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sábado, agosto 27, 2011

A Líbia vista de outro lado

Há textos que ficam para a história (pequena ou grande, cada um que escolha) do nosso jornalismo. Hoje chegou-me um deles. É uma interpretação do que se passa na Líbia, sob uma perspetiva e um estilo lexical que eu pensava já arquivados nos escaparates da memória. Mas não, pelos vistos. 

Duas notas neste relato: uma curiosa, outra irónica. A referência aos "supostos criminosos de guerra da ex-Jugoslávia" e o facto de uma das fontes ser, assumidamente, o "The Economist". Não percam, a sério. Aqui.

quinta-feira, agosto 25, 2011

Imprensa

O tempo da comunicação social mudou muito. É meu hábito antigo guardar os jornais da manhã até ao final do dia, pela "angustiante" sensação de que neles ficou muito por ler e pela ilusória ideia de que acabarei por fazê-lo mais tarde. Só que, a essas horas, dou-me conta da quase total irrelevância daquilo que eram as "notícias" que esses jornais traziam, praticamente todas já ultrapassadas pela avalanche de noticiários televisivos e dos "sites", que entretanto ocorreu. Salvo para aquele universo de leitores que se contentam (e estão no seu direito) com as "pílulas" informativas a cuja fabricação alguma imprensa "apressada" hoje se dedica (pequenas notícias, com escassas centenas de carateres, que caricaturam os factos, como hoje são certos diários portugueses), tudo parece encaminhar-se para que os jornais, para terem algum sentido, se tornem, cada vez mais, veículos de análise e opinião e, cada vez menos,  portadores de notícias "requentadas". Lembro-me que, quando o "Público" foi criado, se dizia que a sua ambição era ser uma espécie de "Expresso" diário, o que corresponderia um pouco a esse conceito de uma imprensa que queria "ir um pouco mais longe", como à época já fazia o "Le Monde" ou o "El País". Na realidade, o "Público", que começou assim, acaba hoje por já não ser isso, embora, em Portugal, seja o jornal que mais próximo fica do modelo. Mas, num futuro próximo, será que as pessoas terão tempo para ler jornais diários meramente analíticos, com artigos cuja extensão e profundidade obrigam a uma disponibilidade pouco consentânea com o ritmo de vida de hoje? Por isso, com a proliferação dos Ipads, com os "alertas" nos telemóveis, os écrans dos computadores à nossa frente todo o dia, os "flashs" da rádio no carro e a omnipresença das televisões (com noticiários ou rodapés informativos) será que vai haver espaço para uma imprensa diária em papel? Começo a duvidar.

Em tempo: excluo a imprensa desportiva, cuja sobrevivência está garantida, "porque sim". Quando digo aos meus amigos estrangeiros que existem, em Portugal, três diários desportivos de dimensão nacional, eles começam a perceber melhor a questão do nosso défice...

terça-feira, agosto 02, 2011

Inquéritos

Os "inquéritos de verão" são uma epidérmica manifestação jornalística da "silly season". Há-os agora em versão culta, a puxar para o "profundo".

Hoje, num jornal "de referência", a primeira pergunta do jornalista ao intelectual inquirido é: " É fácil ser intelectual nesta terra medíocre?".

O intelectual, que modesta e sabiamente recusa o qualificativo, responde que considera "muito irritante que as pessoas achem que o país não está à altura delas".

Uma interpretação benévola tomará a pergunta por uma subtil ironia. E que a resposta do inquirido não representa uma bofetada de luva branca. Opiniões.

segunda-feira, julho 25, 2011

"Todos os fogos o fogo"

Os telejornais preparam-se afanosamente. Já por lá se vêm os primeiro mapas com as chamas. Falta muito pouco para os inenarráveis diretos, para os microfones, tipo corneto, nas mãos das Sónias Cristinas (de onde é que saem, todos os dias, essas novas meninas do jornalismo televisivo ofegante?) de cabelo ao vento, de rapazes de léxico restrito e camisa aberta até ao quarto botão, sempre com chamas ou fumos "do rescaldo" por detrás, berrando evidências, entrevistando populares de balde ou mangueira na mão, revoltados com o mundo e esvaídos de cansaço, a quem colocam questões profundas como "o incêndio esteve quase a atingir a sua casa, não foi?", "acha que os bombeiros são suficientes?" ou o inevitável clássico "como é que se sente?", para tudo esperando respostas inéditas. Chega depois o comandante dos bombeiros, falando, grave, no número de "homens envolvidos no combate ao sinistro", lamentando a escassez de meios aéreos, insinuando supostos incendiários ("Não deixa de ser estranho que tenham surgido três frentes simultâneas..."). Depois, momento áureo, é ouvido um membro do governo em pose estival, com presidentes de Câmaras e presidentes de Juntas ligeiramente atrás, que inventaria o dispositivo e dá nota das rigorosas medidas "já implementadas". Em fundo de cena, a costumeira legião de patetas passeando-se de telemóvel no ouvido, para serem vistos pela prima, lá em casa.

