O meu colega e amigo embaixador José Bouza Serrano publicou, há poucas semanas, o "Livro do Protocolo".
Muitos de quantos se interrogam, por vezes de forma irónica, sobre a "liturgia" do cerimonial oficial teriam vantagem em visitar esse volume, como forma de entenderem melhor a importância do protocolo na vida dos Estados e nas relações internacionais. E também para aprenderem algumas coisas básicas, que ajudam à convivência, permitem superar equívocos e facilitam as relações, dando indicações preciosas sobre comportamentos e práticas adequadas.
De Gaulle, bem atento aos símbolos, dizia que o protocolo era a "ordem da República". Na minha vida profissional, sendo embora muito atreito a olhar as coisas da forma mais simples e desformalizada que for possível, aprendi a ter um grande respeito pelas regras protocolares, porque elas são, imensas vezes, o esqueleto que permite manter - de forma muito distante do caráter fútil que se lhes atribui - um equilíbrio saudável na vida oficial. Também me dei conta, em muitas ocasiões, que essas regras são, muito para além disso, um modo discreto de suprir faltas de educação de muita (dita boa) gente.
Para olhares menos atentos, o protocolo surge uma atividade marcada pela "ligeireza", pelo "maneirismo", pelo snobismo impositivo. Não é nada disso. Nas relações internacionais, não damos conta do protocolo até ao momento em que uma falha nesse âmbito tenha lugar. Quanto tal acontece, é um "aqui d'el rei!" geral, um mal estar das personalidades políticas, comentários jocosos da imprensa, olhares enviezados de colegas menos atentos, por vezes com sensíveis efeitos na substância das relações políticas. Desde há muito que criei um profundo respeito pelos diplomatas e técnicos que se encarregam do protocolo de Estado português. E eles sabem-no.
Para olhares menos atentos, o protocolo surge uma atividade marcada pela "ligeireza", pelo "maneirismo", pelo snobismo impositivo. Não é nada disso. Nas relações internacionais, não damos conta do protocolo até ao momento em que uma falha nesse âmbito tenha lugar. Quanto tal acontece, é um "aqui d'el rei!" geral, um mal estar das personalidades políticas, comentários jocosos da imprensa, olhares enviezados de colegas menos atentos, por vezes com sensíveis efeitos na substância das relações políticas. Desde há muito que criei um profundo respeito pelos diplomatas e técnicos que se encarregam do protocolo de Estado português. E eles sabem-no.
Quando entrei para o serviço diplomático, a nossa "bíblia" protocolar era "o Serres", o "Manuel pratique du protocole", uma obra de Jean Serres, de 1965. Mais tarde, na tradição francesa que fez muita escola em Portugal, tornou-se-me útil (e mais divertido, pela sua escrita solta) o "Guide du protocole et des usages", de Jacques Gandouin, que até já tem uma "édition de poche". Mas, devo dizer, até porque tem uma vertente importante em matéria de Direito internacional, que continuo a ser um incondicional fã do britânico "Satow's guide for diplomatic practice", que já vai em muitas e renovadas edições, desde a original de 1917. Tenho, além disso, umas boas dezenas de outras obras sobre protocolo diplomático, em outras línguas - para além das que já encomendei, à luz da bibliografia citada neste novo "Livro do protocolo".
Havendo regras internacionais que enquadram as práticas protocolares, a verdade é que cada país cria também o seu próprio protocolo, pelo que as "liturgias" variam de Estado para Estado, para além de, naturalmente, evoluírem com os tempos. Em Portugal, o livro "Regras do cerimonial português", do embaixador Hélder Mendonça e Cunha, foi, durante muito tempo, a obra referencial. Todos tínhamos "o Hélder" nas nossas estantes, para resolver questões de precedências, colocação e ordem de condecorações, regras para os lugares à mesa em cerimónias, cartões e tipo de convites, etc. Mais tarde, o embaixador José Calvet de Magalhães, com o seu magnífico "Manuel diplomático" (uma espécie de "Satow's" em português), trouxe uma atualização sensata ao "Hélder", para além de ser uma obra com outro fôlego e justificada ambição.
Agora, o José Bouza Serrano, com cultura, inteligência e um insuperável bom-gosto e elegância, transpõe para livro o caldo da sua longa (e muito bem sucedida) experiência como diplomata e, em especial, como chefe do Protocolo do Estado. Por isso, este seu livro passa a ser uma nova "bíblia", embora talvez não tão laica e plebeia como eu gostaria que fosse (e ele sabe porque digo isto...). Mas trata-se, sem a menos sombra de dúvida, de uma obra muito importante, uma incontornável (como agora se diz) referência na matéria, cuja consulta - mesmo para gente fora "dos Estrangeiros" - fortemente recomendo.
Termino com uma frase significativa de Jaime Gama, no prefácio deste trabalho: "Vencer o preconceito em torno do protocolo é um ato de maturidade que aperfeiçoa as sociedades e lhes confere um acrescido grau de liberdade, porque lhes acrescenta civilização".
Termino com uma frase significativa de Jaime Gama, no prefácio deste trabalho: "Vencer o preconceito em torno do protocolo é um ato de maturidade que aperfeiçoa as sociedades e lhes confere um acrescido grau de liberdade, porque lhes acrescenta civilização".
