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quinta-feira, dezembro 01, 2011

Refundar a Europa (2)

Encerrou no dia 30 de novembro, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, o "Congresso internacional 25 anos na União europeia", organizado pelo respetivo Instituto Europeu (que também comemora um quarto de século de existência), sob a orientação do professor Eduardo Paz Ferreira.

Devo dizer que, nas quase cinco horas de trabalhos a que assisti, confortei a minha ideia de que Portugal dispõe de uma "massa crítica" de reflexão sobre estas temáticas que pede meças a qualquer país europeu. Julgo que isso mesmo pôde constatar o meu colega francês em Lisboa, Pascal Teixeira da Silva, que seguiu atentamente os trabalhos.

No que me respeita, destaco alguns pontos do que abordei no meu painel:

- a crise da governabilidade democrática na Europa contemporânea.

- as tensões induzidas ou a induzir pela crise europeia nos sistemas constitucionais de cada país.

- a forma diferenciada como as opiniões públicas nacionais são mobilizadas pelo fatores de insegurança que atravessam a Europa.

- a perceção pelos eleitores nacionais das diferenças de poder, no âmbito europeu, dos seus titulares da representação política, com naturais efeitos na respetiva legitimidade.

- a fragilidade particular que sofrem os países sob tutela de programas de ajustamento, que vivem um quase ambiente típico de "pós-guerra".

- a necessidade de perceber que há uma linha muito fina que separa a assunção de medidas de rigor e austeridade, aceites como indispensáveis e assumidas como legítimas, da ideia de se estar perante um "diktat" externo gerado por um "estado de necessidade", que pode alienar a respetiva aceitação popular, com riscos sociais graves.

- a necessidade de preservar a confiança entre os Estados membros, por forma a não gerar clivagens entre as várias opiniões públicas, se se pretende garantir condições para uma futura reforma, ainda que limitada, dos tratados europeus.

- a especial posição em que Portugal se encontra, fruto da necessidade de cumprir, com rigor, compromissos que derivam na nossa fragilidade económico-financeira, ao mesmo tempo que os seus dirigentes têm forçosamente de assumir posições políticas que garantam a não marginalização do país, no quadro dos novos arranjos europeus que, queiramos ou não, aí virão.

- a importância de Portugal praticar, neste difícil contexto, uma política muito pragmática de alianças e, tal como no passado, ter de fazer opções de matriz inclusiva e centrípeta face aos modelos mais coesos de integração (ou de cooperação intergovernamental) que possam vir a ser desenhados, evitando, o mais possível, qualquer risco de periferização.

Tal como acontecera no painel anterior àquele em que participei, que havia sido dedicado à questão financeira e onde houve intervenções de grande qualidade e profundidade, fiquei muito agradado com a discussão tida com os meus colegas de painel - onde António Vitorino traçou um rigoroso inventário prospetivo do que pode esperar a Europa como saldo desta crise, onde João Cravinho ilustrou com a sua experiência pessoal as dificuldades de participação no quadro interinstitucional na União, onde Raul Rosado Fernandes "partiu a loiça" com a sua heterodoxia eurocética e afastamento do "politicamente correto" e onde Nuno Severiano Teixeira traçou um interessante e elaborado quadro histórico do papel central da Alemanha nos diversos tempos de revisão do "contrato europeu".

Pegando no último tema, deixei clara no final dos trabalho a minha perspetiva de que o trabalho franco-alemão se constituiu sempre, no passado, como um contributo da maior importância para a dinâmica do processo europeu. Porém, o modo como a "coreografia" do exercício dessa influência se estava a apresentar, nos últimos tempos, no cenário de afirmação dos poderes tinha, com toda a evidência, criado algum incómodo e mal-estar em certos parceiros, que se sentiam pressionados por uma espécie de "duopólio" auto-designado, que era particularmente chocante no tocante ao que parecia ser uma clara subalternização das instituições.

