domingo, janeiro 29, 2012

Curt Mayer-Clason (1911-2012)

Ontem, dei-me conta pelo jornais de que morreu, em Munique, com 101 anos, Curt Meyer-Clason.

O nome dirá pouco a gerações recentes, mas a cultura e a liberdade criativa ficaram a dever bastante a este alemão, que dirigiu o Instituto Goethe, em Lisboa, entre 1969 e 1976. 

Viveu duas guerras e duas derrotas alemãs. Durante a 2ª guerra mundial esteve internado num campo de "observação", no Brasil, onde estava como representante comercial, como estrangeiro suspeito, depois de Getúlio Vargas ter decidido mudar de posição em favor dos aliados. Foi na detenção que tomou conhecimento dos grandes escritores brasileiros, tendo-se tornado para sempre íntimo de Guimarães Rosa. Regressado à Alemanha, em 1954, editou e escreveu livros, tendo-se dedicado a traduzir e a fazer conhecer uma imensidão de autores de língua portuguesa e espanhola. 

Mas foi a chefia do centro cultural Goethe, ao Campo de Santana, onde me recordo dele a preponderar com uma pronúncia bizarra da nossa língua, que trouxe Meyer-Clason mais perto de alguns portugueses. O seu "Diários portugueses" dá conta desse tempo, sendo o livro um culto olhar estrangeiro sobre nós próprios. A instituição que chefiava funcionou com um saudável espaço de acolhimento, de que a cultura democrática portuguesa muito beneficiou. Rui Vieira Nery chamou-lhe "um polo insubstituível de produção artística de vanguarda e um espaço de liberdade criativa inusitada no meio das brumas da censura e da repressão". Sem partidarismos nem radicalismos, Meyer-Clason soube perceber os anseios de um certo Portugal e entender que por aí passava a chave do futuro do país.

Na hora do desaparecimento de Curt Meyer-Clason, e para que não se diga que a nossa memória se torna ingrata, quero aqui deixar uma palavra de saudade por um homem que também ajudou a construir a nossa liberdade.

4 comentários:

Helena Sacadura Cabral disse...

Tem razão Senhor Embaixador.
Várias gerações, incluindo a minha, beneficiaram desse polo a que refere Vieira Nery!

Anónimo disse...

Qual liberdade?

Ogman

Mônica disse...

Senhor
embaixador
E tão gratificante pra mim ler sobre as personalidade que aqui fico conhecendo.
O sr é de muito talento pra poder nos proporcionar estas riquezas de personagens.
com amizade e carinhod e MOnica

Portugalredecouvertes disse...

Não tive tempo de comentar este artigo, mas pensei o seguinte,

que a frase de "um culto olhar estrangeiro sobre nós próprios" faz-me pensar nos jornalistas portugueses que vezes demais pedincham a opinião aos estrangeiros que nos visitam, tentando que eles digam o que pensam de nós portugueses! Que desatino! nunca vi os ingleses por exemple perguntar aos portugueses o que nós pensamos deles!

Acredito que não é isso que o Sr. Embaixador quis dizer, eu é que pensei neste aspecto do algum do nosso jornalismo

Os borregos

Pierre Bourguignon foi, ao tempo em que eu era embaixador em França, um dos grandes amigos de Portugal. Deputado à Assembleia Nacional franc...