terça-feira, novembro 20, 2018

Observem!

Tem alguma graça olhar o modo como certos operadores mediáticos, criados e mantidos por investimentos puramente ideológicos, ruinosos nas cifras mas que esperam ser recompensados a prazo (cada vez mais longo, pelos vistos...) nas urnas, têm vindo a tratar, “com pinças”, a questão das touradas. Eles sabem bem que os seus aparelhos de proselitismo político caminham, neste domínio específico, por uma linha muito fina e delicada: a que é traçada entre o trauliteirismo ultramontano, aliado neste caso a um marialvismo transversal policrómico, e a imparável frescura mental de uma juventude que nem por se poder sentir conservadora noutros domínios consegue comungar já da simpatia por práticas que sente dizerem respeito a outros tempos, que inevitavelmente olha como meros resíduos de um primitivismo social que só a inércia e o tradicionalismo decadente ainda alimentam, mas que não deixarão, em tempo mais ou menos breve, de passar ao caixote do lixo da História. E como esses “outlets” do conservadorismo da paróquia vivem na angústia de não perder ambos os públicos-alvo, gizam um discurso equívoco, rebuscado na forma e ambíguo na opção de fundo. Que patuscos são! Eles observam, nós topamo-los bem!

segunda-feira, novembro 19, 2018

São Nicolau


É um santo estranho, S. Nicolau, que tanto é o protetor dos guardas-noturnos na Arménia (nunca lhes perguntámos, Luis Castro Mendes, nas nossas noites de trabalho em Yerevan), como serve de inspiração, nas festas Nicolinas, aos estudantes de Guimarães. Hoje, o santo “abençoou-me” uma bela refeição, na sua excelente adega - a “Adega de São Nicolau” - na Ribeira do Porto, onde, na sua nova encarnação, vim pela primeira vez, há bastantes anos, com o meu saudoso amigo “Kiko” Castro Neves. Estou certo que ele teria apreciado as costeletinhas de borrego (gostei que, com profissionalismo, me tivessem dito que as bochechas de porco precisariam de mais meia hora de cozinha) e, no fim, o doce de gila, acompanhado de dois “seminaristas”, coisa a que, na minha terra, se chama “jesuítas” - um “fine-tunning” doceiro em que a província esmaga as metrópoles.

E agora vou trabalhar, porque a boa vida é só para os reformados, e eu não sei o que isso é!

Selassie


O “Diário de Notícias” semanal (está cada vez melhor a edição dominical em papel e, um destes dias, inscrevo-me como assinante pago da edição digital diária) traz ontem esta fotografia do “venerando chefe de Estado”, Américo Tomaz, a receber, na Praça do Comércio, o “negus” da Etiópia, Heile Selassie.

Estava-se em julho de 1959. O governo de Salazar tinha, por essa altura, percebido já que a grande “vitória diplomática” da entrada de Portugal para a ONU, quatro anos antes, estava a “sair-lhe pela culatra”. As Nações Unidas passaram a ser uma espécie de tribunal no qual Portugal era, dia após dia, fustigado perante o mundo pela sua relutância em descolonizar, dando assim lastro aos movimentos independentistas que, em Angola (1961), na Guiné (1963) e Moçambique (1964), viriam a iniciar movimentos de guerrilha que se transformaram nas guerras coloniais que Portugal teve de suportar até 1974.

Trazer o imperador da Etiópia a Portugal, dando-lhe uma receção de Estado com todo o foguetório coreográfico que a ditadura conseguia mobilizar, era uma óbvia operação de “marketing” para tentar cativar um reconhecido líder africano. O tempo viria a provar que o sucesso da iniciativa não iria, contudo, ser muito.

Um “número” quase idêntico havia sido feito à soberana britânica (1957), num tempo em que o regime procurava preservar a tutela protetora do Reino Unido no plano internacional e ainda sonhava que poderia vir a mobilizar a “velha aliança” para as suas pretensões de se manter nas “possessões ultramarinas”.  Anos depois, aquando da invasão de Goa, Damão e Diu (1961) pela União Indiana, Londres deixou claro que não estava disponível para ir nesse caminho. 

