A eventual perda da classificação "triplo A", que a França detém nos "ratings" das principais agências de notação, é uma questão que tem atravessado os debates neste país, nos últimos meses. A questão tem implicações económicas sérias, porque um eventual "downgrading" da França provocaria maiores custos no seu endividamento nos mercados. Outros observadores olham também para o aspeto político do problema, interrogando-se sobre o papel futuro da França como uma das vozes com maior autoridade nas grandes decisões europeias, se acaso a sua desqualificação se processasse. Este último argumento é desvalorizado por outros, que assinalam que a degradação da notação dos EUA não fez perder a Washington um papel central no quadro decisório global.
Uma coisa é certa: para além do efeito sobre a própria França, não seria uma boa notícia para a Europa em geral se as agências de notação viessem a baixar a sua classificação, eventualmente com as de outros países europeus que ainda detêm o "triplo A". Para além dos efeitos de mercado, as consequênciais globais sobre a imagem da Europa seriam muito negativas e teriam imediatas implicações na credibilidade da zona Euro. A somar-se a tudo isso, e se acaso essa degradação viesse a acontecer nas próximas semanas, ela teria um inevitável efeito de antecipado descrédito sobre os esforços em torno da fixação do novo tratado intergovernamental europeu, cuja única verdadeira razão de ser é a tentativa de mobilizar a confiança dos mercados.
Um reputado economista francês contava-me, há dias, uma conversa tida com um responsável de uma agência de notação, que o teria deixado perplexo. Esse responsável assumiu que muitas das decisões, em termos de notação, que a sua empresa fazia eram, não apenas constatações feitas na base de dados objetivos relativos à sustentabilidade financeira de empresas ou Estados, mas traduziam já uma espécie de antecipação daquilo que se podia qualificar como o estado de espírito dos mercados. Assim, para além de uma notação vir a influenciar os mercados, ela própria já "presume" aquilo que os mercados estariam predispostos a ouvir. Interessante e preocupante.
4 comentários:
Perfeitamente de acordo com esta sua análise, caro Embaixador, especialmente em relação à sua perplexidade ao comentário feito pelo seu interlocutor economista francês em relação à “antecipação” e “presunção” das agências de notação em relação aos “mercados”. Neste domínio acrescentaria a manifesta tendência das agências americanas, que è semelhança de outros ditos “eminentes” economistas e outras figuras influentes daquele país (que contrariamente à versão oficial governamental diz defender o euro para alegado benefício próprio), se apressam a antecipar a morte da moeda única, ao invés de olharem para a sua própria economia e resistirem à óbvia desclassificação. Claro, que, como já se tem apontado, sem a necessária falta de medidas de controlo adequadas, quando economias da zona euro eram tão diversas – caso particularmente da Grécia e de Portugal - o euro nasceu enjeitado. Quanto à eventual desclassificação do triplo A da França, não obstante as agora habituais cimeiras do duo Merkel-Sarkozy, mas com evasivas e paliativas promessas de soluções a curto prazo e, assim, sossegar os mercados, é muito possível que isso venha a acontecer, devido às já referidas “antecipações” e impulsos de incompreensíveis interesses, na melhor das hipóteses paroquialistas, mas na pior, miópico expediente explorador, do outro lado do Atlântico.
Escrevi sobre as agências aqui: http://imagenscomtexto.blogspot.com/2011/04/as-agencias-de-rating-nao-sao-mao.htmle e aqui: http://imagenscomtexto.blogspot.com/2011/07/os-copistas-ou-os-seguidores-das.html
Tudo depende do modelo, i.e., da equação que as agências usarem para a atribuição da notação. Se, como diz, "para além de uma notação vir a influenciar os mercados, ela própria já presume aquilo que os mercados estariam predispostos a ouvir", então deverá tratar-se de um modelo dito não-linear. Isto é interessante, porque mostra que as agências chegaram a um ponto em que não confiam nos modelos em que a notação só depende dos dados macro-económicos. É preocupante, porque os sistemas físicos descritos por equações não-lineares têm a maçadora característica de, quase sempre, só aceitarem soluções aproximativas e iterativas, e matematicamente exibirem comportamentos "caóticos", ou seja, imprevisíveis. O bater de asas de uma borboleta em Wall street pode provocar uma tempestade em Paris ou em Tóquio...
DL
"cabelo bastante comprido, largo bigode tipo mexicano e gravata com um nó imenso"
Com disfarces desses, depois, admire-se com as "apocrifias". :)
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