De canal em canal televisivo, o verão noticioso é assim. O mesmo, todos os anos. Só que ninguém pergunta a ninguém se foi feita, a tempo, a limpeza das matas, se se respeitaram as distâncias de segurança entre as residências e as áreas de mato combustível, se foram tomadas as medidas de precaução necessárias, que todos conhecem e ninguém pratica.

Pena é que isto não faça parte do "memorandum of understanding" da "troika"...

terça-feira, julho 12, 2011

Jornais

A realidade é a mesma, os olhares têm subliminares diferenças. Descubra-as:

"Dois anos de recessão profunda, prevê o Banco de Portugal", escreve o "on-line" do "Público".

"Banco de Portugal prevê recessão menor que a troika", no "site" do "Diário de Notícias".

sexta-feira, junho 24, 2011

Aquela gabardine

Vou ter saudades daquela gabardine, daquele jeito desajeitado de coçar a cabeça posta de lado, daquele olhar enviesado a rasar o chão, daquele tabaco orgulhosamente incorreto, daquela gravata descaída (agora já tão em moda...), daquela inteligente dúvida final que, quase sempre, traçava o princípio do fim do culpado.

Morreu Peter Falk, o detetive "Columbo", um anti-herói, um dos meus atores íntimos.

quarta-feira, junho 15, 2011

Votos

Uma locutora da conhecida escola do jornalismo ofegante, presente na sala onde hoje se contam, com toda a serenidade, os votos das comunidades portuguesas no estrangeiro, afirmava há pouco, numa televisão, de forma jornalisticamente irresponsável, que o ambiente vivido na sala parecia o de uma "eleição africana" (aquele telejornal é transmitido também por toda a África, pela SIC Internacional). 

Ora o ambiente era idêntico ao de qualquer local de contagem manual de votos, em todo o mundo. Com o seu comentário, a senhora em causa, para além do seu triste e preconceituoso eurocentrismo, lançou uma nota de injusto descrédito sobre o sistema eleitoral português, cuja eficácia está acima de toda a suspeita, tanto mais que tem todos os mecanismos de fiscalização e controlo necessários para o apuramento rigoroso da vontade popular.

A locutora já se deve ter esquecido da "africana" Flórida...

quinta-feira, maio 26, 2011

Jornal da tarde

Senti que havia qualquer coisa de Lisboa, anos 70, no Paris de hoje. 

Num restaurante da "rive gauche", a animação da chegada do vendedor do "Le Monde", à hora do café, no fim do almoço, que João Gomes Cravinho e eu pudémos testemunhar, fazia lembrar (a mim, porque ele não tem idade para isso) o surgimento dos ardinas, na tarde lisboeta, a anunciar o "Diário de Lisboa" e os restantes vespertinos. Mesmo a impublicável graça com que o "Monde" foi anunciado.

Será também por isso que Paris "diz" tanto a uma certa geração portuguesa.

"Kill the messenger"?

Há uns tempos, quando uma aluna agrediu uma professora que lhe retirara o telemóvel numa aula, recordo que o primeiro cuidado foi procurar saber quem filmara a cena e a colocara no YouTube, para a respetiva responsabilização criminal. 

Agora, perante a difusão, pela internet, de  brutal agressão de que uma adolescente foi objeto por parte de duas colegas, a televisão portuguesa entrevistou "sumidades" sobre a gravidade... da filmagem e difusão da cena. Com a descoberta de que o "realizador" tem antecedentes criminais, as consciências acalmaram-se. 

