Para mim, Bruxelas foi sempre um simples destino de passagem. De todas as vezes, e foram algumas, em que se proporcionou ser lá colocado por alguns anos, esquivei-me e fiz outras opções de vida, nalguns casos nem eu sei bem porquê. Passei muitas centenas de horas a trabalhar fechado em salas "europeias" bruxelenses, às vezes com esses dias intervalados apenas por algumas escassas horas de sono. É talvez o insuportável cansaço desses "anos da Europa" que contribui para que, ainda hoje, não valorize suficientemente uma cidade onde sei que muitos desses meus amigos foram felizes e a vida parece ser bastante cómoda. E onde se come muito bem, como o "velho" Ogenblick uma vez mais acabou de comprovar.
Muito por conta dessas muitas visitas profissionais, fui um "frequent sleeper" em Bruxelas. Para além de casas de amigos, dormi por lá em 14 hotéis diferentes, segundo as minhas contas. E é de hotéis de Bruxelas que nasce esta história.
Muito por conta dessas muitas visitas profissionais, fui um "frequent sleeper" em Bruxelas. Para além de casas de amigos, dormi por lá em 14 hotéis diferentes, segundo as minhas contas. E é de hotéis de Bruxelas que nasce esta história.
Nos anos 70, da primeira vez que fui em serviço a Bruxelas, levar a mala diplomática, fui recebido por essa figura típica para várias gerações diplomáticas portuguesas que era o motorista da nossa delegação junto da NATO, o sr. Rézo (escrever-se-á assim?). No caminho do aeroporto para a cidade, e para fazer conversa e "armar-me" um pouco, comentei a velocidade de 90 km permitida usando a palavra belga "nonante", em lugar de "quatre-vingt-dix", acrescentando, "como vocês dizem por aqui". O sr. Rézo olhou para mim, surpreendido e quase ofendido, e exclamou: "Mas eu não sou belga!". E logo adiantou um qualificativo muito pouco simpático para os locais. Explicou-me, então, que era francês, de Vallenciennes, e que fora forçado a ir viver para Bruxelas quando a NATO saiu de Paris. Pelos vistos, não apreciara nada a mudança.
O nosso homem tinha, manifestamente, um arranjo qualquer com o Hotel Albert I, na place Rogier (hoje transformado num luxuoso Hilton), onde colocava todos os "correios de gabinete" (nome técnico para os portadores da mala diplomática). Ao tempo, o hotel, que tinha ares de ter sido bom, estava num estado sinistro. No segundo dia, mudei-me e o sr. Rézo não gostou.
Da vez seguinte que fui a Bruxelas, alertei o sr. Rézo, logo à saída do aeroporto, de que havia reservado um quarto em outro hotel, aliás numa esquina quase em frente ao Albert I. Vi que ficou furioso com a suspensão do arranjinho, talvez temendo que o meu exemplo frutificasse noutros colegas, afetando a sua comissão. Para distender a conversa, acabei por perguntar-lhe o que achava do hotel que eu escolhera. Foi seco e claro: "Pas mal pour un bordel...". Vá lá, não era.
7 comentários:
Acho que era Réseau, mas não tenho a certeza... Pré histórias!
alcipe
Sr. Emb. Francisco Seixas da Costa
Neste dia tão marcante para os Cristãos, não queria deixar passar sem lembrar o nosso amigo e desejar-lhe a si e toda a família uma Santa Páscoa.
Um abraço
Joaquim Pinto
Fiquei a conhecer o "Ogenblick" graças à Helena Barroco, aqui há uns 12 anos. Até lá, sempre que me calhava ir a Bruxelas, ignorava a sua existência. Como ela tinha vivido lá, sabia onde se comia bem. Aquelas mesas de madeira, aquele ambiente informal e aquele pato maravilhoso que eles sabem cozinhar tão bem, são características marcantes do Ogenblick.
P.Rufino
Bem...Convenhamos que o tal senhor Réseau "Olhava bem" era pelos seus interesses individuais e sobrevivência, pouco Chico Esperto...
Enfim , mas não caça Ratos...
Agora. também imaginemos que se confirmava a Sua Ressabiada opinião, o pior que lhe poderia acontecer era encontrar uma decoração ...sei lá...
Estimulante?!!! Quem sabe até uma cama piramidal!!!
Isabel Seixas
Santo humor o seu Embaixador. Pior aconteceu comigo em época de vadas magras- quase como agora - que decidi, em missão, ficar num hotel diferente do dos meus colegas.
Chamava-se qualquer coisa como "La gentilhommière", que me haviam dito ser aceitável. E eu sempre detestei andar em rebanho com as delegações atrás ou à frente.
à entrada achei veludos vermelhos a mais, mas o quarto era francamente bom e eu fiquei-me a rir dos colegas.
De noite a coisa tornou-se ruidosa e no dia seguinte mudei-me. Mas fiquei com a sensação de ter pernoitado num hotel de passagem...
Não sendo moralista, mas também não sou surda. Logo, não repeti a experiência.Ainda agora me rio quando me lembro desta história pouco moral!
Hoje o meu hotel aí é o Tremoille, quando não fico em casa!
Sou um "frequentador habitual" de Bruxelas por razões profissionais.
Contrariamente à maior parte dos meus colegas gosto da cidade, que não dos Belgas, sobretudo os flamengos (até o Brell teve problemas com eles porque não gostavam do seu "acento" holandês).
Pernotei em muitos, mas o meu favorito, sobretudo depois da remodelação, é o Carrefour de L'Europe na Rue du Marché aux Herbes a 50 metros da Grand Place.
Permitia chegar, arrumar a mala e 5minutos depois deliciar-me na Chaloupe d'Or com uma bela Duvel.
No verão, na esplanada, em fim de tarde, beber uma cerveja e olhar para a mais bela praça do mundo reconcilia-nos com o mesmo
Esclareço que a "estória" que contei se passou em Paris!
Em Bruxelas o meu hotel de eleição era o "Amigo". Mas hoje fico em casa, porque o meu neto mais velho daqui a poucos meses vai para lá e eu, que o adoro e não me vejo sem o visitar preciso de poiso adequado!
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