Um ignoto e efémero presidente brasileiro, Café Filho (que herdou a presidência por morte de Getúlio Vargas) também já havia tido “restolho” protocolar similar (1955), antecedendo o que mais tarde também seria proporcionado a Juscelino Kubitschek (1960), sempre na tentativa de conservar o Brasil no apoio internacional à política colonial portuguesa. Em vão, como se iria ver, com a ditadura militar brasileira a desprezar as pretensões diplomáticas de Lisboa e a colocar o seu país, de forma permanente, ao lado de quantos, na ONU, se afastavam das políticas do regime salazarista. As duas ditaduras que então monopolizavam o espaço mundial da língua portuguesa nunca se entenderam muito bem.

No plano interno, a legitimidade do regime havia sido, entretanto, fortemente posta em causa nas eleições do verão de 1958, com a candidatura do general Humberto Delgado a provocar um abalo político que demoraria anos a ser digerido. Entre 12 de janeiro e 20 de abril de 1959, o general, temendo ser preso, esteve refugiado na embaixada brasileira em Lisboa, depois de obtido um polémico asilo diplomático. O caso de Delgado, que viria a ser assassinado mais tarde (1965), em Espanha, pela polícia política de Salazar, estava assim ainda muito fresco nesses dias de visita do imperador etíope. 

Nesses dias da visita do “negus” etíope, que a imagem do DN de ontem documenta, alguma imprensa internacional, seguramente adubada por setores oposicionistas portugueses, havia posto em causa a legitimidade de Américo Tomás em poder usar o título de presidente de Portugal, argumentando com a imensa fraude eleitoral que ferira de legalidade o sufrágio. O próprio Humberto Delgado, no Brasil, proclamava então ser o presidente a quem fora usurpado o cargo.

Foi nesse contexto que, aquando da visita do imperador, surgiu então uma anedota, como muitas que, nesses tempos de ditadura, emergiam como uma espécie de resistência “soft”, de denegrimento pelo humor, muito ao jeito do ambiente dos cafés da época. A “história” que se contava é que, ao receber o imperador etíope, no Cais das Colunas, Tomaz se teria apresentado dizendo: “Eu sou Américo Tomaz, presidente de Portugal”. O visitante, segundo a graça, ter-lhe-ia respondido: “Eu Selassié” - soando a “sei lá se é”...

Pequenas historietas de um tempo bem triste da nossa História.

domingo, novembro 18, 2018

A Manuel Alegre

Eu também não coloco os animais acima das pessoas, mas coloco o sofrimento dos animais acima do gozo de um espetáculo para pessoas.

sábado, novembro 17, 2018

Encontros de Cascais


Um belo debate, numa excelente iniciativa do “Expresso”, com muita gente nova, outros menos, muitas mulheres e uma organização exemplar. Foi assim que “ganhei” o meu sábado.

Loureiro dos Santos


Morreu Loureiro dos Santos, um militar de abril que fez incursões pela política, sem aí nunca ter deixado de ser, essencialmente, um brioso militar. Mais tarde, refletiu e publicou sobre aspetos estratégicos da nossa singularidade geopolítica, abordando também as mutações ocorridas, nas últimas décadas, na condição militar em Portugal.

Loureiro dos Santos foi um democrata, um esteio do “grupo dos nove”, que procurou contrariar a deriva radical da Revolução de abril. Exerceu funções políticas na área da Defesa Nacional, em governos de inspiração presidencial, onde sempre projetou uma perspetiva do modelo de transição que uma figura como Ramalho Eanes, de quem era muito próximo, procurou implementar no processo político-militar português. Loureiro dos Santos viria igualmente a assumir elevadas funções na hierarquia militar.

A falta que fazem personalidades como Loureiro dos Santos é melhor realçada pelo facto de, entretanto, não terem surgido muitas figuras militares a destacar-se na reflexão, com qualidade, sobre as temáticas da Estratégia e da reflexão geopolítica.

Sobre Loureiro dos Santos, leia-se, com vantagem, a excelente biografia que Luísa Meireles sobre ele publicou há poucos meses. É uma das melhores homenagens que lhe podemos fazer.

sexta-feira, novembro 16, 2018

Às armas?


Uma palavra pode fazer toda a diferença. Há dias, Emmanuel Macron disse o que não poderia ter dito: incluiu os Estados Unidos entre os adversários cuja existência poderia justificar a criação de um exército europeu. Trump reagiu e teve razão em fazê-lo: a França é um parceiro da NATO e, muito embora hoje seja tudo menos claro o que Washington quer fazer da organização que abertamente controla, nenhum cenário, por mais fantasista que seja, pode colocar a América do outro lado de uma qualquer trincheira oposta ao continente europeu. Quanto mais não seja por meridiano realismo, em termos de capacidades militares.

