No tempo que antecedeu o surgimento dos "capitães de
abril", a imprensa costumava designar homens como Américo Amorim, que
ontem morreu, como "capitães da indústria". Esses eram também os dias
em que ao qualificativo de “capitalista” não eram dadas conotações ideológicas
e em que o termo “empresário” era exclusivamente dedicado aos produtores do
Parque Mayer e ofícios correlativos.
Amorim faz parte de uma nova geração de criadores de riqueza que
o período pós-25 de abril trouxe à ribalta. Durante anos, os expoentes dessa
geração tiveram de defrontar o preconceito social de representarem o
"dinheiro novo", face ao "dinheiro velho" das famílias que,
à sombra do condicionamento industrial, tinham prosperado durante a ditadura,
ao lado ou em aliança com o capital financeiro que adubou o Estado Novo. Os
factos, contudo, vieram a não dar lustro, por aí além, aos alegados brasões
históricos.
O mundo começou por conhecer Américo Amorim a partir do seu
notável império da cortiça. Mas essa foi apenas a base a partir da qual criou
um conjunto heterogéneo de investimentos, numa multiplicidade de áreas que
tiveram o sucesso como marca comum.
Falei poucas vezes com Américo Amorim. A primeira em Londres, há
mais de um quarto de século, quando aceitou ser nosso convidado numa palestra.
Recordo o seu entusiasmo sorridente, que se somava àquele sentido de
"saber ver antes dos outros" que, com os anos, fui descobrindo ser a
qualidade comum - e distintiva da vulgaridade dos empreendedores - a certas figuras
do mundo empresarial privado. A última vez que conversámos foi há poucos anos,
quando o vi envolvido, com empenho solidário, numa louvável e discreta
iniciativa de generosidade social, a que fui convidado a dar uma modesta
colaboração.
Dizer que, na economia portuguesa, fazem falta homens como
Américo Amorim pode parecer um lugar comum. É para mim muito evidente que fazem
falta, entre nós, muitos mais criadores de riqueza e de emprego, que Portugal
necessita de um tecido empresarial com forte dimensão, para poder competir
internacionalmente. As PME têm aí um papel insubstituível, nomeadamente na
diversificação (produtiva e geográfica) da exportação, mas sem empresas grandes
e sólidas, projetadas para o exterior, a economia portuguesa não passará nunca da
cepa torta. Isto é, nunca sairemos do estatuto em que há muito permanecemos (e
que sei não ser agradável recordar): ser o país mais pobre da Europa ocidental.
Nos dias de hoje, Américo Amorim era o homem mais rico desse
país pobre - e imagino que deva ser esse o mote para alguns especuladores da
palavra, que sabem ser essa a forma mais eficaz de alimentar a medíocre cultura
de inveja dominante.