Expliquei ao “Les Echos” que a embaixada não fazia qualquer
declaração. Não obstante a insistência da “BFM-TV”, reforçada com uma “cunha”
de um jornalista português, disse estar indisponível para entrar em direto na
sua edição da noite, como fizera, por duas vezes, em semanas anteriores. Repeti
o mesmo à “France 24”, que me queria na sua emissão em inglês. Não sabia
(ainda) o que dizer. Era o dia seguinte ao pedido de ajuda de Portugal. Foi há quatro
anos.
É talvez cedo para se saber como os vários embaixadores
portugueses, nas principais capitais europeias, viveram esses meses. Cada um
falará por si. No meu caso, em Paris, acompanhava, dia após dia, as diligências
que as nossas autoridades desenvolviam para tentar escapar ao pedido de ajuda
externa e as mensagens que, nesse âmbito, eram por nós passadas às congéneres
francesas, com o objetivo de garantir um apoio europeu (e, essencialmente,
alemão) para a nossa posição oficial. Parte substancial dos contactos
passava-se entre os gabinetes dos chefes de governo. A nós, cabia-nos explicar
a racionalidade das nossas posições e enquadrar, sob a matriz da (real) normalidade
democrática nacional, a fortíssima tensão política que se vivia em Lisboa, do
PEC IV aos dissídios partidários em crescendo.
Com o passar dos dias, sentia, cada vez mais, que as coisas
se aceleravam. (Tenho pena de não ter guardado quaisquer notas). Era o tempo
das movimentações das agências de notação, o crescente “downgrading” português,
o disparar do “spread” dos nossos “bonds” a 10 anos, que eu acompanhava, todas as
manhãs, ao abrir o “Financial Times”. Passei então a ser chamado a falar nas
rádios e, um pouco menos, em televisões. Nunca antes, como embaixador em Paris,
me fora dada tanta “atenção”. Só que não era pelas melhores razões. Sem a menor
dificuldade, publiquei alguns artigos na imprensa. A minha “narrativa” era
quase sempre a mesma: defesa dos índices favoráveis conhecidos, denúncia do
exagero das agências de “rating”, afirmação de que era possível dispensar a
ajuda externa. Como dizem os americanos, “my country, right or wrong”.
A partir de certa altura, Lisboa, como fonte de instruções, foi
desaparecendo. Falava com colegas portugueses noutros postos, mas todos
comungavam do mesmo desconhecimento. Para além das declarações públicas, nada
mais transpirava. Os escassos responsáveis políticos portugueses com quem
consegui contactar também já não ajudavam. Por aqueles dias do fim, senti uma
inédita solidão e, essencialmente, a angústia de não saber o que fazer (ou se
devia fazer algo) como representante de Portugal junto de um dos mais
importantes países do mundo. Recordarei para sempre uma conversa telefónica com
um alto responsável do Eliseu, que teve a sensibilidade de não me inquirir para
além daquilo que ele sabia que eu podia dizer (e saber) e que me deixou
palavras de discreto conforto, sem, contudo, as fazer soar de forma
paternalista.
Depois, a toalha caiu no ring. O discurso mudou. A vida de
um diplomata é assim.
(Artigo que hoje publico no "Diário Económico")