Portugal
atravessa, com grande probabilidade, um dos momentos em que a capacidade
autónoma para decidir o seu futuro está mais limitada. Esta posição resultou de
opções institucionais, bem como da evolução de conjunturas que não conseguimos nem
controlar nem influenciar de forma minimamente eficaz. As partilhas de
soberania que concedemos no passado, não só na União Europeia, foram feitas no
pressuposto das vantagens decorrentes da pertença a essas instituições, mas
igualmente na convicção de que conseguiríamos intervir na sua gestão. Ora isso,
na prática, não acontece.
Por um
variado conjunto de razões, o nosso país não tem hoje um mínimo de influência significativa
em instâncias onde, sob uma vontade maioritária que não nos representa, são
ditadas regras que condicionam quase em absoluto o nosso quotidiano.
A nossa
posição face a Bruxelas/Frankfurt (leia-se, muitas vezes, Berlim) é de
permanente “demandeur”. Somos dialogantes porque aprendemos as lições gregas, usamos
a voz para nos não confundirmos com o triste Portugal, “atento, venerador e
obrigado”, de um passado recente. Testamos identidades com quem possa ter
agendas pontualmente coincidentes com a nossa, embora ironicamente cada um persista
em mostrar-se “diferente” do outro, mas estamos ainda longe de conseguir gerar
plataformas com real eficácia.
Na prática, por
estes dias, apenas somos responsáveis pelos nossos erros. O que vier a correr
bem, na Europa e no mundo, pode vir a beneficiar-nos, mas temos uma imensa
exposição a tudo quanto possa vir a desregrar-se no exterior. Chama-se a isto ser
um país frágil.
“Fechamos
para obras”? Não. Já aqui andamos há quase 900 anos e atravessámos crises bem
piores, até existenciais, convém lembrar aos mais tremendistas. Na História,
todos os becos têm saídas, só que, às vezes, não são as mais felizes.
Portugal
vive hoje no fio da navalha orçamental, tendo de esperar que a “lei de Murphy”
não se lhe aplique – o que pode correr mal, corre mal. Devo dizer que, não
tendo sido um entusiasta desta solução governativa, cujos riscos continuo a
achar elevados, tenho hoje uma imensa admiração pelo trabalho que António Costa
está a desenvolver. Acho notável o seu esforço patriótico de tentar aliviar
marginalmente o sofrimento provocado por políticas que agravaram a pobreza e o
desemprego.
Sempre
entendi que a leitura comparada dos resultados previstos no “MoU” da Troika com
as estatísticas reais devia ser obrigatória no Eurogrupo e em algumas
faculdades de Economia que por aí se titulam em inglês. Só uma cegueira de
burocratas europeus e de académicos obstinados em ter a razão dos números contra
as pessoas é que parece não entender o que podem significar algumas décimas temporárias
de flexibilidade, com efeitos na sustentabilidade de políticas públicas de um
país sem “safety nets” para os mais carenciados, cuja evolução macroeconómica –
seja ela qual for! - nunca afetará minimamente a estabilidade do euro.
O que se
passa entre Portugal e as instâncias europeias não é uma querela
económico-financeira, como muitos querem fazer crer, é uma questão puramente
política. E é assim que deve ser tratada.
Não sei como
isto irá acabar. Veremos se o acordo grego apazigua os mercados, se a
irresponsabilidade do referendo de Cameron nos não sai cara a todos. E, claro,
se Trump vier por aí, então o caso muda de figura e não vão chegar os coletes
salva-vidas.
(Artigo que ontem publiquei no "Jornal de Negócios")