A divulgação de ambas as cenas, independentemente da motivação de quem o fez, acaba por ter um efeito pedagógico. Eu diria mais: acaba por permitir que alguém trate dos factos ocorridos, o que provavelmente não aconteceria se o YouTube não tivesse intervindo.

quarta-feira, maio 25, 2011

Dobragem

Nunca, em toda a minha vida, vi um filme ou um episódio completo de uma série televisiva que fosse objeto de dobragem. É uma opção pessoal, de que nunca me afastei. Tendo vivido em alguns países em que a dobragem das séries estrangeiras era a regra, há muita coisa que não vi e outra que tive de comprar em DVD. 

A primeira vez que recordo de me ver confrontado com uma dobragem terá sido em Verin, em Espanha, nos anos 60. Na sala de estar do único hotel daquela vila, desatei às gargalhadas, para espanto dos restantes clientes, ao ouvir, na série televisiva "Bonanza" (quem se recorda?), passada no Texas americano, as exclamações ingénuas de Hoss, ditas em castelhano. Há pouco tempo, noutra cidade espanhola, apareceu-me, na televisão do quarto de hotel, o "Casablanca" dobrado. Foi como assistir a uma comédia, particularmente para quem, como eu, conhece, de cor, diálogos de certas cenas. Para bem se entenderem os malefícios da dobragem, basta que se imagine em que "estado" ficariam os ditos lisboetas de Vasco Santana ou de António Silva se "O Pátio das Cantigas" fosse dobrado em espanhol...

Hoje, assisti, por minutos, à cena mais ridícula a que dobragem pode conduzir. Tratava-se de um diálogo entre uma escocesa e um inglês. A totalidade da graça subjacente ao texto tinha a ver, não apenas com a fonética e as diferenças no sotaque, mas igualmente com alguns trocadilhos, que só seriam possíveis de entender em língua inglesa. Pressentia-se essa graça "ao longe", por detrás da dobragem, mas apenas para quem conseguisse presumir o texto original. Um puro absurdo. Em francês.

A indústria da dobragem é uma "mina" para os atores, pelo que é imensamente protegida por esse lóbi e por um comodismo da habituação no público, que acaba por funcionar em detrimento de um melhor conhecimento das línguas estrangeiras. Em alguns países ainda tem, como justificação com fundamento "democrático", a existência de analfabetismo e a necessidade de facilitar a essas pessoas o acesso ao conteúdo dos filmes. Só que esse argumento não colhe, aqui em França.

Em tempo: reconheço que a dobragem de filmes infantis é um caso bem diferente

segunda-feira, maio 23, 2011

Notícias da lavoura

No auge dos tempos revolucionários de 1975, o Alentejo vivia sob as movimentações da Reforma Agrária, com a ocupação das propriedades rurais e o ataque aos respetivos detentores - os "grandes agrários", tidos como historicamente responsáveis por graves injustiças sociais e económicas, autorizadas e protegidas pela lei e pela repressão policial, durante a recém-abolida ditadura. "A terra a quem a trabalha" era o lema que dava corpo a um movimento tendente a forçar uma reversão de poder, onde o Partido Comunista Português teve grande influência, nele se destacando a criação das UCP's (Unidades Coletivas de Produção), estruturas emblemáticas no novo modelo produtivo em expansão nas grandes propriedades. A realidade agrária alentejana iria ter impactos muito fortes nos equilíbrios da governação do país, podendo considerar-se que, durante vários anos, marcou fortemente a evolução da política interna portuguesa, muito embora o saldo final de toda essa turbulência tenha ficado muito longe dos objetivos revolucionários originais.

Com a Reforma Agrária a marcar então, quase quotidianamente, a agenda política nacional, passava-se, na televisão portuguesa, um fenómeno bizarro, quase marginal mas que, visto à distância, não deixa de ter alguma curiosidade. Sobrevindo do tempo anterior ao 25 de abril, mantinha-se na grelha de emissão da RTP o programa "TV Rural", dirigido pelo engº Sousa Veloso, uma figura sorridente e cordial, que anos de presença regular no écran haviam transformado num visitante virtual da casa de todos os portugueses. E de que falavam os programas de Veloso? Da "outra" vida rural, da "lavoura", de experiências agrícolas e de práticas de produção tidas por exemplares. Enquanto no Alentejo arrancavam as campanhas mobilizadoras para a viabilização produtiva das UCP's ou das novas cooperativas, Sousa Veloso mostrava-nos, impávido aos ventos da Revolução, a glória da pêra-rocha do oeste, a safra desse ano dos melões de Almeirim, os resultados do combate ao míldio nas uvas do Dão ou as novas técnicas usadas no azeite da terra quente transmontana. Nem uma palavra sobre o Alentejo!

