa tem de ter a coragem de dizer, alto e bom som, sem eufemismos, que não tem condições para receber milhares de cidadãos oriundos de Estados africanos (e outros) que se revelam incapazes de dar condições de vida decentes a essas pessoas. E tem de ter a frontalidade de dizer que, apesar dessa gente passar por lá fome, violência e imensas provações, não está disposta a abrir-lhes as suas portas. Mas tem de assumir isto, caramba! Andar com discursos piedosos a "fingir que faz" é de uma imensa hipocrisia política.
O que a Europa podia fazer, e não faz, é promover políticas decentes e eficazes de cooperação para o desenvolvimento nos Estados emissores de emigrantes, que fossem estímulos para a fixação das populações. Basta consultar as conclusões das cimeiras entre a UE e os países africanos para se ter um completo e bem elaborado catálogo do que nelas se proclamou, assinou e não se cumpriu.
15 comentários:
Gostava de saber o que os patifes que colaboraram com a derrocada de Khadaffi têm a dizer neste momento sobre vários temas, um deles precisamente este.
Foi o maior tiro no pé que a Europa deu nos últimos, muitos, anos.
Concordo com o texto por inteiro.
Só acrescentaria que os EUA ( e não só) deveriam deixar de se imiscuir nas políticas internas daqueles países e não lucrar com o negócio de venda de armamento e das alianças com ditadores enquanto lhe dá jeito.
Os meus respeitos.
Gosto.Principalmente do último parágrafo. Os povos 'civilizados' não podem continuar a rapina desenfreada dos recusros africanos, inibindo-lhes qualquer hipótese de crescimento e desenvolvimento.
E.Dias
Flagelações não se aturam.Mas lembrar o que foram as relações entre a Europa e a África desde 1.500 até hoje, serve para medir a extensão dos erros cometidos. A factura vai aparecendo e logo se convoca uma reunião de emergência!Lol... Assumamos o passado e orientemo-nos para novas rotas. Lamechices é que nem pensar!
caro zuricher
imagino que nao terao nada, ocupados a defender o mali, a vender armas para o golfo, a ver o EI tomar conta da libia e a tentar impedir um ou outro ataque caseiro..
ah! onde estara o nosso caro bom BHL... provavelmente no Yemen...
cumprimentos
http://www.rfi.fr/europe/20150416-15-migrants-musulmans-italie-chretiens-mer-libye-sicile-rixe-bateau-trafiquants-/
http://www.nytimes.com/2015/04/19/world/middleeast/sale-of-us-arms-fuels-the-wars-of-arab-states.html?ref=todayspaper&_r=0
O massacre silencioso do Mare Nostrum
De 13 de Agosto 1961 ao 9 de Novembro de 1989, o Muro de Berlim custou a vida a 230 pessoas. De 1988 a 2015, 8742 pessoas morreram na tentativa de passar o muro que separa a Europa da parte mais pobre do mundo.
O primeiro muro tem um m maiúsculo, o segundo um minúsculo. Um em cada três cadáveres jaz ainda no fundo do mar. Alguns são pescados nas redes dos pescadores. E lançados ao mar, mais uma vez. Algumas dezenas ficaram fechados no compartimento do peixe congelado para a travessia. Lá ficarão até ao fim dos tempos , entre Malta e a Sicília. Em companhia discreta.
Massacre sem museus nem placas comemorativas, que não tem cerimónias do "souvenir" nem campanhas ministeriais, não há simpósios, não se estuda nas classes de escola, não tem o seu Leonardo di Caprio.. Massacre discreto, quase silencioso na sua imperturbável continuidade. Como uma vaga, embala-nos no berço fatal.
O naufrágio da semana é o Titanic destes viajantes do inferno. O maior naufrágio da história do Mediterrâneo em tempo de paz.
Em Bruxelas, os oficiais levantaram-se e observaram um minuto de silêncio.
Tristes factos, dramáticos, mas o que é que existe por trás deste minuto de silêncio? Porque é que centenas de pobres humanos embarcam para uma viagem de morte?
Porque querem sobreviver ,justamente, estes pobres desgraçados afrontam os grandes perigos , em barcos miseráveis, esburacados, prontos a afundar-se.
Examinemos o problema como quisermos, todas as avenidas nos reenviam aos países de origem onde estas vítimas começaram a sua odisseia.
Alguns "inteligentes" sugerem de elevar barreiras até ao céu. Em Israel chama-se o Muro de separação - que separa os Palestinianos pestíferos, dos seus carcereiros do apartheid ostracizado.