Neste ponto, parecia-me cada vez mais delicada a posição da Alemanha, cuja imagem histórica evolutiva sempre constituiu um pano de fundo referencial para todo o processo integrador. Não me sossegava verificar - mesmo em França, onde o esforço de reconciliação teve talvez o seu maior expoente -, a clara geração de um ambiente de desconfiança quando ao "excesso de poder" de Berlim. A questão alemã é uma questão europeia e o modo como a movimentação do poder alemão é vista em todo este contexto não deixará de ter consequências no ambiente de confiança indispensável à consensualização de soluções de futuro.

Aproveito para deixar um link para o texto que, em paralelo a esta Conferência, publiquei no livro "25 anos na União Europeia - 125 reflexões", editado no dia 30 de novembro pelo Instituto Europeu da Faculdade de Direito de Lisboa. É um texto "perecível", quiçá a ser infirmado pelos factos, no curto prazo. Porém, como afirmei na Conferência, ao abordar este tipo de assuntos sinto-me hoje como estando a debater teorias climatéricas no meio de um ciclone...

Em tempo: a JustiçaTV trouxe a intervenção inicial que fiz (depois complementada por outras duas intervenções)

quarta-feira, novembro 30, 2011

Refundar a Europa (1)

Em 1 de julho de 2000, publiquei no "Le Monde" um artigo sob o título "Refonder l'Europe". Nele propunha, a montante da aprovação do Tratado de Nice então em curso de negociação, a possibilidade de convocação de uns "Estados Gerais" da Europa, abrangendo os executivos e os parlamentares, para a definição de uma nova ordem institucional europeia. Entre 2002 e 2003, a "Convenção para o futuro da Europa", gizou o Tratado Constitucional (abandonado depois dos referendos negativos nos Países Baixos e em França) e alguns círculos europeus falam, de novo, na possibilidade de convocação de uma "convenção" para rever pontualmente o Tratado de Lisboa.

Hoje, na Faculdade de Direito de Lisboa, vou participar, juntamente com António Vitorino, Raul Rosado Fernandes, Nuno Severiano Teixeira e João Cravinho, sob a moderação de António José Teixeira, num debate no âmbito do "Congresso Internacional 25 anos na União Europeia". Curiosamente, o título desse painel, que encerra a Conferência, é "Refundar a Europa". Agora já sem ponto de interrogação. 

quinta-feira, novembro 24, 2011

A Europa e os jovens

Ontem à tarde, estive a falar, em Saint-Germain-en-Laye, a uma dezenas de jovens sobre a Europa e os seus problemas. Procurei ser simples, numa questão que é (e está, cada vez mais) muito complicada. Longe vão os tempos em que alguma regularidade no processo de construção europeia nos dava a segurança de poder afirmar certas certezas e de poder testar algumas alternativas plausíveis. É quando procuro alinhar ideias sobre os tempos que estamos a viver, sobre as opções que podem ter de ser tomadas amanhã, que melhor me dou conta da imensidão de dúvidas que eu próprio hoje alimento. E isso deve transparecer, com naturalidade, daquilo que digo. Por isso, por mais "sábios" que possamos ser sobre o passado da processo integrador e por mais lições que dele queiramos tirar para o seu destino, a verdade é que os dias que correm nos tornam, a todos, simples prisioneiros de um futuro bastante incerto.

segunda-feira, novembro 21, 2011

Edgar Morin

A vida tem destas coisas. Ando há anos para ouvir Edgar Morin, de quem li muito e sempre com proveito. Ao final da tarde de hoje, ele faz uma conferência do centro cultural da Fundação Gulbenkian, aqui em Paris. Estava a deliciar-me com a possibilidade de o escutar sobre a crise, a Europa e a crise na Europa. Pois não é que essa é a única hora que consegui para uma visita de urgência a um dentista?! Há dores que são duplas.

sábado, novembro 19, 2011

Pascal Lamy

Na passada sexta-feira à noite, estive presente numa palestra-debate com Pascal Lamy, diretor-geral da Organização Mundial de Comércio (OMC), a convite da associação "Notre Europe", criada por Jacques Delors, a que agora preside António Vitorino.

