Já falta pouco. Acabado o futebol do Brasil, ou ainda com ele à mistura, as nossas televisões vão começar a brindar-nos, por algumas semanas, com os fogos. Os telejornais abrirão com as "Sónias Cristinas", de "corneto" em punho, tendo como imagem de fundo o "espetáculo dantesco" (os lugares comuns são o prato forte dessas reportagens em direto) dos incêndios. "Populares" angustiados, afogueados e de mangueiras em punho serão filmados, por câmaras trémulas, a relatar, de forma compreensivelmente atabalhoada, o que viram e o que sofreram. Bombeiros exaustos irão espalhar suspeitas sobre a "mão criminosa" por detrás dos "reacendimentos" e falarão dos "rescaldos" em que estão envolvidos. Autarcas reclamarão da "falta de meios" e falarão dos "custos humanos e materiais" provocados pelo "flagelo" na sua zona. Ministros graves, num traje intermédio entre o oficial e o estival, acolitados por umas figuras da Proteção civil de bonés bizarros, prometerão "ajudas" e darão números sobre a "área já ardida este ano", prometendo um "rigoroso inquérito" sobre os casos mais estranhos. As autoridades policiais, já em pose de gabinete, anunciarão a "detenção de alguns presumíveis incendiários" e a investigação de "negócios estranhos" relacionados com a "atividade da indústria madeireira". E alguns "soldados da paz", por impreparação, má orientação ou azar, desaparecerão, com governantes no funeral. Ah! E a imprensa especulará sobre as "negociatas" ligadas a contratos de aluguer de aviões de combate aos fogos.
É assim todos os anos. Chegadas as chuvas de Outono, regressado o futebol da paróquia às televisões, ninguém mais falará dos matos secos que a incúria de todos deixa criar até junto às casas, dos corredores corta-fogos que devem ser reforçados, da escassa limpeza que continuará a ser feita nas zonas adjacentes aos caminhos nas serras, enfim, da planificação e execução de medidas preventivas, a montante do início da época mais quente, com envolvimento das autarquias, que deveria ser feita e ninguém faz. Disso só se falará de novo, no Verão de 2015, uma vez mais, quando já for demasiado tarde. Isto é, antes deste ciclo recomeçar.
Teremos de ser assim para sempre?