quarta-feira, junho 19, 2013

Gente

Os franceses e o "Le Monde" atiçaram-se contra o dr. Durão Barroso, por virtude de declarações por este proferidas, nas quais teriam sido qualificadas de "reacionárias" as objeções colocadas por Paris quanto à inclusão do audiovisual no mandato negocial para a ambiciosa agenda de liberalização de trocas entre a UE e os EUA.

(Seria, aliás, interessante conhecer a posição que Portugal assumiu na fixação deste mandato e os fundamentos em que a mesma terá assentado). 

O "Le Monde", no texto que lhe dedica, é muito cáustico quanto ao presidente da Comissão, qualificando-o de "camaleão", numa alusão, cuja justeza não cabe aqui aquilatar, sobre a sua adaptabilidade ao sabor dos diversos "ventos". Numa perspetiva de amizade e benévola admiração - estas coisas têm sempre leituras não unívocas - o meu amigo António Monteiro qualificava-o, há dias, numa conferência no MNE, como "um homem para todas as estações". Um diplomata menos contemporizador sugeriu que se acrescentasse ao título da conferência: "...e apeadeiros". Enfim, como diria Pirandello, a cada um a sua verdade.

Para vários comentadores nacionais e internacionais, esta atitude do ainda presidente da Comissão europeia poderá vir a comprometer as suas naturais ambições futuras: renovar o mandato na Comissão, substituir Von Rompuy na presidência do Conselho Europeu, aceder à secretaria-geral da NATO ou, limite dos limites, suceder a Ban Ki Moon como SG da ONU.

Neste "totoloto" de lugares de prestígio, movidos por patriotismo ou por outras razões mais comezinhas que não vêm à colação, só podemos desejar, com funda sinceridade, que a França não venha a surgir como um obstáculo insuperável ao prosseguimento da carreira à escala global de um político que os cidadãos deste país - uns com incontido orgulho, outros com maior ou menor desapontamento, outros ainda com um quiçá incompreensível alívio - viram sair de S. Bento para a rue de La Loi, no ano da graça de 2004.

Interpretando esse conjunto de motivações, todos não seremos nunca demais para procurar ajudar a que o dr. Barroso venha a ter acesso a um qualquer destino internacional alternativo àquele em que, na última década, tanto se tem ilustrado. Ao desejar e contribuir para isso, privar-nos-emos, com desprendida generosidade, de testemunhar uma sua eventual presença futura em alguns lugares institucionais da pátria. Mas esse é um sacrifício que, por todas as razões, só tem condições para nos motivar.

30 comentários:

Anónimo disse...

PUM!!!

Anónimo disse...

Grande texto, Embaixador. E na mouche!

Anónimo disse...

Em cheio.

Anónimo disse...

"No ano da graça de 2003"...
Grande "tirada" do Senhor Embaixador, no ano da graça de 2013!

JPA disse...

De luva branca.

Cumprimentos
JPA

Anónimo disse...

Do texto "António Monteiro qualificava-o, há dias, numa conferência no MNE, como "um homem para todas as estações". Um diplomata menos contemporizador sugeriu que se acrescentasse ao título da conferência: "...e apeadeiros".

Bem explicado!

Entrou no "apeadeiro" PM de Portugal" e saiu na "estação" UE.

Agora vai sair num apeadeiro tipo,

"Laranjal de Baixo" donde nunca devia ter saído.

Esse apeadeiro chamava-se antigamente "Marchismo Lenitivo".

Alexandre

Joaquim de Freitas disse...

Como o maoïsmo não tem futuro na China, talvez os amigos da cimeira dos Açores lhe encontrem um "job" no Texas, como cowboy no rancho do amigo n¨1.

Anónimo disse...

Sempre seria preferível, apesar de tudo, tê-lo a ele por cá, do que outros “furões”… E não digo, venha o diabo e escolha, porque este, já escolheu!

Anónimo disse...

O Sr. Durão Barroso manifestou divergencias com a França a propósito da Cultura. Não vou aqui tomar posição sobre qual dos dois, se o Hollande ou o Barroso, tem mais cultura americana ou europeia... nem se a posição de Barroso é já para puxar a brasa à sua sardinha para qualquer outro tacho nas Nações Unidas como já algumas " más linguas" lhe atiram à cara!
O que eu digo é que depois de amanhã, sexta-feira, dia 21 de Junho, é a festa da música aqui em França e proponho que Hollande convide o Sr. Barroso a vir à festa para tocar bateria no fundo d'um tacho...
O Presidente francês reacionário por querer defender a especificidade cultural! Francamente! Claro que os franceses não gostaram e a imprensa reagiu. Como reagiria a imprensa portuguesa se o Presidente português tivesse o mesmo trato?
José Barros

Anónimo disse...

