Uma vez por outra, quando as coisas se propiciam, junto-me a um grupo de antigos oficiais milicianos que, com outros amigos "do quadro", se encontra em torno de um bem disposto e solto almoço. Foi o que ontem aconteceu.
Une-nos a fidelidade ao 25 de abril - em que quase todos, cada um a seu modo, participámos -, embora os nossos caminhos, por essa época, nem sempre tivessem sido exatamente os mesmos, pelo que alguns nos conhecíamos então menos bem. Os anos foram-nos aproximando, diluindo postos e idades, facilitando o entendimento.
Será a nostalgia de um tempo de ilusões perdidas que nos volta a juntar, a memória dessa espécie de adolescência política, que agora revisitamos?
Não sei, nem sequer sei se tem alguma importância descobrir qual a motivação que nos agrega, muitos na "reserva", outros na reforma e uns quantos, por algum tempo mais, no ativo. Apenas fica bem claro, para todos nós, que apreciamos a mútua companhia e que, com cambiantes não necessariamente homogéneas na leitura do presente e do caminho que até aqui nos conduziu, nos continuamos a rever nessa magnífica aventura de 1974.
7 comentários:
Dizem que é o que se leva da vida...
se levarem os pressupostos do respeito pelas liberdades, só posso congratular-me... E... Desejar-lhes muitos anos de sadios encontros.
Isabel Seixas
Helena Sacadura Cabral disse...
Continue sempre, Senhor Embaixador, porque a Amizade pode ter colorações diferentes. Mas aquilo que une as pessoas não são as ideologias. São os afectos. E esses não carecem de explicação!
muitos na "reserva", outros na reforma e uns quantos
poucos muito poucos pois mesmo com 25 anos no 25 de Abril
teriam hoje 61
e ou são oficiais generais
ou estão há espera de ser
porque os que não o são
nem esperavam ser já foram para os dinheiros da reserva que os mantêm até aos 70 longe da reforma
e do corte no salário
depois do 25 de abril beneficiaram de senhas de gasolina
pode ser que a moda volte
os alferes e tenentes de antanho são hoje tenentes coronéis ou coronéis na reforma
os sargentos mais velhos continuam primeiros
os mais novos são sargentos mores
e os mores da nova velha res publica são assim
nem todos os capitães são de abril
nem todos os abris são dos capitães
o tempo das capitanias já passou
É...
E existem os que promovem a guerra com leviandade como lobi do tem que ser...Porque é assim, é a vida...
E os reformados :
das empresas...
dos latifúndios
das novenas
das assembleias
(nem só das repúblicas)
Dos Sonhos
Dos pesadelos
Das doenças
Das saúdes
Dos campos
das cidades
da terra
da amizade
até de amor...
dos homens
dos deuses
Mas a gente... de Abril
Essa nem reforma nem jubilação...
Essa tem de encarnar e reencarnar
por favor...
Ó Menos Isso
Isabel Seixas
Continue Sr. Embaixador...
A esperança...Jamais se jubila
Simplesmente, não deixamos.
Belo almoço, o nosso!
Um forte abraço de um dos "reservistas"
"Será a nostalgia de um tempo de ilusões perdidas que nos volta a juntar, a memória dessa espécie de adolescência política, que agora revisitamos?"
Para mim é e fico feliz de saber que para tantos outros também é, agora mais que nunca.
Recordo a manhã do dia 26 de Abril quando, conduzindo pela marginal, vindo de Oeiras, onde morava, me dirigia ao escritório na Infante Santo, em Lisboa. Estava uma manhã algo nublada – talvez pressagiando o nosso então longínquo futuro e actual presente – e eu, olhando o Bugio, respirava uma brisa que se assemelhava àquela que costumava respirar sempre que me deslocava ao estrangeiro. Uma brisa estranha: - fresca e livre… Exultava interiormente.
Um ano passou. E, a 23 de Abril de 1975, quando nada o faria prever, fui conduzido a Caxias onde fiquei detido numa cela de isolamento.
Pensava que fosse engano mas não era.
Fiquei mesmo aí os 15 dias após o que me transferiram para uma cela com 14 beliches onde tive a companhia, entre outros, do Dr. Spínola, irmão do Marechal que eu assessorara e que dormia no andar de baixo, o ex-ministro do interior, César Moreira Baptista, o Embaixador Franco Nogueira, saneado da UTIC de Santa Maria onde, dois dias antes, dera entrada com um enfarte do miocárdio. Era Franco Nogueira uma pessoa, cuja arrogância televisiva sempre me impressionara desfavoravelmente, mas que vim a reconhecer como senhor de uma invejável cultura, extraordinária distinção pessoal e excepcionais dotes oratórios que a todos cativava. Aprendi muito com ele.
Entre outros, connosco estava igualmente o duque de Palmela (Holstein), que me ensinou a fazer “bluff” em “bridge”, coisa que nunca fizera, e o Presidente da Câmara de Castro Verde, cujo nome peço desculpa de não recordar.
“Realojado” seguidamente na Penitenciária de Lisboa, cela nº 100 do 3º andar da ala B, onde encontrei e fiz mais amigos e que um dia referirei quando escrevinhar uma pequena crónica que tenho em mente enquanto retenho na minha memória auditiva o característico ruído das Chaimites de então cor. “comando” Jaime Neves, esse sim, "heroico", que, em constante patrulha, nos protegia das previsíveis intenções de quem porventura quisesse utilizar uma metralhadora pesada colocada numa das varandas fronteiras à nossa ala prisional isto quando constava que Pires Veloso, vindo do Norte, cuja Região Militar comandava, estaria disposto a marchar sobre a capital.
Saí tal como entrei: - sem inquirição nem julgamento, de consciência tranquila e enriquecido com o curso de democracia intensivo que tirei ao reatar a tradição familiar prisional já que ambos os meus avós, materno e paterno, tinham sido presos pelos seus ideais republicanos de que nunca abdicaram.
A 24 mandei entregar no EMGFA um requerimento indagando das razões da minha detenção. Até hoje aguardo resposta para os esclarecimentos que então pedi…
Nem todos poderão ter idênticas e saudosamente boas recordações do post-25 de Abril. Eu sou um deles.
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