Macron tem no facto de ser um europeísta a sua maior qualidade. As propostas que fez, no sentido de um reforço institucional da governança da zona euro, foram muito ousadas e corajosas. Resta saber se, chegado a vias de facto, teria hipóteses de conseguir “vender” essas ideias a um país que já demonstrou, por mais de uma vez, que tem uma opinião pública e uma classe política bem mais recuada face à Europa do que as suas lideranças - recordo o fracasso da Comunidade Europeia de Defesa e o Tratado Constitucional Europeu, e também que foi por uma unha negra que Maastricht foi ali aceite.

A saída do Reino Unido vai deixar a França numa esplêndida solidão, no quadro integrado do continente, em matéria de capacidade militar, desde logo nuclear, bem como de afirmação política, no seio das Nações Unidas. Macron já percebeu que Paris tem aqui uma oportunidade soberana para se afirmar no centro de gravidade de uma Europa que, como é evidente para todos, pode ter de viver, por muitos e bons anos, bastante alheada do “amigo americano”, com o interesse em reconstruir uma parceria de novo tipo com o Reino Unido e que ainda não sabe o que vai fazer com Moscovo. A necessidade de uma dimensão europeia de defesa, quanto mais não seja “by default”, é algo que parece óbvio - embora me pergunte se falar em “exército europeu” não ajuda a espantar a caça.

Macron não está sozinho. Na terça-feira, Angela Merkel deu, no Parlamento Europeu, um claro sinal de querer ir a jogo. Em Berlim, vê-se Londres a afastar-se. Ecoando a ideia do “exército europeu”, Merkel terá querido dar, pelo menos, três sinais. E um silêncio.

Desde logo, pretendeu demonstrar que a narrativa alemã sobre segurança e defesa já não vive sob os velhos tabus. Isso vai-se sabendo, mas ela quis dizê-lo, uma vez mais. A Alemanha tem consciência de que, para servir de parceiro e contraponto à França, tem de pesar mais na Europa em termos militares. 

A chanceler também sabe que, para apaziguar as preocupações securitárias que adubam a fação mais conservadora do país, precisa de muscular a sua narrativa, quer em termos de defesa, por conta de inquietações internas face à deriva autoritária russa, quer nas questões de proteção da fronteira europeia comum e do sensível tema do asilo. 

Finalmente, Berlim quer deixar claro que partilhará a autoridade europeia com a França, o que é também um recado para os EUA, que começam a perceber que o “ticket” franco-alemão está para durar – e que a atitude de Trump pode a isso ter ajudado. 

Os discursos, porém, se são eloquentes no que dizem, também dão voz forte ao que silenciam: Merkel deixou em branco os apelos de Macron para a regulação da zona euro, nomeadamente o completar da União Bancária.

quinta-feira, novembro 15, 2018

De cernelha

Afinal, ficou confirmado que, lá pelo PS, existia, na clandestinidade, um núcleo de peões de brega. Os brasileiros têm a “bancada do boi”; nós tínhamos de subir a parada, criando a “bancada do toiro” (com “i” que é mais fino...) Saíram hoje do seu “burladero” ideológico, estavam afinal bem refugiados em tábuas, até que um citar poético lhes concedeu alguma praça. E aí romperam eles, ao toque de um qualquer inteligente que lhes soprou o passo doble, acolitados por uns moços de forcados, arribados pela direita (de onde havia de ser?), para tentar pegar, não de caras, mas de cernelha, a proposta do IVA. 

No final, aposto!, limpando as mãos à terra da praça, como podiam ter feito à parede, será por lá notado um rabejador qualquer. Mas que faena mais triste!

Indo eu, indo eu...


... a caminho de Viseu, já cheguei, neste belo fim de tarde, à capital portuguesa das rotundas. São 127, dizem! Venho por aqui debater a Grande Guerra, numa iniciativa da Câmara Municipal e da Liga dos Combatentes.

