O carro ia lentamente, as mulheres árabes atrasavam o passo, na travessia das ruas, sem nos fixar, como se quisessem testar a nossa ousadia, ao entrar por aquele bairro esmagadoramente muçulmano, em Roubaix, no norte de França, no caminho para a Associação Católica dos Portugueses, nessa manhã de há pouco mais de cinco anos.
Naquela que é uma das zonas francesas mais deprimidas, o desemprego é brutal, com uma elevadíssima taxa de desocupação dos jovens - os "gardiens des murs", como, com trágica ironia, se dizia na Argélia, antes dos "évènements" - e uma economia sem perspetivas. Dali sai gente para o Estado islâmico, por ali a insegurança fez subir em flecha os votos do Front National, nos anos seguintes.
Foi então que o vi sair subitamente da parede onde estava encostado, atravessando do passeio para a rua. Era jovem, vinte e poucos anos, argelino de traços, francês de nascença, por certo. Parou à frente do meu carro, que ia devagar, e estacou. Interpelou-me em silêncio. Atravessou-me com um olhar que não me pareceu de ódio, mais de desprezo ou talvez sobranceria. Ou de um imenso cansaço, de nada ter para fazer. Fixei-o de frente, sem mostrar receio, mas também sem o desafiar, procurando, essencialmente, não lhe dar a sensação de que, também eu, me interrogava sobre se devia andar por ali. Quando ele se assegurou de que, por sua exclusiva causa, eu suspendia por completo a marcha, retomou a travessia, indiferente, talvez em direção a uma nova parede onde se encostar.
Tenho andado por muitos anos por alguns mundos, testei bem o que é a diferença, habituei-me profissionalmente a viver e a conviver com ela. Mas, confesso, raramente deparei com um olhar que me fizesse sentir mais estrangeiro, no seio da minha Europa, do que o daquele jovem árabe, muçulmano, naquele periferia triste de Roubaix.
Lembrei-me dele hoje, ao ouvir as notícias de Bruxelas. Que não fica longe.
Naquela que é uma das zonas francesas mais deprimidas, o desemprego é brutal, com uma elevadíssima taxa de desocupação dos jovens - os "gardiens des murs", como, com trágica ironia, se dizia na Argélia, antes dos "évènements" - e uma economia sem perspetivas. Dali sai gente para o Estado islâmico, por ali a insegurança fez subir em flecha os votos do Front National, nos anos seguintes.
Foi então que o vi sair subitamente da parede onde estava encostado, atravessando do passeio para a rua. Era jovem, vinte e poucos anos, argelino de traços, francês de nascença, por certo. Parou à frente do meu carro, que ia devagar, e estacou. Interpelou-me em silêncio. Atravessou-me com um olhar que não me pareceu de ódio, mais de desprezo ou talvez sobranceria. Ou de um imenso cansaço, de nada ter para fazer. Fixei-o de frente, sem mostrar receio, mas também sem o desafiar, procurando, essencialmente, não lhe dar a sensação de que, também eu, me interrogava sobre se devia andar por ali. Quando ele se assegurou de que, por sua exclusiva causa, eu suspendia por completo a marcha, retomou a travessia, indiferente, talvez em direção a uma nova parede onde se encostar.
Tenho andado por muitos anos por alguns mundos, testei bem o que é a diferença, habituei-me profissionalmente a viver e a conviver com ela. Mas, confesso, raramente deparei com um olhar que me fizesse sentir mais estrangeiro, no seio da minha Europa, do que o daquele jovem árabe, muçulmano, naquele periferia triste de Roubaix.
Lembrei-me dele hoje, ao ouvir as notícias de Bruxelas. Que não fica longe.
15 comentários:
A desculpa dessa gente é que não é integrado e que não lhes dão oportunidades...
Senhor Embaixador: já reparou que os cidadãos dos paises de Leste se integram nas nossas sociedades muito facilmente e esses muçulmanos não se conseguem integrar atribuindo a culpa às sociedades que os acolhem?
Será deles? parece-me que sim pois há raças que não se conseguem integrar no Ocidente.