Lamy é um homem brilhante. Foi chefe de gabinete de Delors e, anos mais tarde, comissário europeu com a pasta do comércio exterior. Com ele tive então algumas "accrochages", quando se discutia a fixação do mandato europeu para a reunião ministerial da OMC, a ter lugar em Seattle, em fins de 1999. Nada que fosse muito diferente dos problemas que já tivera com o seu antecessor, o britânico Leon Brittan, na preparação das duas anteriores reuniões ministeriais da OMC, cuja delegação nacional me competiu chefiar - em Singapura (1997) e Genebra (1998).

Portugal atinha-se então fortemente à defesa de alguns produtos "sensíveis" para a nossa indústria, pelo que tentava salvaguardar certas "posições pautais", nomeadamente relativas a produções têxteis, dado que o nosso país se recusava ter de pagar, através da total abertura do mercado europeu a produtos idênticos oriundos de países terceiros, certas vantagens que outros nossos parceiros mais avançados pretendiam obter nesses mercados.

Recordo longas e penosas horas de negociação passadas nas salas de Bruxelas, com Portugal a terminar o processo praticamente isolado, comigo a fazer "bluff" com a ameaça de abandono da sala e, simultaneamente, pressões a serem feitas pelo telefone junto de Lisboa, queixando-se da minha intransigência.

Um dia, contarei aqui como não pude evitar o sentimento de algum gozo ao testemunhar, semanas depois, nas manifestações nas ruas e no caos das salas de trabalho da reunião de Seattle, o ruir fragoroso dessa negociação. Ia pagando caro, em termos europeus, uma declaração que então fiz à SIC, dizendo "não poder deixar de ter uma certa simpatia nostálgica pelos manifestantes, que haviam criado um ambiente anos 60, que recordava Berkeley e o Maio 68". Recordo que essa foi, talvez, a primeira grande movimentação de massas anti-globalização.

A reunião de sexta-feira parecia de "amigos de Alex", gente de um outro tempo europeu. Por lá encontrei Niels Ersbøll, antigo secretário-geral do Conselho das Comunidades Europeias, Philippe de Schoutheete, representante permanente belga, e Elisabeth Guigou, antiga ministra francesa - todos membros do "grupo de reflexão" no seio do qual, em 1995, havíamos discutido e preparado a revisão do tratado de Maastricht. Mas, igualmente, os portugueses Maria João Rodrigues e Vitor Martins, duas figuras a quem a política europeia portuguesa muito ficou a dever. E, também, os meus amigos espanhóis Enrique Barón Crespo, antigo presidente do Parlamento Europeu, e Eneko Landaburu, que agora chefia a representação da UE em Rabat, uma figura que foi sempre de uma grande correção para conosco, como diretor-geral da Comissão encarregado dos fundos estruturais.

A charla e o debate processavam-se de acordo com a consagrada "Chatham House rule", o que significa que o conteúdo do que foi dito não deve ser passado cá para fora (embora eu visse dois jornalistas conhecidos a tomar afanosamente as suas notas...). Por isso, apenas aqui anoto a ironia de Pascal Lamy quando afirmou que os países do antigo G8 parece não terem ainda decidido muito bem como deverão tratar os chamados "emergentes" (que muitos consideram já "emergidos"): ou como países ricos com muitos pobres ou como países pobres com muito ricos.

sexta-feira, novembro 18, 2011

As contas da Europa

No meio de toda a turbulência que afeta a generalidade da União Europeia, por via da crise que está instalada em torno do euro (que, curiosamente, continua a revelar-se uma muito sólida moeda, no contexto mundial...), há uma discussão séria que se aproxima: a das "perspetivas financeiras", isto é, o quadro orçamental plurianual que será fixado para vigorar de 2014 até 2020.

Esta não vai ser - nunca foi... -  uma discussão fácil, particularmente num contexto de restrições orçamentais como aquele que todos os Estados membros da UE atravessam. A Comissão Europeia já apresentou algumas linhas de reflexão. Algumas movimentações no terreno deixam claros interesses que pretendem ser preservados no futuro, nomeadamente com vista a fazer escapar algumas políticas comunitárias ao esforço global de contenção que terá de ser feito. Nada de surpreendente.