Durante muitos anos, quando as auto-estradas não ainda tinham reduzido o nosso trânsito pelas localidades servidas por estradas nacionais, Viseu foi, para mim, uma passagem obrigatória, nas longas viagens entre Lisboa e Vila Real, em tempos de Natal ou Páscoa. 

Se a jornada estivesse muito atrasada, parava-se para tomar “qualquer coisa” no Monte Branco, um café citadino então muito na moda. Se as horas chegassem, jantava-se no Cortiço (mais tarde, também no Trave Negra), com o Dom Zeferino a insistir para que provássemos uma aguardente “caseira”, o que nos preparava para o resto da jornada. É que, de Viseu a Vila Real era ainda um bom “esticão”, com uma estrada curvosa com frequente nevoeiro, por Castro Daire e dali, pela serra de Montemuro, até começar por descer por Lamego até à Régua. Recordo-me de jornadas noturnas de inverno, a ter de abrir frequentemente a porta do carro, para conseguir perceber o limite sa estrada. Nada que o bagaço do Dom Zeferino, nesses anos complacentes da antiga “Brigada de Trânsito”, não ajudasse a resolver... 

quarta-feira, novembro 14, 2018

Derrota pírrica


Quase tudo foi dito sobre as eleições intercalares americanas. Deixo apenas algumas breves notas sobre os resultados, tentando olhar em frente.

Trump foi derrotado. Para quem tinha as duas câmaras do Congresso e perdeu a maioria naquela onde é iniciado o essencial do processo legislativo – a Câmara dos Representantes – é evidente que se tratou de uma derrota. Esse desaire foi, contudo, atenuado: Trump não perdeu o controlo do Senado, onde teve mesmo alguns ganhos marginais e cujos integrantes são eleitos por seis anos (sendo um terço do órgão renovado a cada dois anos), pelo que, ao contrário do que é vulgar acontecer, esta eleição intercalar não resultou no ressurgimento global de uma onda oposicionista. Trump sai enfraquecido mas não tanto como ele próprio temeria e os adversários e comentadores considerariam plausível que pudesse ter acontecido.

Trump reforçou assim bastante as suas possibilidades de ser reeleito em 2020. A América, que pareceu inicialmente aturdida com o seu estilo, não o rejeitou, conferiu-lhe um voto de reticente confiança. Quem elegeu Trump não parece, no essencial, descontente com ele. Eliminada a possibilidade de vir a ser afastado do cargo por um processo de impedimento de funções – dado que o Senado, que continua a dominar, teria sempre a última palavra sobre isso – o presidente pode, contudo, vir agora a ser sujeito a um desgaste político contínuo, se o processo de suspeição sobre as suas relações com a Rússia vier a manter-se.

Percebe-se que Trump vive aqui um dilema. Se optar por afastar o investigador especial que trata do tema, cuja curiosidade se tem alargado a temas para ele tabu, como as contas familiares, o presidente tem consciência de que vai agravar um campo de batalha, que os adversários não deixarão de explorar à saciedade, assumindo-o como uma implícita admissão de culpabilidade. Se o processo de inquirição se prolongar, em termos que sejam credíveis aos olhos dos cidadãos, e se, de facto, começar a ser evidente que há algum fogo por detrás do fumo, a imagem de Trump pode vir a sofrer, com consequências daqui a dois anos.

Mas há uma persistente ilusão que não pode deixar de ser evidenciada. O mundo exterior vive mobilizado contra Trump à luz da atitude de uma América liberal que não representa o país. A CNN, as graças de Stephen Colbert ou os artigos do New York Times ou do Washington Post podem parecer-nos faróis de meridiano bom-senso, mas não espelham um sentimento forte que se vive nos EUA – e que tem tudo menos a ver com isso.

Para esse juízo valorativo, que as eleições refletiram bem, conta essencialmente o sentimento, real ou potencial, de bem-estar económico, adubado por uma retórica de defesa do interesse nacional que cai como sopa no mel em setores de opinião pública que já estão conquistados para a ideia de que o mundo tem sido injusto para com os EUA, de que os estrangeiros ou quem vem de fora são culpados pelos seus problemas de insegurança (pública, de emprego, de competitividade económica) e que olham com esperança para um líder que não tem vergonha de expressar alto os seus pensamentos, por mais primários que estes sejam.