E depois a culpa é nossa!
Não será mais fácil "convidar" ao retorno à sua origem do que tentar integrar quem não se consegue integrar?
Uma opinião interessante:
"de Wolfgang Münchau:
«A UE está a vender a alma no acordo com a Turquia.
O acordo com a Turquia é o mais sórdido que eu já vi na política europeia moderna. No dia em que os líderes da UE assinaram o acordo, Recep Tayyip Erdogan, o presidente turco, revelou tudo: "A democracia, a liberdade e o Estado de direito... Para nós, essas palavras já não têm absolutamente nenhum valor." Naquele momento, o Conselho Europeu deveria ter terminado a conversa com Ahmet Davutoglu, o primeiro-ministro turco, e tê-lo mandado para casa. Mas, em vez disso, fez um acordo com ele - dinheiro e muito mais em troca de ajuda com a crise de refugiados.» "
A Europa está moribunda? esperemos que ainda haja coragem.
A degradação europeia é má para o mundo inteiro.
O princípio da degradação europeia começou com o desembarque da Normandia na II Grande Guerra, o dia D.
Daí para cá, por não parar ali a guerra e fazer-se a paz, sem vencidos nem vencedores, foi o princípio do fim da velha Europa.
6 de junho de 1944, os europeus não se entenderam começou a derrocada, até hoje.
O que o Senhor Embaixador viu em Roubaix, vi-o eu há alguns meses em Tourcoing, Roubaix, e Lille, numa viagem para Bruges. O que viu no olhar desse jovem, é o que se vê há já anos em muitos jovens muçulmanos e negros. O desespero de não ter um objectivo na vida. Porque não têm trabalho. Eu vejo-os aqui em Grenoble. São os mesmos.
Há lustros que os Pais chegaram cá. Uns, alguns milhares, morreram pela França, nos campos de batalha, de Cassino à Normandia. Eram aqueles que quando caiam prisioneiros nas mãos dos alemães, estes, não os guardavam: eram fuzilados imediatamente. Porque eram sub-humanos.
Os Pais vieram porque a França tinha necessidade de mão-de-obra. A França destruída, era preciso reconstrui-la. Nessa época, a famosa época gloriosa, havia trabalho para eles, para os Polacos, para os Italianos, para os Portugueses, para os Russos, etc. O mundo inteiro desaguava em França.
Durante alguns anos tivemos o crescimento e o desenvolvimento. As comunidades viviam em paz.
Anos mais tarde, as coisas mudaram. O capitalismo glorioso, sonhou dum grande mercado. Sonharam duma Europa capaz de desafiar os EUA. A Alemanha de pé, a França de pé, livre do problema colonial em 1968, lançaram-se, como dois grandes motores a quem faltava uma boa “carroceria”, na CECA primeiro, depois no Mercado Comum, e, enfim, na EU.
Mas o capitalismo, que inventou no momento oportuno a alavanca que ia laçar o Grande Mercado, isto é o CREDITO para todos: compre hoje e pague amanhã...ou nunca! compreendeu rapidamente, que para alargar o mercado era preciso poder contar com produtos a baixo preço. E vai lançar a mundialização a toda a velocidade! Os s países do terço mundo, particularmente os asiáticos, a China à cabeça, vão esvaziar as indústrias europeias, da sua mão-de-obra e dos seus produtos.
Tourcoing e Roubaix são um exemplo, mas podíamos citar o Vale do Ave, em Guimarães e muitas outras regiões da Europa, onde os produtos nos quais a mão de obra era importante, cederam perante a pressão asiática. E não foram só o têxtil e o calçado! E não falo das minas, que fecharam umas apos outras, em França como não RU.
Milhões de empregos arderam! Os Americanos tiveram o mesmo problema, mas, eu vi em Detroit, nos últimos anos da era automóvel gloriosa dos “Big Three”, os em pregos voarem para a China. E vimos os sargentos do exército americano instalarem-se nos hotéis agora decadentes da cidade, fazer em assinar contractos aos jovens latinos e negros, para irem para o Iraque, em troca dum passaporte para os latinos! Carne para canhão.
