A circunstância, naturalmente infeliz, da morte de Mário Soares coincidir com a viagem oficial do primeiro-ministro português à Índia não tem permitido destacar a importância objetiva desta última.
A Índia é a maior democracia do mundo. Um em cada quatro votos em eleições livres à escala global é expresso por um eleitor indiano. O seu setor económico privado é de uma grande pujança e a Índia, entre as chamadas grandes economias emergentes, é a que mostra hoje maior vitalidade. As tensões políticas que, por vezes, abalam setores da sociedade indiana não nos devem fazer esquecer que ocorrem sempre no seio de instituições de grande solidez, marcadas por um forte sentido estratégico nacional.
Apesar de todos os esforços feitos no passado, nunca foi possível garantir uma relação económica profunda entre Portugal e a Índia. Passado o trauma da "perda" do Estado da Índia (a segunda peça do império colonial a cair, depois do Brasil), Mário Soares promoveu o estabelecimento de relações diplomáticas com Nova Delhi. Não obstante os esforços que têm sido feitos ao longo destas décadas - e António Costa viaja acompanhado pelo seu ministro da Cultura, Luis Castro Mendes, que foi um excelente embaixador na Índia - os resultados até agora obtidos ficam aquém do esperado.
António Costa é um cidadão português que assume com orgulho a sua origem indiana. A presença do PM português no congresso da diáspora indiana foi um gesto de inteligência política, num momento em que Nova Delhi começa a ponderar as consequências que o Brexit acarretará para um imenso país que tem uma inserção europeia que se faz muito através do Reino Unido, com que comunga a Commonwealth. E a Índia nunca esquece que foi Portugal, durante a sua presidência europeia em 2000, que promoveu o seu estatuto de "parceiro estratégico" com as instituições europeias - como me referiu, com ênfase, há semanas, a nova e dinâmica embaixadora que aquele país destinou para Portugal.
Por todas as razões, este é, politicamente, o momento certo para Portugal fazer este novo "forcing" com a Índia e, volto a dizê-lo, a origem indiana de António Costa pode não ser aqui um fator despiciendo, se bem se atentar na importância que as autoridades indianas têm vindo a dar a esse facto.
Por isso, neste preciso tempo, creio ser ocasião de evocar a grande figura da cultura que se chamou Orlando da Costa, pai do atual primeiro ministro e do jornalista Ricardo Costa, um português de origem indiana que é um magnífico exemplo da nossa diversidade.
Conheci Orlando da Costa no final dos anos 60 e inícios de 70. Cruzámo-nos por diversas vezes em casa de Carlos Eurico da Costa e de Maria Lúcia Lepecki, em grupos onde estavam José Cardoso Pires, Maria Velho da Costa, Jacinto Batista, Alberto Ferreira, entre muitos outros. Tenho dele a imagem de uma figura interessantíssima, de um homem suave, sorridente, com imenso humor, de uma cultura transbordante.
Acho que António Costa se deve ter lembrado muito do seu pai nestes seus dias da Índia. E ele merece isso.
9 comentários:
Por cá, basta que um centro de saúde feche que se começa logo a gritar "fachismo!". Basta que um tribunal reduza as horas que se diz logo que não há democracia neste país. A Índia, com toda a sua miséria e o nojento sistema de castas, é "a maior democracia do mundo".
Esquerdices...
Muito bem faz o Francisco em lembrar aqui que a Índia é o maior país democrático do mundo. Há muita gente que se esquece desse facto e que não repara que a Índia, um país democrático, plurilinguístico e federal, pode constituir um bom modelo para a União Europeia do futuro. É que os EUA, que muita gente toma como modelo, não o podem ser, pois que os EUA gozam de uma uniformidade antropológica e linguística que nada tem a ver com a Europa. A Índia, pelo contrário, com a sua diversidade linguística, religiosa, de níveis de desenvolvimento (os salários em Goa são o dobro de na Bengala Ocidental), e antropológica, e apesar disso sustentado uma democracia federal, pode constituir um bom modelo para a Europa.
E o sistema de castas também é uma componente da "democracia indiana", ou antes um abjecto apartheid social da idade média?
O sistema de castas é o equivalente indiano do racismo norte-americano. É, como ele, condenável. Tal como há montes de outras coisas abomináveis na sociedade indiana, a começar pelo tratamento das mulheres, que é ainda pior do que nos países muçulmanos, mas do qual infelizmente se fala pouco por cá.
Quem ouve por aqui o pessoal a falar, até parece que a India é um modelo de virtudes. Senão vejamos, sistema de castas, não é que por aqui também as não aja, há muitas formas de castas. Vacas a pavonearem-se pelas ruas, milhões de miseráveis e pobres, violações em larga escala com um certo beneplácito cultural próprio deles,tem tudo a ver com a racionalidade própria da maioria dos europeus, ora ora.
Como Orlando Costa fazia parte das elites (?) comunistas PC e surfistas políticos derivados , é uma democracia, mas com castas, está no seu direito....
Vacas voadoras será um exportação óptima de Portugal para a India !
Sr. Embaixador,
É velho este ditado: "Vozes de burro não chegam ao céu", podemos adaptá-lo: Vozes de anónimos não chegam a lado algum!.
Qual casta, qual PC, qual conversa. O Orlando da Costa era um intelectual, escritor e grande publicitário (como modo de vida de recurso), a Pide não o deixou ser professor. Era, como o Sr. Embaixador diz, culto, elegante, educado, de uma seriedade intocável. A Agência foi à falência em 1976, só saiu para outra Agência, em 1977, quando o último funcionário arranjou colocação. Amigo e Pessoa doce. Sou católico, logo, não sendo seu camarada, acompanhei-o muitas vezes à festa do Avante e com muito prazer. Aprendi, muito com ele, nos muitos anos de convivência, que me honrou.
Creio, ter a certeza, que o seu filho, circunstancialmente, 1º Ministro, herdou todas as características pessoais do pai. Ouvi para aí um grunho da direita, reclamar de devia regressar de imediato, para o funeral do Dr. Soares. Vejam lá, da sinceridade irónica e cínica do bicho, por sinal, bem fortezinho!. A sua permanência na India, em visita de Estado, faz todo o sentido, por tudo o aqui foi referido, pelo autor do Blog. O Dr. Soares, teria feito o mesmo: e até fez, quando o filho estava em como, após o desastre da Jamba, manteve a sua visita de Estado na Hungria, creio. Colocando o interesse do País, acima dos pessoais.
Afonso de Albuquerque foi o primeiro a apadrinhar casamentos de indianos com europeus, que era a solução para Dom Manuel e herdeiros poderem dominar um dia aquelas paragens.
Também outros em África apoiavam o fenómeno da mestiçagem por aqueles trópicos.
Mas só resultou o povoamento em Lisboa, Algarve, Cova da Moura, Moita..., e por lá tudo se esfumou.
Afinal só cá, na Metrópole é que as pessoas de lá se sentem bem.
Seja a jogar futebol seja a governar.
Será a nossa sobrevivência, parece que a natalidade tem crescido em Portugal!
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