Os EUA saem deste período muito mais divididos do que estavam. Se os democratas vierem a ser culpabilizados, por Trump e no juízo público, por eventuais bloqueios ao funcionamento da administração nos próximos dois anos, através da sua nova posição na Câmara de Representantes, arriscam-se a poder vir a ser penalizados politicamente. Pirro, segundo a História, ganhou uma batalha por um preço tão elevado que, afinal, lhe poderia custar perder a guerra. Resta saber se, a contrario, esta derrota de Trump não pode, no fim de contas, ser o pano de fundo que pode vir a facilitar a sua reeleição.

Falar claro


Sou um radical defensor da democracia representativa, de base parlamentar. Voto em partidos que apresentam programas com os quais me sinto em sintonia, compostos por pessoas que me merecem confiança, que escolhem deputados que geram governos e tomam por mim todas as decisões legislativas. Repito: todas! Não voto em referendos, que acho uma caricatura simplificadora da democracia.

No passado, cheguei a ter um "tropismo" parlamentarista, pensando que o chefe de Estado deveria ser eleito pelo Parlamento. Mas há muito que não tenho essa opinião. O essencial da minha posição de considerar a Assembleia da República o centro do nosso sistema político mantém-se, contudo, inabalável.

Quero com isto dizer que não favoreço qualquer ato que funcione como debilitador da função parlamentar, que não apoio a menor deriva presidencialista, que procuro reagir diariamente ao denegrimento com que se procura atingir ilegitimamente a instituição Assembleia da República, órgão que, aliás, nestes últimos anos, tem vindo a ser dirigido por uma das figuras públicas portuguesas que tenho por mais íntegras e impolutas, em toda a nossa recente história democrática.

Se estivéssemos num país anglo-saxónico, aos parágrafos anteriores seguir-se-ia o tradicional: "Having said that...". E é isso! Dito isto, acho lamentável que a Assembleia da República dê mostras de não querer autoimpor regras de estrito rigor ético e irrepreensível transparência cívica. Não se deve tomar a parte pelo todo? Claro que não! Mas não consigo admitir que, perante o espetáculo que alguns deputados dão (estranhas faltas, moradas falsas, mutismo no plenário, ligações profissionais perigosas, etc.), muitos assumam um ar quase ofendido, como se o seu estatuto os colocasse acima de qualquer crítica, numa prateleira dourada de aristocracia republicana.

A culpa deste estado de coisas é - chamemos as coisas pelos nomes - o compadrio corporativo que faz com que ninguém pareça querer o odioso de impor um extremo rigor na atitude. Os partidos políticos são, como é óbvio, os principais culpados, porque são eles que se inibem de sancionar e afastar quem prevarica, num "porreirismo" que, lá no fundo, assume como praticamente inevitável o que vai acontecendo, na lógica de que "nós, os portugueses, somos assim, que se há de fazer?". Ora os portugueses sabem muito bem o que deveria ser feito e, enquanto os partidos e a AR o não fizerem, vão tendo os nossos deputados na conta em que os têm, a qual, como se sabe, não é lá muito boa.

terça-feira, novembro 13, 2018

O Panteão


Há um ano, no Facebook e no Twitter, coloquei esta interrogação e esta fotografia:

Com o tempo, e com as incertezas da sabedoria que a idade nos traz, inquietamo-nos sobre a eventual justeza de certas opiniões pessoais. Seremos nós quem não está a ver bem as coisas? Aconteceu-me agora. Ajudem-me: acham mesmo normal que o jantar final do Web Summit tenha sido entre os túmulos do Panteão Nacional?”

Foi o bom e o bonito! O país caiu numa polémica bizarra, com o presidente e o primeiro-ministro a terem de se pronunciar. Eu, que tinha lançado, pela madrugada, uma pergunta que era, francamente, bastante inocente, tive rádios e televisões atrás de mim, como se tivessem caído o Carmo e a Trindade - ou, neste caso, Santa Engrácia. As redes sociais são hoje os pirómanos da informação.

Passou um ano, já ninguém se lembra do assunto. O país vive agora entretido com uma senhora que deu como presente um deputado que estava ausente. Ah! E com a prisão, que só peca por tardia, de um energúmeno do futebol. Até surgir um novo escândalo, que abafe o anterior. É assim a vida.

segunda-feira, novembro 12, 2018

Armistício


Foi hoje, ao final da tarde, na embaixada francesa em Lisboa. Os chefes das missões diplomáticas alemã e francesa organizaram uma interessante comemoração do Armistício que, fez hoje 100 anos, pôs termo à Grande Guerra de 1914 e 1918, que teve como principais protagonistas os seus países.