O blogue de um embaixador de Portugal, neste "verão quente" da política portuguesa, pode, por razões que a obviedade explica, ser comparado ao "TV Rural" de Sousa Veloso. Digo isto para que não estranhem que, nestes tempos mais próximos, eu me continue aqui a ocupar apenas da minha "lavoura".

domingo, maio 22, 2011

DSK e as siglas

O destino do antigo diretor-geral do FMI e putativo candidato socialista à presidência francesa, Dominique Strauss-Kahn, continua a dominar o mundo mediático local. As televisões despacharam correspondentes para Nova Iorque, que dizem mais ou menos aquilo que opinam os nossos esforçados enviados, mas, nem por isso, os telejornais têm um minuto que seja a mais, para além dos 30 habituais. Em Portugal, bem deveria aprender-se com este exemplo.

Strauss-Kahn é aqui vulgarmente referido na imprensa escrita pela sua sigla do seu nome - DSK. Ontem, dei comigo a tentar lembrar-me a quem esta simplificação nominal também se aplicou ou aplica aqui em França. Pode ser que haja outros, mas, de memória, só vejo os seguintes: o desaparecido jornalista e político Jean-Jacques Servan-Schreiber (JJSS), a atriz Brigitte Bardot (BB), o jornalista televisivo PPDA (Patrick Poivre d'Arvor), a antiga ministra Michèle-Alliot Marie (MAM), o filósofo Bernard-Henri Lévy (BHL) e a ministra do Ambiente, Nathalie Kosciusko-Morizet (NKM). 

Não é fácil uma justificação para a ocorrência destes diferentes casos e, em especial, para não haver muitos outros. A única destas siglas que representa um acrónimo (isto é, que se lê como uma palavra) é "MAM" e há quem diga que o estilo pessoal "régalien" da antiga ministra pode também ter ajudado a fixá-lo. No caso de JJSS, a sua frustrada tentativa de reproduzir na Europa um estereótipo americano, na senda de Kennedy (JFK), terá contribuído para a criação da sigla. Nas restantes siglas, a sonoridade fácil de BB e PPDA e a complexidade dos dois outros nomes (com as consoantes H e K a reforçarem a "estranheza" fonética) igualmente podem ser uma justificação. Mas não sei se estarei certo. Verdade seja que ser identificado mediaticamente por uma sigla acaba por ser um fator distintivo bastante prestigiante, porque traduz um duplo reconhecimento público (o nome e a sigla que o simplifica). Tenho a sensação que nenhum político desdenharia essa possibilidade. Diria mesmo mais: todos lutariam para a obter.

Não conheço bem a situação noutros países. Nos Estados Unidos, surgem-me à ideia Franklin Delano Roosevelt (FDR) e John Fitzgerald Kennedy (JFK), ajudados, no presente, pelo facto de, no primeiro caso, dar o nome a uma importante artéria de Nova Iorque (FDR Drive) e, no segundo, a um aeroporto da mesma cidade (JKF Airport). Com um grau diferente de popularidade, aparece LBJ (Lyndon Baines Johnson), vice-presidente e sucessor de Kennedy, que se presume tenha começado a ser designado por uma sigla na senda da daquele. No Brasil, julgo que há apenas três nomes que a imprensa consagrou como siglas: os antigos presidentes Juscelino Kubitchek (JK) e Fernando Henrique Cardoso (FHC), bem como desaparecido político baiano António Carlos de Magalhães (ACM).

Desconheço o que passa noutros países, mas noto que, por exemplo, no Reino Unido não há esse costume, muito embora a importância da sua imprensa tablóide, com títulos garrafais a incitar à simplificação, pudesse ajudar a isso.

E em Portugal? Não me recordo de algum político ou figura pública* objeto de designação simplificada por uma sigla. Salvo um velho jogador do Vitória de Setúbal, Jacinto João, que a imprensa sempre designava por JJ. Sigla idêntica à que, nos anos 60 e 70, utilizávamos informalmente para um professor universitário, que o destino viria a trazer para as páginas dos jornais. Também por razões de justiça.