Pela nossa parte, com a serenidade de um país que, em todas as negociações de anteriores quadros financeiros revelou sempre uma atitude de firmeza responsável, e em particular porque estamos num contexto em que consideramos que não há condições para um reforço do orçamento, Portugal defende que todas - mas todas! - as políticas da União devem contribuir para o necessário esforço de contenção. 

quinta-feira, novembro 17, 2011

François Bayrou

François Bayrou é um dos mais experientes políticos franceses. Antigo ministro e presidente do partido centrista MoDem, obteve mais de 19% dos votos nas eleições presidenciais de 2007. Em 2012, irá de novo a votos. Entretanto, vai publicando, pelo seu punho, alguns livros que são tão polémicos como admiravelmente bem escritos.

Ontem, Bayrou almoçou com os embaixadores da União Europeia e, num tom solto e bem humorado, disse-nos o que pensa da situação política interna francesa, explicando também a sua visão sobre as mais importantes temáticas europeias. Fê-lo num tom franco e "sem papas na língua", o que me levou a dizer-lhe, em jeito de elogio, numa questão que lhe coloquei, que, ouvindo-o, ninguém diria que a expressão "langue de bois" era francesa...

Aproveitei este encontro com François Bayrou para pôr com ele algumas contas em dia.

Alguns se lembrarão que, em 2000, no início da presidência portuguesa da União Europeia, ocorreu o chamado "caso austríaco". 14 dos 15 países da então União, descontentes com o facto de estar iminente a entrada no governo austríaco de um partido tido como de extrema direita, resolveram impor algumas "sanções" às autoridades de Viena.  Tratava-se de medidas de natureza bilateral, que não afetavam os direitos austríacos como país membro da União, mas que significavam o descontentamento dos parceiros europeus da Áustria pelo facto do paradigma governamental do país poder conflituar com a ordem de valores pelo qual a Europa comunitária se deveria pautar. Mal sabíamos nós, à época, o que o futuro nos traria noutras paragens do continente...

O tema era muito polémico, por toda a Europa. Como polémica foi a necessidade de Portugal ter sido colocado, pela generalidade dos seus parceiros europeus, no centro do problema, como "coordenador" da posição dos 14. O Parlamento Europeu também não escapou a ele e, numa tarde de fevereiro, em Bruxelas, com o areópago a abarrotar, a presidência portuguesa, que tivera de assumir as "dores" dos 14, esteve no centro de um longo debate. Coube-me assegurar as nossas "cores" e defrontar um ambiente muito tenso, com centenas de deputados a vaiar a posição que nos competia defender, lado a lado com outros que hostilizavam a opção austríaca.

A base de argumentário de que eu dispunha para o debate era muito escassa: um mero comunicado de alguns parágrafos, laboriosamente acordado entre os 14, com aquela linguagem ambígua que esse tipo de textos fortemente negociados sempre tem. Era muito pouco, para cerca de duas horas de debate, mas era essa a minha margem, pelo que tive de improvisar em torno do texto comum, cuidando em o interpretar criativamente, correndo o risco de alguém me poder dizer que estava a ir longe demais. 

Acresce que a Comissão europeia, na bancada em frente, escudada na prudência, havia decidido tomar um caminho de retração opinativa num tema em torno dos valores, aguardando talvez que o vento soprasse de forma clara num qualquer sentido. Pela voz do presidente Romano Prodi, assumiu uma posição equívoca, a qual, a partir de certo momento, me deixou numa situação algo embaraçosa. Nem uma intervenção mais "assertive" do comissário Neil Kinnock em nosso apoio, a quem eu fizera entretanto chegar uma nota do desagrado por essa tibieza inicial, foi suficiente para reverter o ambiente de isolamento em que a presidência portuguesa se encontrava.

