Um amigo antigo, homem "sábio" que conheci nas lides de Bruxelas, dizia-me ontem que o ambiente de mal-estar que atravessa a Europa se deve, essencialmente, ao facto de, pela primeira na história da unidade europeia, haver a clara consciência de que, às novas gerações, estará reservada, por um tempo indeterminado, uma qualidade de vida inferior à que as gerações precedentes usufruiram. No passado, o discurso oficial e o sentimento popular iam no sentido de mostrar que o "progresso" iria contribuir para a melhoria de condições de existência, razão pela qual valia sempre a pena ter esperança no futuro. Agora não.
"O problema já não é as pessoas não acreditarem que esta Europa nada pode fazer por elas. A grande questão é que começa a generalizar-se o sentimento de que as coisas estão piores por causa da Europa...", disse-me esse amigo, entre o desencantado e o resignado, mas, apesar de tudo, confortavelmente apoiado na choruda reforma que a União Europeia não deixa de dispensar aos seus leais servidores. Ao contrário do que sucede com as angústias por que passam os "civil servant" dos Estados membros.
Esta conversa fez-me lembrar uma graça que por aí anda, com a crise: "Este ano está a ser tão mau, tão mau, que já parece o ano que vem"...
14 comentários:
Caríssimo Embaixador Francisco Seixas da Costa,
Na verdade não só a ideia de constante progresso é já uma ferramenta do passado, pelo que a qualidade de vida dos cidadãos tem efectivamente decaído nas últimas décadas. Aliás, tal como o escrevo no meu último "post" também, por isso, a consciência ética da Humanidade tem acompanhado esta infeliz tendência, tal como o digo baseado em...
Saudações cordiais, Nuno Sotto Mayor Ferrão
www.cronicasdoprofessorferrao.blogs.sapo.pt
«A cidadania moderna, fruto da erupção revolucionária Francesa, está relacionada directamente com a formação da consciência nacional, pertença a uma comunidade e herança comum. Os actores ainda vêem o mundo por lentes redutoras, sendo que o seu mundo ainda se mede aos palmos. Soberania democrática da nação e direitos cívicos de cidadania casa com homogeneização da população. O jus soli e o sanguinis iriam aos poucos ser desgastados pelo multiculturalismo das migrações. A cidadania diferenciada e os direitos culturais de cidadania desacoplaram os direitos de cidadania e a identidade. Da polis ao Império, à cidade, ao Estado – Nação, ao agora nosso espaço global ou transnacional, a transição está processada.» Causa Vossa.
Na última noite, tive um mau sonho. Vi uma Europa a ferro e fogo, espezinhada pelo cínico Sino e pelo utilitarista descendente do AmeroÍndio.
No meio acotovelavam-se uns estranhas figuras de cinzento que apelavam à calma.
A turba, no entanto, esfomeada, saqueava os paços e as sedes dos grandes conglomerados. Afinal, nunca em tantos séculos de humanidade os recursos se postavam tão fáceis de alcançar, mas tão difíceis de distribuir e sufragar.
Tanta fartura que dá em fome, perguntavam uns tantos, enquanto anafadas criaturas globais rolavam em Rolls radicais, esperançados de encontrar novos paraísos onde se acobertar.
Sr. embaixador, um dia destes perceberemos que tudo é muito simples, absurdamente mais simples que aquilo que parece.
A mísera verdade reside no surgimento desta nova China, que, com a sua economia esclavagista, e, aqui e ali, com qualidades, apesar de tudo, para a qual não existe em lado nenhum do mundo capacidade de resposta, apenas uma tonitruantes, mas passageira, capacidade de absorver o que os chineses produzem.
E o problema reside neste dilema irresolúvel: A Europa e os EUA e, enfim, o resto do mundo, não pode copiar o modelo chinês, que afoga todas as outras economias, mas não pode, também, pagar do mapa o gigantesco país asiático.
Que fazer?? Nada! Definhar com dignidade, tentar sobreviver, até que a China morra do seu próprio veneno: matando o corpo que o alberga, a bactéria morrerá também.
Resta aos europeus ficcionar uma morte rápida para assustar os chineses!!!
Rita
É verdade: o futuro já não é o que era.
E a Europa também não, nem o é o futuro da dita.
Não sei se sentirei muita pena se a velha meretriz esticar o pernil.
"C'est peut-être la fin de l'euro. […] Si l'Europe ne règle pas ses problèmes institutionnels fondamentaux, l'avenir de l'euro sera peut-être très bref" […].
Joseph Stiglitz, prix Nobel d'économie.
