segunda-feira, fevereiro 02, 2015

Das folhas


Brilha-lhes o olhar ao falar daquilo que lhes fez a vida. Têm memórias de elefante. Sente-se o gosto, melhor, o gozo com que nomeiam os objetos que um dia ajudaram a criar, que foram capazes de "agarrar" antes dos outros. São os editores. Conhecem-se muito bem uns aos outros. Alguns foram um dia da mesma família, entre si tiveram divórcios ou separações amigáveis. Competem por esses objetos de cultura, sem par, que são os livros. Devo dizer que sempre lhes invejei esse precioso caminho entre as folhas. Ouço deles, com grande prazer, as histórias das empresas e dos livros que ajudaram a nascer. A nossa vida contemporânea - cultural, mas também política - tem muito a ver com o percurso do mundo editorial português. E da audácia, coragem e teimosia dos homens que o construíram.

Os tempos vão hoje estranhos para a edição dos livros. Os gigantes dominam o mercado, "compram" as montras e a exposição dos volumes nas livrarias, controlam a distribuição, influenciam a divulgação e até a crítica, emitiram cheques que, de um dia para o outro, fizeram desaparecer ou atenuar o brilho de marcas que fizeram história. Nada que a organização mercantil da sociedade, contra a qual pouco se pode fazer, não explique com grande simplicidade.

A mim, isto cria-me alguma nostalgia. Gosto dos pequenos editores, dos que colocam no mercado poucos exemplares, que teimam em resistir, que se apuram numa capa, no papel utilizado, na originalidade de uma proposta bizarra. Mais do que uma luta, creio que se sentem portadores de um dever, que tem muito a ver com uma geração a que também pertenço.

Esta tarde, estive à conversa com um amigo que faz parte da história da edição livreira em Portugal. Com os pés na terra, admite as realidades mas, como sempre, procura encontrar os escaninhos por onde possa realizar os seus sonhos. Trouxe-me uma ideia nova, original, com muita graça e imaginação. E com custos ínfimos. Em duas horas, discutimos as hipóteses de a pôr em prática. Um destes dias, quando o projeto tiver mais corpo, partilharei (detesto esta palavra, mas vá lá!) a ideia por aqui. Tenho a certeza que será apelativa para muitos leitores deste blogue.    

3 comentários:

Helena Oneto disse...

Força! Que venha depressa essa "ideia nova, original, com muita graça e imaginação"!

patricio branco disse...

as leis da industria e do comercio são as mesmas nesse ramo, trabalham com ideias, boa ou má cultura, publicam desde manuais universitários a livros sobre esoterismo e extraterrestres, passando pela política, literatura, etc, Competem ferozmente, compram exclusivos de escritores que vendem.
estranho mundo, de verdade e venha essa ideia

Anónimo disse...

Deambulei ao longo de anos, ao lado, ou longe, de nomes da edição ou das livrarias como Alçada Baptista, Rogério de Moura, Marcela Torres, Gaetan Martins de Oliveira, Pedro Tamen, Fernando Guedes,Bidarra de Almeida, passando pela Romano Torres, a Livros do Brasil,a Europa-América, a Ulisseia, a Arcádia, a D. Quixote, a E Etc., a Hiena, a Cotovia, a Inova, etc., etc. Cá estou para acompanhar o projecto milagroso... O analfabetismo que paira sobre a edição é de ir às lágrimas. Só há €€€€€€€€ nas lunetas dos ditos cujos. Qualidade para quê???? Na Inquisição, sabia-se por que se queimavam pessoas e não só. Agora guilhotinam-se os livros...

Hoje lembrei-me do padre Domingos

Das traseiras da igreja de São Martinho de Bornes tem-se esta vista. Lá em baixo, ficam as Pedras Salgadas, com as Romanas, Sabroso e algum ...