No plenário, o "ping-pong" entre a esquerda e a direita foi-se processando, com a presidência a ser considerada, ora tímida e complacente, ora demasiado agressiva com Viena, sendo raros os que se reviam na "craftly worded" linguagem do comunicado dos 14. 

Por razões que só a "petite histoire" acolherá um dia, a maioria dos deputados portugueses dispensou-se de intervir em defesa a posição da "sua" presidência, pelo que, sozinho, tive de fazer as "despesas da conversa". Nada que fosse impossível, mas era uma posição bastante difícil de ir sustentando sem apoios claros no plenário. Mas estes eram raros. Contra nós, por exemplo, falaram figuras como Jean-Marie Le Pen, que vociferou graves coisas denunciando a atitude que titulávamos - repito, não em nome de Portugal, mas de 14 dos 15 países da União cuja posição e razões nós ali tentávamos sustentar.

Foi então que uma voz do centro do espetro político europeu se ergueu, com grande vigor e determinação, apoiando as razões assumidas pela presidência portuguesa, destacando que ela estava a representar os princípios de ética democrática da União e uma linha justa de abordagem do problema: essa voz era a de François Bayrou. Com as suas reconhecidas qualidades de tribuno, colou-se às nossas posições e foi uma preciosa ajuda para equilibrar o ambiente.

Ontem, tendo com ele coincidido numa das mesas do almoço organizado pelo meu colega polaco, tive o ensejo de lhe relembrar a ocasião e o seu gesto. Ainda que com mais de uma década de atraso, foi-me grato poder expressar esse agradecimento que estava a dever a François Bayrou.

quinta-feira, novembro 10, 2011

Poderes

Comentário irónico de um colega europeu (não revelo o país, claro), à margem de uma reunião de trabalho, na tarde de hoje: "Não deixa de ser estranho verificar que o poder de pressão dos poderes fáticos europeus, forçando à mudança de governos, só funcione perante democracias. Gostava de os ver tão eficazes em Damasco e Teerão...".

Nem imaginam a cara de alguns dos presentes.

A bicicleta europeia

Jacques Delors dizia que a Europa era como um bicicleta: no momento em que parasse de avançar cairia para o lado.

Salvo para alguns artistas prendados - e os tempos não mostram muitos no atual circo europeu -, há outra conclusão que se impõe: se a bicicleta começar a andar para trás, espalhamo-nos todos ao comprido.

Democracia

"A crise da dívida parece empurrar gradualmente a Europa para uma mais estreita integração. Mas a Europa pode pagar um preço pesado se, nesse caminho, tratar cada vez mais a democracia como um luxo fora de moda" - escreve hoje Tony Barber no "Financial Times", num artigo onde se destacam os casos português e irlandês, como exemplo de esforços feitos por governos que estão perante "formidáveis dificuldades, mas das quais não faz parte a defesa da sua legitimidade".

Previsões

É muito bom ler isto: "A Comissão Europeia estima que Portugal irá cumprir as metas de défice público para 2011 e 2012, prevendo mesmo um valor ligeiramente mais otimista que o governo português para este ano, ao antecipar um valor de 5,8 por cento do PIB."

E menos bom ler isto: "A Comissão Europeia prevê que o nível da dívida pública portuguesa chegue a 101,6 por cento do PIB este ano e registe um aumento para 111,6 por cento em 2012. As perspetivas de Bruxelas, presentes nas previsões de outono hoje divulgadas, são mais pessimistas que as do governo português."

Portanto, sigamos o João Pinto.

domingo, novembro 06, 2011

Nem mais, nem menos!

"O 'duopólio' franco-alemão tanto resulta da natureza intergovernamental dos denominados processos de resgate (onde a dimensão dos fundos requeridos só pode vir dos orçamentos nacionais, atentas as limitações do orçamento europeu), como da timidez e inércia das próprias instituições europeias. Daí a necessidade de, num curto prazo de tempo, adotar as soluções que permitam que o processo decisório europeu não seja capturado por um grupo de Estados e que as decisões tomadas, porque dependentes de decisões nacionais, em regra dos respetivos parlamentos, possam beneficiar dessa legitimação democrática em tempo útil para produzirem os efeitos pretendidos".