Que “as coisas”, por esta Europa fora, tendem a piorar e o futuro não se afigura muito promissor para as novas gerações, parece cada vez mais provável, infelizmente. Não sendo um pessimista, mas também não querendo ignorar a realidade, julgo porém que não há, ainda, razões para desacreditarmos desta Europa. Por mim, continuo a confiar nela. Quanto aos jovens de hoje têm uma qualidade que creio bem faltava aos de gerações anteriores, ou pelo menos não era tão comum, que é a maior capacidade de aceitarem mudar de emprego, de se adaptarem a novas realidades e desafios profissionais, são mais flexíveis perante a oferta de trabalho e mais predispostos à mobilidade, de hoje estarem num sítio e amanhã noutro se tal for necessário, ou mesmo mais compensador economicamente. Serão uma geração, digamos, mais apta para enfrentar os desafios e dificuldades dos tempos modernos da Europa de hoje. Conheço vários exemplos disto, quer na família, quer entre os filhos de amigos e colegas de trabalho. Quanto à China, de que Rita fala, lembrei-me, a propósito, do comentário da National Geographic de ontem à noite, na RTP 2, sobre as grandes obras de engenharia (designadamente relativo à construção de pontes) que Pequim tem levado a cabo. A média salarial de cada trabalhador ali empregue era de 200 USD. Imaginando, todavia, que o progresso, aos poucos, vai chegando a toda a China, um dia aquele país, já muito mais desenvolvido, não vai poder continuar a pagar salários daqueles, as pessoas vão querer um melhor nível de vida, melhores salários, vão ser mais reivindicativas, vão conseguir ter mais direitos e tudo isso poderá ditar, aos poucos, um crescimento económico assente em valores claramente abaixo daqueles hoje conhecidos. Sem querer fazer futurologia, longe de mim, até porque sempre tive fundas reservas para com os “Professores Karambas” da política e economia, que por aí abundam, não julgo que à velha Europa esteja destinado um papel menor no futuro, ou que venha a definhar, gradualmente. Talvez a crise que hoje se vive acabe, tal como a nuvem vulcânica, por desaparecer. Wisfulthinking?
P.Rufino
"Karamba" meu caro P.Rufino hoje consegue estar mais optimista que o Professor!!!
O futuro para Portugal está cada vez mais complicado. Espero que não nos aconteça o mesmo que à Grécia. Nem Fátima nos salvará!
A ler :
http://www.lemonde.fr/economie/article/2010/05/05/moody-s-menace-d-abaisser-la-note-du-portugal_1347055_3234.html#ens_id=1268560&xtor=RSS-3208
Gostaria muito de partilhar o optimismo de P. Rufino, sem, no entanto, hurler avec les loups!
Apetece é...
Acreditar no P. Rufino
É o que vou fazer de momento.
Isabel Seixas
Isabel "de momento". Porque de futuro já não lhe aconselharei a fazê-lo...
Senhor Embaixador,
Felicito-o pelo sempre oportuno e relevantíssimo blog e aproveito para saudar os habituais ilustres comentadores pelas intervenções nele produzidas.
Começo por confessar que são enormes a admiração e carinho que nutro pelo sofrido povo Chinês. Se me permite, porventura um pouco "off-topic" gostaria de tecer duas ou três modestas considerações sobre a China. Trata-se de um vasto país com muitos problemas: censura, eleições indiretas, sobrepopulação, uma única ideologia política...contudo, a força intemporal da Escola Confucionista de que a própria diáspora está também impregnada, constitui o "Leitmotiv" civilizacional subjacente ao sucesso Chinês. Sabemos que os ensinamentos do Mestre Confúcio radicam em conceitos simples como: felicidade em família, amor entre pais e filhos, respeito pelo próximo, sociedade harmónica, o dever como fundamento da existência, entre vários outros.
Zhao Ziyang, então primeiro-ministro e secretário-geral do Partido Comunista Chinês, bateu-se pela imposição de uma reforma democrática que culminou com os acontecimentos de Tiananmen. Este dirigente, em caso de vitória ter-se-ia transformado num Gorbatchev. Com as suas ideias arricava-se a precipitar a nação mais populosa do planeta rumo à desintegração com consequências desditosas para os Chinesea e inevitavelmente para o resto do mundo. Sem estabilidade não haveria de4senvolvimento, nem a prosperidade a que já vínhamos assistindo desde 1978.
Em Portugal, inclusivo o mundo universitário, salvaguardadas algumas honrosas exceções, tem sido notório o desapego à multissecular História e Cultura Chinesas.
Sabe-se que Macau - mau grado um flagrante subaproveitamento da sua posição político-estratégica até 1999, pode continuar a representar para Portugal o átrio privilegiado do continente Chinês e, portanto, a porta aberta para um efervescente e próspero mercado da ordem das 250 milhões de pessoas...
Muito obrigado
M.Ruas Costa
6 de Maio de 2010
P. Rufino,
Concordo totalmente com seu ponto de vista.
Esclarecido!
C.Falcão
Bom dia
Talvez devido à minima mas inevitável parte feminina que - dizem - compõe qualquer homem, sempre gostei de historias com um fim feliz. :-)
Espero no entanto que o final desta europa não o seja, ou mais exactamente, que o seja para os cidadãos que a compõem.
Sendo adepto deste tipo de humor e falando de "final", gostei muito de : "Este ano está a ser tão mau, tão mau, que já parece o ano que vem". :-)
Mario Pontifice
Pois... Bem sabemos que predizer futuro pelo que já sabemos do passado retrata ambos...
A história...A própria ciência, são indicadores embora com margem de erro e relativismo da continuidade da procura de sentidos...
Reinventaremos ou reinventarão Deuses e anjos, os pobres desde logo endeusados por inerência manter-se-ão purificados não terão hipóteses de se corromperem, fiquem descansados e sós uns com os outros, terão companhia e atribuir -lhes-ão a idoneidade aquando o papel de eleitores se a amostra for significativa claro...
Eventualmente os candidatos a políticos terão que recorrer também a estratégias como acompanhar os peregrinos a Fátima, se acharem por bem... Idealizar eventualmente novos segredos que mantenham os espaços de ilusão de novos milagres...
De qualquer forma contra ventos ou marés ,ficção religiosa química/física, novas democracias ditaduras típicas ou atípicas...
Haverá pelo menos Amores possíveis e impossíveis...
Lideres e liderados...
Mortais/imortalizados
Claro também...Sem querer fazer futurologia...Que ideia.
Isabel Seixas
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