domingo, setembro 04, 2011

Festas

A "Festa do Avante", que teve lugar este fim de semana em Lisboa, segue o modelo da francesa "Fête de l'Humanité" (criada em 1930), que também inspirou a italiana "Festa dell'Unità" (criada em 1945 e que durou até 1991). Originalmente destinadas a coletar dinheiro para os jornais oficiais dos respetivos partidos comunistas, acabam hoje por ser importantes fontes de financiamento partidário.

As festas portuguesa e francesa são considerados dos maiores eventos do género em toda a Europa. A sua assistência foi sempre muito para além das pessoas ligadas às forças políticas que pretendem apoiar, tendo hoje uma forte população jovem. Em ambos os países, os espetáculos musicais que apresentam, bem como algumas outras iniciativas culturais, atraem uma público heterogéneo. Para além, convém não esquecer, das tasquinhas e lojas regionais, onde se come muito bem e se encontram excelentes produtos. Quem para aí estiver virado, até pode ouvir falar de política...

Estive numa "Fête de l'Huma" (como aqui se designa), em 1980, numa passagem por Paris. Recordo ter por lá comprado um excelente presunto de Auvergne, que levei para a Noruega, onde então vivia, bem como a primeira edição brasileira, hoje rara, de "A Questão Agrária em Portugal", um livro de Álvaro Cunhal, de 1968.

Em Portugal, fui à primeira Festa do Avante, realizada na FIL, em 1976. Creio que em 1978, voltei à festa, então no Jamor. E, em 1986, recordo-me de ter estado numa edição na Ajuda. Nunca fui ao local onde a festa hoje tem lugar, na Atalaia.

Achei sempre muito interessante passear por essas festas comunistas, que são retratos sociológicos impressivos de um mundo muito especial, feito de histórias, de lutas, de mitos, de ilusões e de realidades muito duras. Não me recordo de, em alguma das visitas, ter assistido a nenhum comício político. No caso português, sempre aproveitei as ocasiões para equipar a minha (agora) imbatível coleção de discos de música portuguesa de inspiração política, dos "anos da brasa" de 1974/75, bem como para obter alguns livros em falta. E, também sempre, para me encher de poeira e cansaço, o que me não entusiasma a repetir a experiência no futuro.

Da festa no Jamor, quando a Revolução portuguesa estava ainda "fresca", tenho na memória uma cena passada no stand transmontano onde, naturalmente, fiz questão de ir jantar. Estava eu por lá entretido a degustar uma alheira com um razoável tinto da região quando vi aproximar-se um velho colega de escola primária, de Vila Real, que eu sabia "responsável" do PCP local. Mostrando-se um pouco surpreendido com a minha presença, e suspeitando-me - e bem! - como simples "turista político", fez-me a seguinte, mas algo sofisticada, pergunta: "Vieste cá por vir ou vieste porque devias vir?". Saiu-me esta resposta: "Olha! Eu vim porque me apeteceu. E tu?". Não me recordo se me respondeu. Com as voltas que o mundo comunista entretanto deu, tenho a impressão que ele já por lá não andou este ano.

17 comentários:

Santiago Macias disse...

Se o problema for só a poeira, a questão está ultrapassada: as ruas da Atalaia estão devidamente pavimentadas. E, sinal dos tempos, durante o comício as tasquinhas já não fecham.

Anónimo disse...

parecem-me demasiado politicamente (in?)correctas aquelas bandeiras apenas vermelhas

mas cada um é como cada qual


bem haja

Um Jeito Manso disse...

Caro Embaixador,

Gostei de ler este seu post.

Justamente hoje, ao fim de muitos anos depois de uma ida à Festa ainda em Lisboa, com muita poeira e num dia de grande calor, fui à Festa do Avante.

Gostaria de o convidar a ver a 'reportagem' que lá fiz ( http://umjeitomanso.blogspot.com/2011/09/festa-do-avante-uma-animada-festa.html ).

É uma festa popular, disso não haja dúvida e penso que as minhas fotografias espelham um pouco do ambiente que lá se vive.

