quarta-feira, julho 02, 2025

Seguro

António Vitorino e Augusto Santos Silva, o primeiro há dias, o segundo hoje, anunciaram não irem avançar com uma candidatura presidencial. Se acaso o tivessem feito, seriam acusados de se terem colocado no "mercado" político de António José Seguro, que tem no terreno, desde há já algum tempo, uma candidatura própria. A desistência de ambos revelou um grande sentido de responsabilidade, procurando evitar a divisão da esquerda e do centro-esquerda. 

À direita, "les jeux sont faits". Gouveia e Melo arrebanhará, com naturalidade, todo o eleitorado populista e de direita, moderada e extrema, ficando por definir o momento em que o voto do Chega se lhe colará. A vítima direta será o candidado oficial do PSD, Luís Marques Mendes, cujos votantes também parecem seduzidos, cada vez mais, a vogarem pelas águas do almirante.

À esquerda, não obstante toda a consideração pessoal e política que merece a figura de António Filipe, ficou hoje claro que o único candidato que se apresenta como um claro contraponto a Gouveia e Melo é António José Seguro. 

Conheço António José Seguro há bastantes anos. Fomos colegas de governo, onde ele foi secretário de Estado e ministro, trabalhámos de perto quando liderou os socialistas no Parlamento Europeu, a seu convite colaborei na iniciativa "Novo Rumo", com a qual o Partido Socialista procurou desenhar, em tempos difíceis do governo de "coligação" PSD-Troika, uma alternativa ao "passismo". 

Em 2011, Seguro foi herdeiro de um partido que fora copiosamente derrotado nas eleições, depois de ter assinado o "memorando de entendimento" a que o colapso financeiro tinha forçado a gestão de José Sócrates. Ao seu lado, se a expressão se deve aqui utilizar sem ironia, Seguro teve um grupo parlamentar desenhado pelo seu derrotado antecessor, e que nunca lhe facilitou a vida. 

Com a passagem do tempo e com o surgimento de resultados políticos tidos por insuficientes, o seu difícil papel começou a ser contestado dentro do PS. Uma pulsão em favor de António Costa foi crescentemente tomando conta do partido. Em face dessa pressão e do desafio de Costa, António José Seguro tomou a corajosa decisão de organizar uma votação, aberta a simpatizantes, para um tira-teimas em termos do nome do futuro líder. 

A resposta dos votantes foi a escolha de António Costa. Seguro abandonou, com dignidade, a liderança, remetendo-se ao silêncio a partir de então. Antes disso, porém, cometeu, a meu ver, um erro grave: nos debates públicos com António Costa utilizou uma linguagem confrontacional que se afastou radicalmente da serenidade da imagem que era a sua. Não havia necessidade - e muitos de nós dissemos-lhe então isso, com a frontalidade que se deve aos próximos. A meu ver, esse foi o seu único mas grande erro.

António José Seguro esteve por uma década num quase silêncio. Afastou-se da política ativa e dedicou- se so ensino. Aos 63 anos, ao aproximar-se a mudança de ciclo em Belém, decidiu, com toda a legitimidade, ensaiar um regresso à vida pública, apresentando-se como candidato presidencial. 

Não começou por assegurar a unanimidade dentro do Partido Socialista, bem como de pessoas próximas do partido, como foi o meu caso. Há meses, deixei aqui claro que a minha primeira opção ia, preferencialmente, para outras hipóteses. Contudo, não se tendo qualquer dessas candidaturas concretizado, não tenho hoje a menor dúvida em afirmar que o meu voto, em janeiro de 2026, irá para António José Seguro. E, com toda a liberdade de quem já não é militante, ouso esperar que o Partido Socialista se una em torno da sua candidatura. Vir a ter um Belém um comprovado democrata, uma personalidade equilibrada, íntegra, com forte e comprovada experiência, nacional e europeia, com uma incontestada capacidade de diálogo e bom conhecimento dos mecanismos políticos do Estado, é algo em que vale a pena apostar. 

7 comentários:

Blogue de Júlio de Magalhães disse...

Mas Augusto Santos Silva deixou entrever o aparecimento da candidatura de Sampaio da Nóvoa.

João Cabral disse...

Parece já longínquo o ano de 2014, mas ficou na memória de todos o "poucochinho" com que António Costa qualificou a vitória tangencial do PS nas eleições europeias. Essa indelicadeza foi uma forma de atingir pessoalmente António José Seguro e de o tirar da liderança do PS. Conforme o próprio AJS afirmou num dos debates para as eleições internas posteriores, Costa traíra-o e faltara à solidariedade indispensável num momento daqueles. De recordar também as mensagens SMS recebidas por vários militantes durante o processo eleitoral interno, num apelo sub-reptício ao voto em Costa. Isto não se faz e não se esquece. O resto é história. Depois de derrubar um camarada internamente, porque não havia de derrubar também um partido ganhador, em 2015? Foi o que fez com a geringonça. Costa não esteve bem em nenhum desses processos, mas o PS como um todo também tem culpas no cartório. Veja-se como, até hoje, existem anticorpos a ASJ, como é o caso de Augusto Santos Silva, como se ele tivesse feito algum mal ao partido. Apenas pagou um preço alto pela sua integridade. Se for eleito primeiro-ministro (e espero sinceramente que seja), dará involuntariamente uma bofetada de luva branca num imenso PS, ainda que este o apoie.

Rui Figueiredo disse...

Soberba “langue de bois”

João Cabral disse...

Corrijo o lapso: se ASJ for eleito presidente (não primeiro-ministro), naturalmente.

Lúcio Ferro disse...

Seguro de "Esquerda". Hum. Ainda falta muito tempo mas se o candidato da abstenção violenta tiver mais do que 10 por cento prometo, em estando vivo , vir aqui dizer que sou um nabo total no que diz respeito a previsões políticas

Lúcio Ferro disse...

E outra coisa, se o PS apoiar oficialmente Seguro terá pois que assumir o resultado....

ematejoca disse...

Augusto Santos Silva não mostrou qualquer sentido de responsabilidade. Ele simplesmente compreendeu que se candidatasse às eleições presidenciais o resultado ainda era mais desastroso do que o resultado do PNS nas eleições legislativas. A maioria dos cidadãos portugueses não suporta a sua soberba. Até a maioria dos socialistas não tem por ele qualquer empatia. Provavelmente, o senhor embaixador não publicará o meu comentário. Who cares?
Pelo menos, fica a minha opinião sobre este tema expressa no comentário de João Cabral.

Seguro

António Vitorino e Augusto Santos Silva, o primeiro há dias, o segundo hoje, anunciaram não irem avançar com uma candidatura presidencial. S...