* Em tempo: os comentários começam a corrigir este post 

Falhas detetadas no texto
Em França: VGE (Valéry Giscard d'Estaing)
Em Portugal: MEC (Miguel Esteves Cardoso), BB (Baptista Bastos), PQP (Pedro Queiroz Pereira), EPC (Eduardo Prado Coelho) e APV (António-Pedro de Vasconcelos)

sábado, maio 14, 2011

"Homens da luta"

Não sei (nem me interessa, confesso) se esta minha afirmação vai parecer pouco patriótica a alguns, mas ao passar ontem pela cobertura televisiva do famigerado festival da Eurovisão, não senti a menor saudade pelo facto de por lá já não ver os "Homens da Luta", o grupo "musical" que, aparentemente, terá sido escolhido para representar um certo Portugal (digo "um certo", porque me não representou a mim, pelo menos) nesse certame.

Há alguns tempos, menos bons, em que os povos se envolvem em atitudes de pungente auto-flagelação, que conduzem à consequente degradação da sua imagem, à revelação de facetas de si próprios que o bom gosto, e até um mínimo de urbanidade, recomendaria fossem mantidos em pudico recato.  Esses são também os momentos em que, por exemplo, vemos o léxico público descer dos limites recomendáveis de salubridade verbal, em que o abandalhamento parece tomar conta de alguns discursos. Quando assistimos, infelizmente já sem nos surpreendermos, ao nível a que desceram certas "queima das fitas", bem como à escolha das figuras musicais que são convocadas para animar algumas alarves libações, isso diz-nos bastante sobre o país que hoje, infelizmente, (também) somos.

Neste campo, devo dizer que só com um imenso esforço de imaginação seria possível escolher melhor, como representação caricatural daquilo que alguns estrangeiros sempre pensaram de nós, uma "euro-visão" do nosso país como aquela que os "Homens da Luta" por aí apresentaram. E mais não digo, porque isto é triste, porque isto existe, porque isto é (o nosso) fado.   

terça-feira, maio 03, 2011

Memória

Há dias, o "Público" deu forte destaque, em primeira página, à morte de Vitorino Magalhães Godinho. Tratando-se de uma figura cimeira da historiografia e da nossa vida cívica (demitido da função pública pela ditadura, ministro da democracia) nada era mais justo. Porém, a notícia era ilustrada com uma fotografia... do irmão do historiador, o advogado José Magalhães Godinho.

No dia seguinte, o jornal não retificou o seu erro, Só o veio a fazer posteriormente. O que leva a presumir que aqueles - apesar de tudo, deverá ter havido alguns - que deram conta desse erro crasso já nem se terão dado ao cuidado de alertar o jornal. Ou -  pior ainda! -, se o fizeram, o jornal manteve-se indiferente na sua edição imediata, o que também é grave.

Os jornais são, cada vez mais, importantes arquivos da nossa memória coletiva, agora ajudados pelas suas versões "on line". Pensar-se que é normal que os seus redatores, só porque pertencem a gerações mais novas, não estão obrigados ao extremo rigor histórico-cultural é entrar num inaceitável caminho de facilitismo. Se aqui, em França, o "Le Figaro" ou o "Libération" trouxessem uma imagem de Simone Signoret em lugar de Simone de Beauvoir, ou de Simone Weil em lugar de Simone Veil, garanto que caía  "o Carmo e a Trindade"!

Pois há dias, um jornal português, que me passou pelas mãos, trazia fotografias ilustrativas do período do "marcelismo". Numa delas via-se Américo Tomaz rodeado de representantes de "forças vivas" de qualquer localidade de província. A legenda era: "Marcelo Caetano com alguns dos seus ministros"...

Este é - felizmente! - um défice que escapa à "troika".

Depois de Bin Laden

Ontem, durante o noticiário das 19.00 da SIC Notícias, conversei com Teresa Dimas sobre o caso do dia: a morte de Bin Laden. Limitei-me a dizer algumas coisas óbvias, nesta fase em que apenas nos é possível avançar suposições.

Devo dizer, que ao ver as peças que antecederam a entrevista, senti alguma incomodidade com as imagens de celebrações alegres em torno daquela morte. Bin Laden era um criminoso, autor moral de milhares de mortes. Os mesmos valores que me levam a apoiar empenhadamente a luta anti-terrorista obrigam-me a não poder comungar um júbilo público por uma morte. Mas, porque não vi muita gente preocupada com isso, deduzo que devo ser eu quem está equivocado.