Contudo, penso que terá razão: em termos muito pragmáticos, a única utilidade será a de reunir fundos para o partido.

Cumprimentos.

Anónimo disse...

A mim não me apanham lá! É o caos no estacionamento! Mal organizado!

GM

Isabel Seixas disse...

Eu também bem gosto de festas, oh se gosto, gosto de tudo tudo até das especificidades e diferenças, se os aviõezinhos que saem da Bila para a capital fizessem umas excursõezitas mais em conta , bem tinha ido com a família...

Assim vi os comentários...

Rui Franco disse...

Nunca lá tinha ido mas, este ano, para me estrear, fiz questão de lá estar nos três dias. Como evento cultural achei magnífico: um preço baratíssimo por três dias de música, teatro e cinema. Uma festa que agrada a todos e onde se nota que as pessoas estão com gosto. É para repetir, pois.

Quanto à comida... preços caríssimos e qualidade má. Aliás, achei uma perfeita ironia estar a olhar para uma parede pintada com um dizer do tipo "não à carestia" (ou coisa do mesmo calibre) enquanto "degustava" um mau bife acompanhado por uma batata e um nico de salada, servido num pratinho de plástico ao som da minha consciência que dizia "deste treze euros por isto?!".

Anónimo disse...

ERA UMA VEZ

Caro Sr. Embaixador:
A propósito de discos dos "anos da brasa" veja lá se tem estes:

A MÃE
12 canções de José Mário Branco
para uma peça na Comuna/Teatro de Pesquisa

ou este
POIS CANTÉ
do Grupo de Acção Cultural Vozes da Luta

Tempos de loucura e utopia.
Guardam-se as memórias...sorrindo.Nunca fui à Festa.

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Santiago Macias: essa é deliciosa! Então as tasquinhas fechavam durante os comícios?!

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Anónimo das 00:37: aquelas festas têm aquela cor. C'est tout.

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Um Jeito Manso: obrigado pela reportagem, que enriquece o post.

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Era uma Vez: o primeiro não tenho, embora tenha visto a peça. O segundo tenho.Há nomes curiosos no coro...

Anónimo disse...

O sr. embaixador admira-se por as tasquinhas antigamente fecharem durante o comicio ? o sr. já se esqueceu quem era o discursante? não acha que foram momentos únicos, para quem o ouviu, concordasse ou não com ele ? quando comparado com esta rapaziada que nos governa, é caso para dizer: que saudades, ai ai...

Anónimo disse...

Caro Senhor Embaixador

Dou-lhe os parabéns por ter falado mais da Festa do Avante que qualquer órgão de comunicação social dito "pluralista"

Helena Oneto disse...

Que boa ideia relembrar festas vermelhas!
Tenho uma ideia muito vaga do fervor politico da primeira Festa do Avante e recordo o fervor politico e festivo da minha primeira -e ultima- Fête de l'"Huma". No ano passado voltei à Festa do Avante onde o fervor festivo esta muito bem visto na excelente reportagem da autoria de "Um Jeito Manso". Gostei dos concertos, apesar da 'estafadeira' que apanhei.

jose albergaria disse...

Creio que foi o jornalista Bessa Múrias, numa única ida à Festa do Avante, de tão impressionado que ficou com a organização, com a oferta de comes e bebes, de concertos, de iniciativas culturais, terá afirmado para os que com ele por ali andava:- Olha se lhes desse para o bem!

Anónimo disse...

ERA UMA VEZ

Tenho um velho amigo que tem esta máxima: Só há das instituições capazes de organizar um evento,como deve ser:

A Igreja e o Partido Comunista!

Às tantas...

Portugalredecouvertes disse...

Gostei imenso deste post!

já história do país, mas ainda tão palpável!

também adoro as festas que por cá se fazem, tanta gente a trabalhar para entretimento dos outros incluindo muitos voluntários (quase ideia cristã!)
Espero que em breve não nos baixem as quotas das festas!

cumprimentos ao Sr. Embaixador

Os ácidos

Nos anos 60, a expressão que vai em título tinha outro significado. Nos tempos que correm, pode aplicar-se a quem se dedica, por vício ou em...