Um Post de refinadíssimo humor. Uma bicada e pêras!
Uma outra opção para o Dr. Barroso era ir acabar os seus dias ali para os lados do Mindelo, onde por perto costumava passar férias, nas aguas gélidas do norte do País.
Não o estou a ver a concorrer a um lugar menor – para a sua ambição – que seria ser Presidente desta Freguesia, que é o Portugal “ocupado” pela Troika. Podendo até vir a sair derrotado.
Um cenário que me daria um certo prazer era ver o putativo Barroso, depois de “chumbadas” as tais hipóteses internacionais, vir até aqui, à Freguesia (que ele tão mal tem tratado do alto do lugar que ainda ocupa) e candidatar-se à Presidência...tendo como seu principal adversário, nem mais nem menos do que o autor deste mesmo Blogue, FSC.
Os debates televisivos entre ambos seriam de antologia! Pagava para ver!
E se o Dr. Barroso acabasse por perder essa hipotética refrega eleitoral, lá o iriamos ver, então sim, a caminho de Vila Praia de Âncora e ali afogar o seu desespero e funda mágoa.
Bom, nunca se sabe, não é verdade?
“O Imaginativo”

patricio branco disse...

candidato a pr? talvez se lance...
sg da otan estava bem, mas a oportunidade está a passar, há 3 ou 4 anos era lugar seguro.
sg da onu penso que nem pensar o que é uma impossibilidade quase.
e o lugar de von rompuy deve estar já comprometido.
que outros lugares haverá, adaptados a ele e do gosto dele?

jlcr disse...

O que será que FSC está a congeminar. Acompanhar o cherne num qualquer lugar internacional? Este é um post vergonhoso sobre alguém que sempre se revelou um oportunista sem caracter e bem caracterizado pelo Le Monde.

Anónimo disse...

Excelente!

António Nunes

Carlos Fonseca disse...

Este é um texto com pano para mangas.

Mas, aqui e agora, quero sublinhar a sua generosidade para com o antigo fornecedor de móveis da sede do MRRP, quando escreveu:

(...) só podemos desejar, com funda sinceridade, que a França não venha a surgir como um obstáculo insuperável ao prosseguimento da carreira à escala global de um político (...)

Há sinceridade nisso, Sr Dr. Freitas, perdão, Seixas da Costa?

Helena Sacadura Cabral disse...

Os comentadores anteriores já disseram tudo o que se podia dizer, e bem, sobre o post, o humor e Durão Barroso.
Eu, devota, vou fazer uma novena para que o Senhor o leve para qualquer posto bem longe de Portugal. De preferência para perto do Dr Constâncio. Teríamos assim um belo par de jarras de exportação!

EGR disse...

Em pleno Senhor Embaixador! perfeitamente ajustado a personalidade do visado.

Anónimo disse...

Exma. Senhora Helena Sacadura Cabral: reze minha Senhora, reze, mas, se rezar demais, O Senhor ouve-a, com certeza, e fica o País sem “gente”…
Não me importo “por aí além”…caso contrário terá de ser à imagem da saudação médica: saudinha, mas não muita!...

Um Jeito Manso disse...

Permita-me, Embaixador, que, por uma vez, discorde de si.

É por se ter vindo a pensar assim, como o manifestou neste seu texto, que os órgãos mais importantes de muitas instituições estão cheios de gente incompetente.

Nulidades como o Comissário-Camaleão-Cherne-Durão ou o Vítor-Constâncio (só para falar agora destes dois portugueses) têm deixado que a Europa se deixe atolar num pântano de onde dificilmente sairá nos tempos próximos.

Por isso, o que eu desejo é que ele não volte a ser eleito ou nomeado para coisa nenhuma, nem cá nem em lado nenhum. Por não fazer coisa nenhuma, já fez mal demais.

Receba, Embaixador, os meus cumprimentos.

Anónimo disse...

sugestoes:

presidente da
associacao de amizade portugal-ilhas marshall


segundo secretario do
clube recreativo "os amigos do gaspar"


concorrente do programa "peso pesado"


presidente do sacavenense



Joaquim de Freitas disse...

O que é incrível, é que o mesmo que abandonou sem remorsos o cargo de primeiro ministro em Portugal para seguir os três mosqueteiros da guerra do Iraque, Bush, Aznar e Blair, o Maoista dos tempos da Revolução dos Cravos, a marionete às ordens de Angela Merkel , tenha o despudor de insultar a França hoje, tratando-a de reaccionária, porque esta recusa de alinhar no acordo que a UE quer impor em nome dos Estados Unidos, no qual toda a cultura francesa poderia ser dominada por Hollywood e Silicon Valley.
A excepção cultural francesa impõe de excluir do acordo, o Cinema, a Televisão, os conteúdos numéricos e a Internet.
O malabarista Durão Barros, às ordens dos antigos mestres americanos, esquece, porque vem dum pais que tudo perdeu, e que ele ajudou a perder, que na Europa o sector audiovisual representa 17 mil milhões de euros e 1 milhão de empregos. E esquece que os USA vendem já mais musica, filmes e televisão na Europa que a UE nos USA..
Pena é que seja um Português que se encontra à cabeça da UE, por obra e graça de Sarkozy e dos três mosqueteiros. Incapaz de propor um política europeia voltada para o investimento e o crescimento, que ajudaria o seu pais a sair da tormenta, ei-lo agora com pretensões que ultrapassam a sua competência.