17 comentários:
O protocolo entre Estados é como a boa educação entre as pessoas. Facilita e torna mais agradáveis os contactos profissionais ou sociais. No entanto houve épocas recentes em Portugal onde a educação e o protocolo entre pessoas era um pouco "ad hoc".
Fala como diplomata. Ora, o livro é dirigido, ao que supomos, ao grande público. Já li outros do género, que achei melhor, mais elucidativo. Este nem por isso. Daí não o recomendar. E depois, também, por ser muito centrado nele (nas suas experiências). Se é que falamos do mesmo livro. Só pelo facto de ser seu colega não quer dizer que o livro tenha interesse. Como digo, sobretudo para o tal grande público. Ah, vocês diplomatas muito gostam de se auto-elogiar.
Leonor Serveira
Este livro vem preencher uma lacuna em matéria de protocolo, que ultrapassa o Protocolo do Estado. Os livros escritos nos últimos 30 anos tiveram o grande mérito de serem os primeiros. Este é uma actualização que tardava. Numa época em que tudo tende a ser muito aligeirado, é bom termos uma "bíblia" que vem recordar ou ensinar matérias básicas de bom gosto e bom senso. Como leigo, penso que é isto a essência do protocolo. O Embaixador José de Bouza Serrano fez um trabalho notável que servirá, durante décadas, de referência para a vida social portuguesa, quer oficial quer empresarial ou, mesmo, meramente privada. Não mais haverá desculpa para se cometerem erros nas relações entre pessoas que gostam de conviver, qualquer que seja a sua profissão ou meio social.
José Honorato Ferreira
Nós diplomatas gostamos de nos auto-elogiar, sim. Tal como os canalizadores, empreendedores, mestres de obras, poetas, advogados, pintores, proxenetas, contrabandistas, banqueiros, trapezistas, contorcionistas,médicos, capitães de cavalaria, moços de fretes e engenheiros informáticos. É a condição humana. É a vida.
consta ou li em qualquer lado que no fim da 2 guerra os protocolos tiveram de criar uma mesa redonda especial numa sala com 4 entradas para a reunião não sei se de potsdam entre churchill, staline, roosevelt ou truman e de gaulle não criar conflitos de precedencias, todos entrariam ao mesmo tempo e teriam um lugar de presidencia equivalente. Li isto há muito, não sei se foi bem assim, mas que nenhum queria ser menos que o outro foi verdade
Ainda não li o "Manual". Também recomenda que os jornalistas não devem ir para as cerimónias oficiais vestidos como uns mendigos? Seria útil...
"Vencer o preconceito em torno do protocolo é um ato de maturidade que aperfeiçoa as sociedades e lhes confere um acrescido grau de liberdade, porque lhes acrescenta civilização"
Estou inteiramente de acordo com a frase de Jaime Gama que bem sabe porque a escreveu.
A diplomacia é um quebra cabeças para os dirigentes associativos que organizam eventos na emigração e recebem identidades oficiais da parte francesa e da parte portuguesa com diversos graus de responsabilidade.
É que de entre os dirigentes associativos, muitos temos dificuldade em saber quem deve falar primeiro e quem deve falar por ultimo; se devemos "privilegiar" os responsáveis portugueses ou os franceses; se devemos dar a palavra em primeiro lugar ao Prefeito ou ao Embaixador, ao "Maire" ou ao Ministro...
É que às vezes, diplomacia à parte, as pessoas também são "melindrosas"...
José Barros
Caríssimo embaixador e amigo,
Depois de uma longa ausência, como o Homem Mistério no Hospital Royal Free, em Hampstead, por doença não identificada, estou de regresso, mas sempre ligado e confinado, dependendo ininterruptamente do oxigénio. Veja as ironias da vida! Agora passo a aprender e a adaptar-me a um novo e completamente diferente estilo de vida. Felizmente, diagnosticado por Hipertensão pulmunar, não tenho dores, o meu mal não é contaminável, a minha mente continua sã, mas impossibilitado de me deslocar, mesmo em curtos passeios ou mesmo de condução. Quando tinha marcada passagem e estadia para pORTUGAL EM jULHO, AGORA, TUDO SE FOI! Enfim, cºest la vie! Um grande e grato abraço de amizade do,
Gilberto Ferraz
Já recorri uma ou duas vezes, profissionalmente, ao protocolo de Estado.
Protocolo vai além da boa educação. Às vezes há coisas que não sabemos.
Absolutamente, Alcipe! Só lamento que tenha escrito o seu comentário antes de mim. Agora só me resta amuar! snif!
xg
Ai! Alcipe...
Repor as classes na sociedade (amigos improváveis), acabar com o preconceito do protocolo (é bom lembrar que é mais difícil que desintegrar um átomo…), exames da 4ª classe…
Quanto espanto, por tanta naturalidade!...
Parece voltar tudo ao início…
Também Jaime Gama, quando Ministro dos Negócios Estrangeiros, dizia: "O Protocolo pode ser do Estado, mas quem manda nele sou eu..."...
Um grande livro escrito por um GRANDE Senhor, desde há uma semana nosso Embaixador junto do Reino dos Países Baixos.
Ao José de Bouza Serrano desejo as maiores felicidades no seu novo cargo.
Um Monárquico, a representar a República. Bom tipo! E com publicidade de graça ao seu livro, neste Post.
Os protocolos como guide lines são de facto úteis e quase sempre fazem sentido.
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