A Europa não tinha a mesma arma para empregar os ..desempregados. Embora agora, em França, as listas de “engagement” no exército passem mesmo na televisão e nas exposições procurando atrair os jovens para as armas. A França, claro está em guerra!
Como aquele olhar do jovem que o impressionou em Roubaix, existem hoje dezenas de milhares em toda a Europa. Não os podemos incorporar nos nossos exércitos! Por falta de confiança, quando há empregos livres, a preferência racial impera.
Existe agora um “empresário” que oferece empregos, bem pagos, a todos os jovens que desejam vingar-se do isolamento ao qual estão condenados, e um fim eventual glorioso, segundo as leis duma religião suicida. No Iraque ganhavam um passaporte, na Síria a glória e na Europa o paraíso.
Fabricamos todos os dias milhões destes soldados. Fabricamos um grande exército desde há anos. E as guerras que lhes fazemos desde 2003 no Médio Oriente e recentemente na Líbia e na Síria, só podem aumentar a produtividade.
(Suite)
A política económica da Europa não deixou muitas esperanças a estes jovens de todas as origens que vegetam nas nossas cidades. Então não vimos os nossos próprios dirigentes apregoar a austeridade como solução para a miséria na Europa. Que dissemos aos Gregos, aos Espanhóis e aos Portugueses?
E que disse David Cameron aos Ingleses esta semana? A diferença é que ontem Osborn, Ministro do Trabalho de Cameron mandou-o às favas e demitiu-se, recusando, cito:“ aplicar medidas que são penosas para as classes desfavorecidas, - enquanto, cito: os mais ricos são beneficiados.
Não quero dizer que os Ingleses vão virar djiahdistas, mas as causas são as mesmas.
Um dos problemas que a Europa enfrenta é que a lealdade de um número significativo de muçulmanos não é para com os países onde residem, trabalham e possuem a nacionalidade, mas é sim para com uma visão do Islão que abomina quase tudo o que a Europa possui, desde a liberdade à tolerância. Esses muçulmanos pretendem destruir a nossa maneira de viver, desde acabar com escolas mistas a menosprezar as mulheres e a ciência.
Não sei verdadeiramente qual será a melhor solução, mas tem de passar entreoutrox por campanhas de integração e aprendizagem. correcta dos valores fundamentais do Ocidente. Não podemos permitir o comunitarismo e novos guetos na Europa.
Não venham também dizer que a culpa é dos nossos valores, pois eles recusam-nos sistematicamente.
Foram-lhws dadas várias oportunidades de integração que a maioria recusou, ao contrário por exemplo dos asiáticos, originários da Europa de Leste, africanos e sul-americanos que se integraram na Europa e são fundamentais para o seu desenvolvimento.
Erratum: Foi Duncan Smith, Ministro do Trabalho, que se demitiu. Osborn sendo o Ministro das Finanças.
Esperava já ter visto aqui um comentário do Freitas e do NG, ao facto do Sarkozy ir a julgamento. Afinal de contas são tão lestos a defenderem estes antigos governantes tão implutos. Ó NG olhe que o Sarkozy parecia ser muito patriota e já me esquecia foi eleito pelo povo franc~es, num ato nobre. Por mim pode ir fazer companhia um dia ao Sócrates, ao Lula e a todos os que se vier a apurar como tal. Ao contrário de muita gente felizmente não tenho bandidos de estimação, mas como eu desconfiava tem gente que os tem.
A verborreia (rima com diarreia) dos que arranjam sempre desculpas para o terrorismo, esbarra num pormenor muito simples: os canalhas não se fazem rebentar contra instalações militares, nem partidos políticos, nem edifícios administrativos. Os canalhas eternamente desculpabilizados (porque a insistência em "explicar" o inaceitável é uma forma de desculpabilizar - logo, de apoiar!!!), insistem em assassinar pessoas comuns e inocentes que em nada contribuiram para quaisquer que sejam os problemas que os terroristas imaginem ter.