Anónimo disse...

De conversa, com um alto funcionário da Comissão europeia, no dia 31 de Maio passado (funcionário pela delegação francesa na CE) fiquei com a ideia de que o Presidente Barroso vai para a NATO. Já estiveram pelos vistos a arranjar-lhe um lugar por lá... Assim ficam todos mais perto uns dos outros (como se diz na minha terra: c'má sim, já se conhecem)!

Unknown disse...

Parabéns Embaixador
Que prosa!...
Eça não diria melhor!

Anónimo disse...

Entenda-se que, quando o Joaquim Freitas se refere a "conteúdos numéricos", não está a falar de livros de Matemática mas sim de "conteúdos digitais".

Joaquim de Freitas disse...

" Os Gregos devem continuar os esforços , sem os quais a Grécia nao tem futuro" (Durao Barroso)

O meu nome é K. M., sou aluno do último ano num liceu em Drapetsona, Pireu.

Decidi escrever este texto porque quero exprimir a minha fúria, a minha revolta pelo atrevimento e pela hipocrisia daqueles que nos governam e daqueles jornalistas e media mainstream que os ajudam a pôr em prática os seus planos ilegais e imorais em detrimento dos alunos, dos estudantes e de todos jovens.

A minha razão para escrever é a intenção dos meus professores de fazer greve durante o período dos exames de admissão à Universidade e os políticos e jornalistas que choram lágrimas de crocodilo sobre o meu futuro, o qual “estaria em causa” devido à greve.*

De que falam vocês? Que espécie de futuro tenho eu devido a vocês? E quem é que verdadeiramente pôs em causa o meu futuro?

Deitemos uma vista de olhos sobre quem, já há muito tempo, constrói o futuro e toda a nossa vida:

- Quem construiu o futuro do meu avô? Quem vestiu o seu futuro com as roupas velhas da administração das Nações Unidas para a ajuda de emergência e reconstrução e o obrigou a emigrar para a Alemanha?

- Quem governou mal e estripou este país?

- Quem obrigou a minha mãe a trabalhar do nascer ao pôr-de-sol por 530 euros por mês? Dinheiro que, uma vez paga a comida e as contas, nem chega para um par de sapatos, para já não falar num livro usado que eu queria comprar numa feira de rua.

- Quem reduziu a metade o ordenado do meu pai?

- Quem o caluniou, quem o ameaçou, quem o obrigou a regressar ao trabalho sob a ameaça da requisição civil, quem o ameaçou de despedimento, juntamente com todos os seus colegas dos serviços de transportes públicos quando eles, que apenas queriam viver com dignidade, entraram em greve?

- Quem procurou encerrar a universidade que o meu irmão frequenta para atingir alguns dos seus sonhos?

- Quem me deu fotocópias em vez de manuais escolares?

- Quem me deixa enregelar na minha sala de aula sem aquecimento?

- Quem carrega com a culpa de os alunos das escolas desmaiarem de fome?

- Quem lançou tanta gente no desemprego?

- Quem conduziu 4.000 pessoas ao suicídio?

- Quem manda de volta para casa os nossos avós sem cuidados médicos e sem medicamentos?

Foram os meus professores que fizeram tudo isto? Ou foram VOCÊS que fizeram tudo isto?

Vocês dizem que os meus professores vão destruir os meus sonhos fazendo greve.

Quem vos disse alguma vez que o meu sonho é ser mais um desempregado entre os 67% de jovens que estão no desemprego?

Quem vos disse que o meu sonho é trabalhar sem segurança social e sem horários regulares por 350 euros por mês, como determinam as vossas mais recentes alterações às leis laborais?

Quem vos disse que o meu sonho é emigrar por razões económicas?

Quem vos disse que o meu sonho é ser moço de recados?

Joaquim de Freitas disse...