A saída de cena de Bin Laden, sendo uma notícia que pode prenunciar tempos de esperança na atenuação das tensões no Médio Oriente e Ásia Central, não pode deixar lida em conjugação com a instabilidade em todo o mundo árabe, tornando a equação geral com um resultado de muito difícil antecipação, em especial para atores que se atribuem responsabilidades à escala global, como é o caso dos Estados Unidos. 

Talvez por esse motivo se compreenda melhor a frase que João Vale de Almeida ontem nos dizia ter ouvido a Brent Scowcroft, o antigo "National Security Advisor" de administrações republicanas, procurando caraterizar o delima americano, em face do estado geral do mundo árabe: "Sentimo-nos como um malabarista que, ao mesmo tempo que procura circular e manter no ar as bolas que manipula, tem a necessidade de ir preparando um "souflé" ". Ou, lido por outros modos: alguma coisa pode falhar.

Em tempo: sobre este tema, publiquei hoje no "Diário de Notícias" um curto artigo.

Diálogo transatlântico

Não faço ideia se nos Estados Unidos as pessoas se preocupam tanto com a relação transatlântica como nós, europeus, o fazemos. Mas, francamente, não me parece mal. A capacidade da Europa para fazer passar e executar, com eficácia, a sua agenda política depende, em muito, do modo como conseguir articular-se com o seu parceiro do outro lado do Atlântico - com o qual partilha muitos princípios comuns, embora dele pontualmente divirja. Mas continuo convicto que, entre a Europa e os EUA, e para utilizar uma terminologia maoísta, só haverá "contradições não antagónicas".

Ontem, em Lisboa, durante várias horas, numa excelente iniciativa do Observatório de Imprensa, em articulação com o gabinete da Comissão Europeia em Portugal, dirigido por Margarida Marques, o embaixador europeu em Washington, João Vale de Almeida, e eu próprio lançámos um debate com jornalistas portugueses especializados em temas económicos (com a curiosa presença de um membro da delegação do FMI, incluído na "troika" que negoceia com o governo português o programa de ajuda financeira). O convite foi-nos formulado por Joaquim Vieira e Teresa Moutinho, tendo Nicolau Santos e Helena Garrido como condutores da discussão.

O "menu" tinha por título: "Relações Europa-América: veja as diferenças". Três tópicos essenciais serviam de base às nossas intervenções, bem como ao período de questões que se lhes seguiu:
  • Reação da UE e dos EUA à crise financeira e económica. As diferentes formas de abordagem do problema e a posição do euro perante a disputa cambial sino-americana.
  • Relações com os países emergentes. Prioridades das políticas externas de Bruxelas e de Washington.
  • Perspetivas sobre as mudanças no Mediterrâneo sul. Como enfrentar as revoltas árabes e qual o papel da NATO em caso de intervenção. A relação entre os dois lados do Atlântico continua firme ou é hoje menos sólida?
Foi muito interessante ouvir a visão privilegiada do chefe da missão europeia em Washington, decantando analiticamente, com grande lucidez, a forma como a América nos "lê" e revelando o modo como a diversidade/unidade europeia é oficialmente explicada do outro lado do Atlântico.

Pela minha parte, entre algumas outras coisas que por ali disse, procurei "trabalhar" o estado atual da União, quer no tocante à sua relação com o mundo, quer na tentativa de nela desconstruir a diferente proeminência dos 27 no processo comum de ação externa.

Mas de muito mais se falou naquelas mais de três horas, desde a Líbia à Rússia, das agências de "rating" à reforma do Conselho de Segurança, da posição do Brasil à atitude alemã. O euro, o dólar e a crise, bem como os números do mundo, foram estudados e debatidos. E falou-se da França, evidentemente. Porque a notícia era "fresca", as perspetivas abertas pela desaparição de Bin Laden foram também especuladas.

Tive um grande gosto em colaborar, uma vez mais, com o Observatório de Imprensa. Recordei que, a primeira vez que o fiz havia sido já em 1994, num debate sobre a Europa, lado a lado com Paulo Portas. Como o tempo passa...

sexta-feira, abril 29, 2011

David Lopes Ramos (1948-2011)

Morreu David Lopes Ramos. 