Tudo foi tentado para deter os imigrados do mar. Barcos de guerra, vedetas rápidas da alfândega. Nada detêm estes faméliques desesperados.
A fonte da imigração ilegal encontra-se para lá do Mediterrâneo, do Sinai e do Mar Egeu. Lá para o Sul, donde partem os caminhos por onde passam as riquezas saqueadas pelos ocidentais, nos poços de petróleo, das minas de ouro, de diamantes, de prata, de coltan, nas crateras de titânio, de cobalto, de urânio, as florestas de ciprestes, de caju e de ébano incrustado de marfim esculpido e espoliado.
Estas estradas cheias de caravanas da mendicidade começam tão longe como na África do Sul, Angola, Congo, Gabão, Costa do Marfim, Etiópia, Nigéria, Quénia,, Sudão,, Líbia, Síria e Iraque, para vir acabar nos portos de Tripoli, Tunis e Tanger, ao longo das costas marítimas sem peixe, saqueadas pelos imensos barcos frigoríficos industriais, com bandeiras de conveniência, que não deixam grande coisa aos pescadores equipados de pirogas.
Os monopólios do Ocidente e da Ásia sangram a África dos seus recursos e do seu dinheiro, enquanto que os seus filhos só têm o exílio em partilha e virão afogar-se ao largo do Pireu, de Malta e da Sicília.
Entretanto os monopólios internacionais da alimentação especulam na bolsa de Chicago ou de Toronto, sobre os produtos de base ( café cacau, chã, açúcar, trigo, oleio, arroz, sorgo, etc., ) e que de Tombouctu a Abidjan os agricultores não sobrevivem com a venda do que produzem. E que o algodão subvencionado do Texas mata o do Mali.
E que Total, Shell, Mobil-Exxon e outros monopólios expropriam os poços de petróleo, deixando algumas piastras aos presidentes de opereta e aos seus generais encarregados de esmagar toda veleidade de revolta dos esfomeados.
Pois é, os oligopólios dos multi milionários roubam as riquezas da África e agora querem repelir os escravos afamados africanos para as suas terras saqueadas. Mas eles preferem morrer.
Foi o que deu Shengen !
Sr. Embaixador, hoje estava inspirado.
A Europa já daria uma grande contribuição se parasse de financiar, armar e participar de conflitos bélicos nesses países.
O que a Europa podia fazer, e não faz, é promover políticas decentes e eficazes de cooperação para o desenvolvimento nos Estados emissores de emigrantes, que fossem estímulos para a fixação das populações. Basta consultar as conclusões das cimeiras entre a UE e os países africanos para se ter um completo e bem elaborado catálogo do que nelas se proclamou, assinou e não se cumpriu.
Apetece repetir o que bem está dito.
N391111
Não sendo Shengen, deviam ter-se adoptado as leis Inglesas e /ou as dos States !
Os "iluminati" de Bruxelas e as integrações forçadas pelo multiculturalismo de quem o quer, infelizmente está a destruir a herança europeia, herdada da Antiguidade Romana e Grega.
Integrar povos com usos costumes diferentes sempre deu asneira.!
Eu bem avisava há 60 anos, cuidado que uma coisa é vir de barco, para jogar à bola para o Benfica como o Eusébio e o Santana, outra é vir a nado, sem emprego nem patrão.
Mas diziam que eu era colonialista e calavam-me.
Agora paciência.
Eu bem avisava há 60 anos, cuidado que uma coisa é vir de barco, para jogar à bola para o Benfica como o Eusébio e o Santana, outra é vir a nado, sem emprego nem patrão.
Mas diziam que eu era colonialista e calavam-me.
Agora paciência.
E a máxima ironia são as promoções de cruzeiros pelo Mediterrâneo, que nos aparecem no correio todos os dias, com novos e imperdíveis itinerários...
Havia os «pretos assimilados» na política colonial salazarista.
Hoje há «os pretos assimilados» pela Europa, USA, URSS, como foi Mobutu, Idi Amin, Senghor, Keniata, Agostinho Neto e José Eduardo dos Santos, Savimbi e Luís Cabral e Nino Vieira, etc. etc.
Os não «assimilados» não entram na Praça do Vaticano, na praça do Kremlim, nem vão a Dallas onde o outro levou um tiro nos cornos.
Os «não assimilados» vão dar de comer aos peixes.
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