Encontrei-o um dia, por acaso, no aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro. Ele era um oficial superior da polícia brasileira. O avião para Brasília estava atrasado. Ficámos à conversa.
Desde que eu chegara ao Brasil, havíamos criado uma boa relação pessoal, graças à intermediação de colaboradores meus. A cooperação entre Portugal e o Brasil na área policial era exemplar.
A nossa conversa foi divagando até que, a certo ponto, ele me perguntou:
- Conhece "fulano"?
O nome não me dizia rigorosamente nada.
- Não, porquê?
O meu amigo da polícia brasileira hesitou um pouco, talvez evitando ir mais longe no assunto. Mas eu estava já curioso.
- É um empresário brasileiro (e referiu o ramo de negócio). Tem a certeza de que nunca o encontrou?
Nunca podemos essas certezas. Um diplomata, em especial se é embaixador, cruza-se com muitas centenas de pessoas, fixa o nome de algumas, guarda a cara de outras tantas e esquece as restantes. Como poderia eu ter a certeza de não ter encontrado essa pessoa? Mas, para ele me falar nela, era, seguramente, alguém com problemas com a polícia. Insisti em saber um pouco mais.
- Esse homem está a ser alvo de um processo complicado. Falei-lhe nele apenas por uma razão, que motiva a nossa curiosidade: há no processo uma fotografia dele consigo...
Caí das nuvens, embora ainda faltasse algum tempo para o voo. O tal fulano tinha uma fotografia comigo? Quem diabo seria? Onde fora tirada a fotografia, tanto mais que eu nem me lembrava sequer do nome do homem?
Comecei a preocupar-me! Só me faltava, a mim, embaixador de Portugal no Brasil, ter o meu nome envolvido com o caso de um potencial delinquente! Agora é que eu queria mais pormenores.
E eles vieram. A fotografia tinha sido tirada num encontro em casa de uma empresária brasileira, aquando da visita de uns industriais portugueses ao Brasil.
Fez-se-me luz. Meses antes, uma amiga, empresária de sucesso em Brasília, convidara-me para um jantar em sua casa, onde reunia uns portugueses que pretendiam investir no Brasil com empresários brasileiros do ramo. Eramos quase vinte pessoas, se bem me lembrava. Desde essa noite, nunca mais tivera notícias do negócio.
Porém, de repente, num "flashback", recordei-me que um dos convivas pedira para tirar uma fotografia comigo. Não fazia ideia de quem era. Tratava-se de algo muito frequente no Brasil, porque havia gente que achava graça a ficar com uma recordação de um encontro com o embaixador de Portugal. Ele sabia isso, não sabia?
Sabia. E também presumia que a fotografia não tinha qualquer significado, embora figurasse no processo. Aproveitou então, como profissional da polícia, para me dar um conselho:
- Sempre que alguém que não conheça quiser tirar uma fotografia consigo, peça a pessoas que estejam próximas para se juntarem à "cena". Dessa forma, a naturalidade da situação fica automaticamente assegurada e não corre o risco de ser "apanhado" numa aparente cumplicidade pessoal com alguém que não sabe nem quem é nem o que pode vir a fazer no futuro...
Nunca mais me esqueci disto!