Fui instrutor militar do David em 1973, na Escola Prática de Administração Militar, em Lisboa. Dei-lhe então aulas de "Acção Psicológica" (isso mesmo!). Vimo-nos fugazmente nos corredores da Revolução. Cruzámos histórias divertidas desses tempos nas poucas vezes que nos voltámos a encontrar - lembro, em particular, uma longa conversa numa esplanada no Funchal, ainda nos anos 70, onde descobrimos que ele era dois dias mais velho que eu, e uma noitada em Lamego, no final dos anos 90, num debate jornalístico-político, sob um pretexto vinófilo. Nunca cheguei a responder a um convite que me formulou para escrever um certo texto para o "Público", durante o tempo em que eu estava no Brasil. 

David Lopes Ramos era, para mim - e para muita gente com uma opinião bem mais qualificada que a minha -, sem a menor sombra de dúvida, o maior crítico gastronómico português.

quinta-feira, abril 14, 2011

"Prove Portugal"

Há dias, pelo telefone, tive uma conversa com a TSF sobre a gastronomia e os vinhos portugueses, a pretexto do prémio "Prove Portugal", que o Turismo de Portugal teve a gentileza de me atribuir.

Essa conversa deu origem a um programa, da responsabilidade de Rita Costa e Herlander Rui, cujos 10 minutos podem ser ouvidos aqui.

Embaixador diminuído?

A pergunta surpreendeu-me: "sente-se um embaixador diminuído?". Tinha a ver com o papel dos diplomatas portugueses pelo mundo, em face da situação de crise que atravessamos. Foi-me colocada pelo jornalista Henrique Garcia, durante uma breve entrevista que dei no noticiário da TVI24, na noite de dia 12.

A minha resposta foi clara: como diplomata português, esperando poder refletir a atitude profissional de muitos dos meus colegas, sinto-me perfeitamente capaz para representar os interesses do país no quadro da presente crise. Naturalmente que tenho consciência de que a imagem que Portugal projeta, nos dias que correm, não é a que seria desejável, mas os profissionais da diplomacia não existem para assumir externamente os interesses do país apenas em momentos de glória. Pelo contrário, é nestes tempos, bem mais difíceis e exigentes, que nos é pedida frieza de espírito e capacidade de explicação sobre os esforços que estamos dispostos a fazer, enquanto país, com vista a reverter a situação que atravessamos. Recordei, aliás, que, nos meus tempos como diplomata, esta é a terceira vez que tenho o FMI "em casa" e, nem por isso, das outras duas, o país "fechou".

Alguns esquecem, mas eu achei por bem lembrá-lo, que há não muitas décadas, alguns daqueles que são hoje ricos países europeus, atravessaram situações de penúria que obrigaram a fortes ajudas internacionais, em virtude de crises muito graves, que envolveram fome, pobreza e grandes carências. Os tempos mudaram, e, se bem que o que nos deve importar seja o presente, acho decisivo que o saibamos sempre relativizar. É que o Portugal de abril de 2011, por muito que a sua imagem possa estar a sofrer, é exatamente o mesmo país que o mundo, há escassos meses, escolheu para membro do Conselho de Segurança da ONU, com uma votação quase histórica. A nossa imagem, de lá para cá, é, basicamente, a mesma. Portugal é um velho país que o mundo se habituou a respeitar, independentemente dos cifrões dos défices. Por isso, façamos o nosso trabalho e não nos deixemos deprimir por alguns artigos de imprensa porque, como dizia François Mitterrand, não há nada mais velho que o jornal de ontem. 

quinta-feira, março 31, 2011

Jornalismo

Há dias, já no auge da crise na Líbia, o jornalista da RTP, Paulo Dentinho, fez uma magnífica entrevista a Mouammar Kadhafi, um "furo" jornalístico da maior qualidade. Equilibrada e inquisitiva q.b., a conversa foi crescendo de ritmo e foi marcada pela inteligência e pertinências das perguntas, que permitiu extrair respostas curiosíssimas. 

Vi a entrevista de Paulo Dentinho ser citada, abundantemente, em toda a comunicação social internacional, com extratos a correrem o mundo das grandes televisões. Curiosamente, ou talvez não, esta excelente peça de jornalismo passou quase despercebida em Portugal, pelo menos a avaliar pelo que me chegou.

Será que se tivesse sido produzida por canais privados, com outros meios coadjuvantes de ressonância mediática, o destino português da peça teria sido outro? Deixo a pergunta.

Encore Pivot