Na noite de quarta-feira, na comemoração das ainda escassas décadas de existência de um bom amigo, acabámos a cantar-lhe os "parabéns a você", com a música de "A Internacional". É uma prática pouco comum nas festas de aniversários, salvo quando a densidade daqueles que seguem pela faixa esquerda dos caminhos da vida é forte e maioritária. Como era, obviamente, o caso. De qualquer forma, a letra cantada era bem mais inóqua do que a da original "A Internacional" (e, à atenção de quem não saiba, há uma variedade de letras de "A Internacional" muito apreciável), tanto mais que não se registava a presença de quaisquer "vítimas da fome", o que também era assegurado pela participação no repasto do "papa" da crítica gastronómica portuguesa, José Quitério.
Lembrei-me então que um dia, num intervalo de um Conselho de Ministros de um dos dois governos de António Guterres, foi decidido comemorar o aniversário do primeiro-ministro, com bolo e as inevitáveis velas. Alguns (assumo que fui um deles) decidimos pôr os ministros e secretários de Estado a cantar-lhe as palavras do "parabéns a você" com a música inesquecível de Pierre de Geyter. Foi curioso ver as reações: alguns de nós arrancámos a cantoria com a energia de uma geração que um dia soube ao que ia, outros, mais ou menos embaraçados ou com um sentido das conveniências apurado, trauteavam baixinho, e, finalmente, alguém vindo do tempo "da outra senhora", cooptado pela democracia com generosa abertura, parecia não saber onde se meter, como o sorriso amarelo bem denunciava.
Mais a sério: "A Internacional" é uma canção que ficou ligada à memória comunista, mas cujo espírito progressista sempre foi muito para além desse terreno específico de acantonamento ideológico. Para muitas pessoas da minha geração (política), "A Internacional" foi uma bela arma contra a ditadura, um terreno comum onde muita gente que lutava pela democracia e pelas ideias da solidariedade e do progresso se encontrava, com alegria e entusiasmo. Para mim, "A Internacional" faz assim parte da minha melhor memória afetiva. E não tenho o menor receio de o afirmar.
10 comentários:
(...)
Bem unidos façamos,
Nesta luta final,
Uma terra sem amos
A Internacional.
Messias, Deus, chefes supremos,
Nada esperemos de nenhum!
Sejamos nós quem conquistemos
A Terra-Mãe livre e de igual maneira comum!
Para não ter protestos vãos,
Para sair deste antro estreito,
Façamos nós por nossas mãos
Tudo o que, claro a nós diz respeito!
(...)
"Já fomos Grécia e fomos Roma
Tudo fizemos, nada temos
Só a pobreza que é a soma
Dessa riqueza que fizemos
Nunca mais no campo de batalha
Irmãos se voltem contra irmãos
Não mais suor de quem trabalha
Floresça em fruto noutras mãos"
Acho que o autor dos versos , Eugène Pottier , devia ter sido também mencionado, Sr. Embaixador . Tanto mais que tinha sido condenado à morte em 1873, e escapou porque fugiu para os Estados Unidos.
Nestes tempos em que muitos envergonhados querem esquecer estes cantos de luta que já entoaram, ainda há muita gente que os recorda. E também este refrão do hino de Cachias:
Podem cortar meu corpo à chicotada,
Podem calar, meu Tom enrouquecido,
Mas p'ra viver de Alma ajoelhada,
Vale bem mais morrer de rosto erguido.
Vá camarada, mais um Passo... Etc. Etc.
Mas hoje, "o que nos faz falta é animar a malta".
É isso, animar de maneira Seguro, a malta.
José Barros
Para mim, da minha memória faz parte entre outras, a canção dos Mamma and Papa`s "California Dream" !Uma esperança não comunista !
Alexandre
Embora nem toda a gente tenha conhecido Caxias, sei que já todos puderam corrigir que era bem "o Hino de Caxias" que eu queria dizer no meu precedente texto.
José Barros
Sempre considerei "A Internacional" uma das mais bonitas músicas/hinos de sempre, isto sem qualquer comotação política.
Isabel BP
Deixe-se de internacionalizices...
A marcha de Vila Real do Padre Minhava é bem melhor. Só que a letra já mudou. Agora canta-se: Vila Real oh que linda eras...
A Internacional é um dos mais belos hinos de sempre precisamente porque tem conotações políticas, se não tivesse não fazia sentido, o mesmo se aplica, por exemplo à Marselhesa. Tenho grande orgulho em ter cantado este belo hino à liberdade em muitas e variadas ocasiões ao longo da minha vida. Cantei-o sempre mal mas com muita convicção e sinceridade.
Então a internacional, não é um hino, é mais uma ladainha…
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