(Suite)
Gostaria de dirigir algumas palavras aos meus professores e aos professores em toda a Grécia:
Professores, vocês NÃO devem recuar um único passo no vosso compromisso para connosco. Se recuarem agora na vossa luta, então sim, estarão verdadeiramente a pôr em causa o meu futuro. Estarão a hipotecá-lo.
Qualquer recuo vosso, qualquer vitória que o governo obtenha, roubará o meu sorriso, os meus sonhos, a minha esperança numa vida melhor e em combater por uma sociedade mais humana.
Aos meus pais, aos meus colegas e à sociedade em geral tenho a dizer o seguinte:
Quereis verdadeiramente que aqueles que nos ensinam vivam na miséria?
Quereis que sejamos moldados nas salas de aulas como mercadorias de produção maciça?
Quereis que eles fechem cada vez mais escolas e construam cada vez mais prisões?
Ides deixar os nossos professores sozinhos nesta luta? É para isso que nos educais, para que recusemos a nossa solidariedade?
Quereis que os nossos professores sejam para nós um exemplo de respeito por nós próprios, de dignidade e de militância cívica? Ou preferis que nos dêem um exemplo de escravidão consentida?
Finalmente, quereis que vivamos como escravos?
De amanhã em diante, todos os alunos e pais deviam ocupar-se de apoiar os professores com uma palavra de ordem: “Avançar e derrotar a tirania fascista!”
Lutemos juntos por uma educação de qualidade, pública e livre. Lutemos juntos para derrubar aqueles que roubam o nosso riso e o riso dos vossos filhos.
PS: Menciono as minhas notas do ano lectivo 2011/12, não por vaidade mas para cortar a palavra àqueles que avançarem com o argumento ridículo de que “só quero escapar às aulas”: Comportamento do aluno: “Muito Bom”. Classificação média: 20 (“Excelente”) [a nota mais alta nos liceus gregos].

Anónimo disse...

Diz-me a 'velha senhora' que apreciou muito o post, mas que lhe apetece abandalhar a conversa, atentando, uma vez mais, contra a dignidade do blogue, após tantos e tão dignos como dignificantes comentários. Disfarçada no meio deles, talvez passe…:

gastar cera com ruim
defunto é rimar durão
gaspar passos cavaquim
com quanto for palavrão
mas mais tenho eu a fazer
que defuntos rimalhar
que se vão eles f----
porra não - vão-se é lixar

Anónimo disse...

O texto do Senhor Embaixador é bom excepto o último parágrafo que é intrinsecamente demagógico e que faz apelo aos sentimentos profundamente mais enraizados em Portugal e já postos a nu por Luis de Camões. É bom recordar que o Senhor Embaixador foi Adjunto in illo tempore do Dr. Durão Barroso.
É bom recordar as competências muito limitadas da Comissão Europeia, o facto de Barroso ter presidido a uma nova União, alargada ao leste, com uma nova Constituição e uma gravíssima crise económica que um outro estrangeiro não teria debelado melhor.
Lamentáveis são efectivamente os ataques de uma França ensimesmada e retrógrada e de um ex-Presidente da República que não foi solidário com um concidadão num momento difícil. Sempre votei Soares e nunca gostei de Alegre mas ontem entristeceu-me Soares por estar a perder o Norte.
Prefiro ter Portugueses em lugares internacionais a não ter e lamento que pessoas em posição de relevo não percebam isto.

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Anónimo das 22.45 (de 24.6.13), está a laborar num equívoco.
Por várias razões:
1. Não esqueço que trabalhei com o dr. Durão Barroso, como aconteceu com outros colegas meus de profissão. E tive muito gosto em fazê-lo.
2. Também não esqueço que, depois desse período, muita água passou sob as pontes, como sei que você não desconhecerá.
3. Nunca me ouviu dizer nem escrever que discordava da ida do dr. Barroso para a Comissão europeia. Contrariamente a muita gente respeitável, sempre considerei correto o aproveitamento dessa oportunidade por Portugal (se ler texto antigos deste blogue pode encontrar coisas escritas nesse sentido).
4. Contrariamente ao que insinua, a "inveja" não faz parte do meu léxico ético. E, francamente, não vejo onde o conceito se aplique.
5. Dito isto, ninguém me pode retirar o direito, como eleitor, de preferir não ver o dr. Barroso regressar ao palco institucional interno. E de o afirmar com uma ironia aberta que, aparentemente, não diluiu a sua sizudez.
Eu sei que os tempos não vão fáceis para quem pensa como você. Mas descontraia, homem! Há mais vida para além da (sua) "troika".

Anónimo disse...

Senhor Embaixador,
Petit mal entendu: moi aussi je ne souhaite pas le retour de Barroso à Lisbonne. Ni moi ni lui.
Il serait cependant dommage de perdre un Portugais dans une position internationale.

João de Deus disse...

O estado em que o nosso país se encontra (e ao qual o protagonista visado por este post é obviamente totalmente alheio) não saberia estar à altura do estatuto do governante em apreço. Esperemos, pois, melhores dias para merecer o seu salvador regresso (na ordem dos 20 anos, por exemplo)...

João Miguel Tavares no "Público"