E se o "E depois do adeus", o Maia, o Carmo, o outro Marcelo, os tanques, a Grândola, as fardas, o Otelo, a Junta, o Spínola, o cravo, a Pide, o Zeca, a censura, o MFA, Caxias, o "povo unido", Peniche, o Cunhal, a tv a preto-e-branco e toda a parafernália de datas e de siglas pouco disserem aos que hoje passam "a salto" de Ryanair as fronteiras de Schengen, aos vidrados nos iPad, balanceantes dos iPod, logados nos iPhone, para quantos vão para hostels, sem saberem onde e o que foi Champigny, os bivaques da guerra colonial ou a triste sina nos paradeiros de exílio?
É que cada vez é mais difícil fazê-los ouvir falar da "frigideira" do Tarrafal, da “estátua”, das patifarias do Botas de Santa Comba, de quem foi o Manuel Tiago ou onde eram as tipografias da clandestinidade. E que sabem eles do Copcon ou da 5ª Divisão, do MDLP ou do ELP, do MES ou a FEC-ML? Por quanto tempo será possível fazê-los escutar o Furtado ou o Fialho a lerem comunicados do "posto de comando", a Luísa Bastos a gritar o "Avante Camarada", a poética neorealista com a rima prenhe de "povo", a saltitante “Gaivota", o hino marcial da Intersindical a conclamar as "massas" p'ró que der e vier? E até quando os poderemos manter atentos às memórias do 11 de março ou da Constituinte, do padre Max ou do cónego Melo, das bombas da reação (que não passaria mas afinal passou) ou do PRP?
Alguns dirão ser uma causa perdida, que a nossa compulsão comemorativa anual, de cabelos brancos e cravos vermelhos, mais não é do que a desesperada tentativa de nos agarrarmos ao tempo, como os republicanos que estiveram na Rotunda e não se calaram com essa história até ao dia em que o chanfalho do Gomes da Costa os pôs com triste dono, por quarenta anos.
E, no entanto, será que dizer “fascismo nunca mais” é uma palavra de ordem datada, nestes tempos de Trump, de Salvini, de Le Pen ou de Orbán? Alguém se atreve a dizer que lutar contra o racismo, a xenofobia, a discriminação das minorias é uma luta do passado? Será que, nestes dias de “fake news”, não tem sentido clamar por uma informação livre, pela verdade, sem censura nem distorção dos factos? Ao vermos a extrema-direita já ali na esquina, não será afinal uma boa razão para as novas gerações perceberem a importância de comemorarem uma data que continua a ser o glorioso contrário de tudo isso?
Eu, por mim, já optei. Orgulhosamente, de cravo ao peito, com uma força proporcional à irritação que isso provocará sempre noutros, direi: viva o 25 de abril, sempre!