António Vitorino, no "Expresso" (5.11.11)

sexta-feira, novembro 04, 2011

Piris e a Europa

Há meses, a propósito de um jantar que com ele e alguns amigos comuns tive aqui em Paris, escrevi neste blogue sobre Jean-Claude Piris, o antigo chefe do serviço jurídico do Conselho da União Europeia, que agora ensina em Nova Iorque e que, por décadas, foi o arquiteto-mor das instituições da Europa.

Ontem à noite, a propósito das questões institucionais que se colocam à Europa no auge desta crise, lembrei-o durante uma conversa, por ter a certeza que a sua opinião, neste tempo de incerteza, seria muito bem-vinda. Pois ela aí está, hoje, no "Financial Times", num artigo que é reproduzido aqui.

O que Piris propõe como solução institucional imediata, em síntese, é uma "cooperação reforçada" em torno dos componentes da "eurozona", na óbvia inviabilidade de uma reforma tempestiva do Tratado de Lisboa.

O texto termina com uma verdade como punhos: "As soluções estão disponíveis. O que falta é vontade política". Claro.

quinta-feira, novembro 03, 2011

Europeus e europeus

Ontem à noite, ao observar a conferência de imprensa do presidente Sarkozy e da chanceler Merkel, em Cannes, na qual ambos se pronunciaram sobre as consequências da crise grega para o projeto europeu, dei por mim a pensar nos diferentes europeus que somos.

Um cidadão alemão ou francês ouve o chefe do executivo do seu país a dar mostras de autoridade sobre o processo económico-financeiro europeu, notando que a palavra desses dirigentes pesa nas decisões que a Europa toma, conta mais do que a de outros para a formulação da vontade política coletiva, seja ela qual for. Assim, ao votar nas suas eleições nacionais, ao escolher um líder para o representar, ou um parlamento para eleger esse líder, esse cidadão, alemão ou francês, sabe que essa pessoa vai ter ao seu dispor uma força capaz de assumir, com eficácia, pelo menos relativa, o interesse do seu país no quadro externo.

Coloquemo-nos agora no lugar de um cidadão grego. Desde há anos, vê regressar o seu líder, chegado das reuniões de Bruxelas, ajoujado sob o peso de decisões que teve de aceitar, debaixo da pressão de uma situação económica muito preocupante, com a vida social do seu país a degradar-se dia após dia. Esse cidadão, ao ser chamado a votar, percebe que, eleja ele quem eleger, o poder desses seus representantes será sempre, à partida, muito limitado, em particular no tocante à influência que pode vir a ter nas decisões tomadas em instâncias coletivas externas, contudo com forte impacto sobre seu país. 

O que quis significar com o que atrás escrevi foi o facto de haver hoje um sério problema de legitimidade política à escala europeia. Na História, sempre houve uma hierarquia de poderes nacionais, derivada da força relativa dos Estados. O essencial das decisões que importavam aos Estados permanecia, no entanto, no seu seio, onde a soberania era exercida em quase plenitude.

Nos seus primeiros tempos, o modelo europeu de integração, ao ter preservado a unanimidade, para o essencial das decisões, equiparava os Estados, que assim exerciam um (pelo menos teórico) direito de veto. E até mesmo nas questões que já eram decididas por maioria qualificada era preservada, por uma espécie de "gentlemen's agreement" (o famoso "compromisso do Luxemburgo"), a possibilidade de invocação do "interesse vital". A Europa parecia ter encontrado um modelo equilibrado de expressão desses poderes onde, não deixando de tomar em conta a importância real de cada um, era gerada uma expressão moderada da resultante coletiva, que se projetava sobre todo o grupo. 