Uma bela homenagem às vítimas, esta pequena crónica, Sr. Embaixador. Há algo que os proponentes de soluções musculadas contra o terrorismo jamais serão capazes de compreender. Claro que a ideologia que suporta estes atos e os próprios atos são inomináveis, mas eles foram cometidos por seres humanos e se queremos que não se voltem a repetir, deveríamos perceber o que leva à radicalização destas pessoas. Deveríamos ainda lembrar-nos, como ontem bem lembrou Paulo Dentinho, que fazemos negócios com um regime atroz cuja ideologia é exatamente a destes jovens e que não parecemos muito preocupados com isso. Quem pensa que é possível construir um muro à volta da Europa e expulsar para fora dele 50 milhões de pessoas, a esmagadora maioria delas absolutamente inocentes, não sabe do que fala, ou se sabe padece de um tipo diferente de radicalismo, mas que é igualmente condenável...
Que romantismo tão barato o desta crónica... esperava que, mesmo nos clássicos chavões repetidos até à exaustão, conseguisse ser mais criativo.
O Anónimo das 17.57 pode informar-me onde posso ter o privilégio de ler os seus inspirados textos, que passam, seguramente, a banalidade dos meus - mas que, pelos vistos!, sempre vai lendo. Será masoquismo?
O comentador "23 de março de 2016 às 18:37" não podia ser mais popularucho na resposta dada a uma crítica...
O anonimo de 23 de março de 2016 às 08:14, faz parte daqueles que não vêm o mundo que os envolve. Não sei onde vive, mas o que é certo é que, quando escreve, cito “os canalhas não se fazem rebentar contra instalações militares, nem partidos políticos, nem edifícios administrativos.”, demonstra que ainda não compreendeu que o terrorismo sabe que o acesso às individualidades culpadas da situação criada nos países donde o terrorismo é importado, e as instalações e edifícios que cita, não são fáceis de atingir. E nem é mesmo o seu objectivo: o impacto dum ataque na população num país do Ocidente é muito mais remunerador para a causa que defendem, que de assassinar uma individualidade ou político de renome.
Quando os americanos lançaram durante horas misseis dos barcos de guerra, à distância, contra Bagdad, sabiam bem que seriam os cidadãos as maiores vitimas. Sabiam que Saddam Hussein podia escapar. Mas o impacto na população era enorme.
Por outro lado, quando escreve que analisar a situação criada pelo terrorismo consiste a “defendê-lo e compreendê-lo”, prova bem que o problema no Ocidente é tornado mais grave pela mentalidade de cidadãos como a do anónimo, que não compreende que o problema que o Ocidente criou, ao destruir as estruturas de Estados soberanos, com o corolário destes milhares de vítimas das guerras que se deslocam para Ocidente numa fuga perdida à morte, não tem outra solução que de atacar o problema na base, isto é, que o combate ao terrorismo passa por uma politica coerente do Ocidente, que em vez de alimentar o terrorismo em armas e dinheiro deve escolher os seus aliados.
Quanto à sua verborreia:” quaisquer que sejam os problemas que os terroristas imaginem ter”, é lamentável que o anonimo não compreenda que os terroristas exploram os problemas imensos das populações, problemas que os média ilustram todos os dias, mas que aparentemente o anonimo não vê. Esta cegueira alimenta a ideia precisamente dos terroristas que a miséria que lhes causamos nos é perfeitamente indiferente.
Porque quando nos lamentamos por 139 ou 34 mortos na Europa, e que só ontem, o bombardeamento pelas forças ocidentais, da Universidade de Mossul fez 240 mortos, todos jovens, é-lhe indiferente!
Comentários como os do anonimo fornecem uma justificação fácil ao terrorismo islamita.
A equidade de oportunidades tem razões que a razão conhece, mas não explica e nem quer mudar...
Bom filme o filme "Se os olhares Matassem", do ponto de vista da pedagogia das relações humanas explica tão bem, tem que se gostar de psicologia, para ser franca mais da Enfermagem de Nightingale
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