Em poucos anos, esse mundo europeu, movido por uma incontrolável ânsia de eficácia, mudou. E mudou precisamente num tempo em que muitas das funções de soberania passaram a ser "partilhadas" (o que era uma realidade passou a eufemismo) a nível europeu. Ora quando, dada a extrema sensibilidade das questões em causa, a lógica apontaria para que houvesse um cuidado ainda maior na capacidade de cada Estado preservar algum controlo de interesses próprios de soberania, aconteceu precisamente o contrário: alguns Estados perderam, pelos tratados ou pela prática, uma capacidade mínima de determinar o seu futuro. A evolução dos últimos tempos, com a trágica diluição do poder comunitário independente que a Comissão Europeia era obrigada a representar e com a emergência de uma intergovernamentalidade com um brutal desequilíbrio dos poderes dos Estados, acaba assim por relevar na praça pública, de forma quase cruel, a legitimidade diferenciada dos decisores políticos de cada Estado.

Tudo isto é muito perigoso para a democracia. Como se está a ver na Grécia.

segunda-feira, outubro 31, 2011

Greenwich

A imprensa francesa refere que o governo britânico está a pensar introduzir, em 2012, um alinhamento com a hora do centro da Europa, abandonando a referência ao (seu) meridiano de Greenwich. Já nada é o que era, nem mesmo na velha Inglaterra...

Recordo que uma discussão similar teve lugar, um dia, no seio do governo português, nos idos de 1996. E que, contra algumas opiniões, prevaleceu a tese de que deveríamos manter a atual diferença face ao centro do continente. Se Londres deixar de servir de referência, será que, em Portugal, o tema vai também, de novo, ser repensado?

quinta-feira, outubro 20, 2011

O barman

É bom termos a sorte de nos lembrarem cenas em que participámos, mas que já havíamos esquecido! Há dias, um estimado colega (cujo nome não refiro, porque não cuidei em lhe perguntar se o podia fazer) recordou-me uma história passada numa reunião da Conferência Intergovernamental para a negociação daquilo que viria a ser o Tratado de Nice, ao tempo em que eu era o representante do governo português nessa tarefa.

A presidência rotativa semestral da União Europeia pertencia então aos Países Baixos. Discutia-se a eventual alteração do modelo de voto nas decisões comunitárias, que teria de passar por uma "reponderação" da força relativa de cada Estado no processo decisório. O tema era muito atual, mas muito polémico. Mudar a relação de forças entre os países foi sempre uma questão delicada e divisiva no seio da União Europeia.

Um dia, a presidência holandesa decidiu, sob a sua responsabilidade, colocar sobre a mesa uma proposta algo ousada que, em especial, alterava a relação interna de poder entre os três países do Benelux (Bélgica, Países Baixos e Luxemburgo), que tinha sido mantida intocada desde a criação das Comunidades Europeias. Para os negociadores holandeses, chefiados pelo embaixador Ben Bot, que anos depois haveria de ser chefe da diplomacia do seu país, haveria que retificar essa relação, por forma a dar uma maior consideração ao fator demográfico. Nessa perspetiva, os Países Baixos eram beneficiados, porque tinham uma população substancialmente maior que a dos seus dois outros parceiros do Benelux. Nesta lógica, as coisas tinham uma certa racionalidade, só que a lógica em que as coisas se apoiavam estava muito longe de ser consensual.

Assumir uma presidência implica respeitar uma certa neutralidade naquilo que se propõe. Não se espera que o país que a detem apresente, de uma forma ostensiva e despudorada, ideias que diretamente a possam beneficiar. Foi isso, contudo, que, nesse dia, os holandeses fizeram.

Acabada a intervenção de Ben Bot, o delegado belga, uma grande e experiente figura da diplomacia europeia, o embaixador Philippe de Schoutheete, pediu a palavra e, com a inteligência, franqueza e humor que todos lhe conhecíamos, disse, muito simplesmente: "Senhor presidente. Tomámos boa nota da proposta que acaba de nos apresentar em nome dos Países Baixos. O meu único comentário sobre essa sua proposta é o seguinte: o senhor portou-se como uma barman que se serviu a si próprio antes de servir os clientes".

E a proposta holandesa morreu aí.

quinta-feira, outubro 13, 2011

A mão visível

Tem imensa graça ouvir o canto dos reconvertidos próceres do novo federalismo. Depois de nos terem bombardeado, por décadas, com o paraíso da “mão invisível”, de terem entoado loas embevecidas às maravilhas do mercado, ei-los que chegam, novos e já velhos, a uma cada vez mais alargada comunhão na ideia de que se torna imperativo um salto federal europeu para a sustentação do euro. 

Que grande ironia! Quem havia de dizer que seria a Europa financeira a "puxar" pela Europa política! Ora sejam muito bem-vindos ao Estado!

Três dias

Dia 1. É preciso aproveitar melhor as oportunidades na área da construção civil que se abrem às empresas portuguesas neste país. Por isso, a embaixada acolheu, no dia 11, as largas dezenas de convidados que a Câmara de Comércio Franco-Portuguesa juntou, para um exercício de várias horas, entre promotores imobiliários franceses do setor da habitação social e um conjunto muito importante de industriais nacionais da nossa construção civil.

Dia 2. As portas da embaixada voltaram a encher-se, do dia 12, com quase uma centena de pessoas para aplaudir as dezenas de alunos portugueses premiados com bolsas de estudo para a frequência do ensino superior francês no corrente ano letivo. Trata-se de uma iniciativa lançada pela embaixada de Portugal que merece o apoio do Banque BCP, do banco BES, da Caixa Geral de Depósitos, da companhia de seguros Fidelidade, da empresa INAPA e da secretaria de Estado das Comunidades portuguesas.

Dia 3. O conselheiro das Comunidades portuguesas, Carlos Reis, foi o responsável pelo simpático convite que me foi dirigido pela Faculté de Droit, Économie e Gestion, de Orléans, para aí proferir hoje uma conferência subordinada ao tema "Le Portugal en Europe - les nouveaux défis". Seguiu-se um animado e informado debate, dentre a centena e meia de presentes, onde se contavam muitos estudantes e alguns "maires" da região. Portugal continua a ser um tema que interessa muitos franceses. Agora que as coisas não estão fáceis para nós, acho que vale ainda mais a pena praticar uma ativa "diplomacia pública" para explicar, com clareza e com todas as "cartas sobre a mesa", como estamos a trabalhar para vir a sair da crise e, de caminho, o modo como olhamos as estruturas em discussão nesta Europa. Uma jornada que valeu bem a pena.

quarta-feira, setembro 21, 2011

A democracia e a Europa

Ontem, um velho e avisado amigo francês comentava comigo o facto de apenas cinco dos 17 membros da zona euro terem, até ao momento, ratificado o programa de ajuda à Grécia aprovado no dia 21 de julho - faz hoje precisamente dois meses! A maioria desses Estados argumenta com a lentidão dos processos decisórios internos, isto é, com a necessidade de serem respeitados os procedimentos democráticos de cada país.

Com um ar irónico, atrás do qual se escondia uma premonição lúgubre, esse meu amigo concluía: "Quem havia de dizer que haveria de ser a democracia a acabar com a Europa". Sem, por ora, partilhar necessariamente a funesta previsão subjacente ao raciocínio, não me contive e acrescentei: "Tendo a democracia nascido na Grécia..."

terça-feira, setembro 13, 2011

Ouvi bem?

Leio na imprensa, nesta madrugada, que o comissário europeu de nacionalidade alemã teria sugerido que as bandeiras dos países membros endividados fossem colocadas a meia-haste. 

Independentemente de outras razões bem ponderosas que justificariam que certos países mantivessem a sua bandeira a meia haste, pode presumir-se que a sugestão possa ter efeitos retroativos - isto é, que assim se recorde todos os países que, em 2003, violaram os limites do défice público previstos no "pacto de estabilidade e crescimento" e que, desta forma, iniciaram o processo de fragilização de todo o sistema.

Na minha outra juventude

Há muitos anos (no meu caso, 57 anos!), num Verão feliz, cheguei a Amesterdão, de mochila às costas. Aquilo era então uma espécie de "M...