Há mais de meio século, num das minhas primeiras deslocações a França, fiz questão de ir a Compiègne, onde está a réplica do vagão onde, naquela data, foi assinado o Armistício. Local onde a perfídia hitleriana fez igualmente testemunhar, anos mais tarde, a rendição francesa. Nessa altura, visitei também o cemitério onde estão os mortos do Corpo Expedicionário Português, enviado para essa guerra. Voltei lá várias vezes como embaixador em França e foi, sempre, uma experiência tocante, que recomendo a quem o possa fazer.

As lições das guerras costumam perder-se com a passagem das gerações. Irei, aliás, falar disto, em Viseu, daqui a dias, numa iniciativa da respetiva Câmara Municipal e da Liga dos Combatentes.

Hoje, deixo a fotografia que, à saída da embaixada francesa, tirei dos bonés dos militares que comemoravam esta data.

domingo, novembro 11, 2018

Outono


Se não fossem as constipações, o outono era uma grande estação do ano.

sábado, novembro 10, 2018

A Rosa das Castanhas


Quem é de Lisboa não entende isto, com certeza. Quem tem raízes na província percebe melhor estas coisas. Vou tentar explicar.

Para um “expatriado” de uma localidade de província, que acabou por ter como destino de vida outras paragens, o episódico regresso às origens acarreta, quase sempre, uma espécie de ronda de “capelinhas”, de pessoas e lugares. É um “olá” que sublinha a manutenção do contacto, que preserva o vínculo essencial.

Vivo fora de Vila Real há mais de meio século. Em todas essas décadas, um regresso à cidade, por alguns dias, significa sempre um percurso de abraços, a familiares ou amigos, neste caso, por vezes, em casas comerciais. No passado, eram o Neves da pastelaria Pompeia, o Carvalho da drogaria da rua Direita (para não confundir com o irmão, que era proprietário de uma drogaria concorrente), o Zé Foquita da Galeria d’Artes, o Eduardo da papelaria, o Chico Alonso da casa de modas Real, o Fernando Choco da tabacaria, o Joaquim Mesquita da farmácia, o dr. Otílio da livraria Setentrião, o João Nascimento oculista, entre vários outros. Algumas pessoas vão mudando, os locais também. Nos tempos atuais, as pessoas e os locais são diferentes, mas o hábito mantém-se. Com imenso gosto, diga-se.

Hoje à tarde, chegado de Lisboa, ao passear pela cidade, neste inverno de S. Martinho, apeteceu-me comer castanhas assadas. Qual quê! Já não há castanhas assadas à venda, em nenhum lugar de Vila Real. Em vésperas de uma festa onde elas são fundamentais, senti essa falta. E foi então que me lembrei da Rosa das Castanhas.

A Rosa era empregada em minha casa quando nasci. Ficou amiga eterna da minha família. Tinha uma pequena casa comercial perto do largo de S. Pedro e, em toda a sua vida, sempre me lembro de passar por lá, quando ia a Vila Real, para cumprimentá-la. A partir de certa altura, quando me sabia na cidade, tinha por hábito mandar-me a casa salpicões, chouriços e alheiras. Para travar estes acessos regulares de escusada generosidade, passei a visitá-la apenas no último dia das minhas passagens pela cidade, avisando-a de que partiria de seguida, o que a deixava desolada. Grande Rosa! 

A Rosa, que morreu já há uns bons anos, tinha uma conhecida conflitualidade com uma cesteira que operava na esquina em frente. Às vezes, passando ali perto, “por dá cá aquela palha”, era possível ouvir as duas senhoras num curioso “diálogo” indireto, nunca falando uma para a outra, mas ambas clamando, em voz bem alta, para serem ouvidas do outro lado, coisas frequentemente pouco amáveis, de que eram mutuamente destinatárias. Parecia um teatro...

Ah! E a Rosa vendia castanhas, pelo que era conhecida, na cidade, como a Rosa das Castanhas. E a verdade é que, amanhã, dia de S. Martinho, não há em Vila Real onde comprá-las, quentes e boas. Essa é que é essa! Também por isso, mas não só por isso, vou sentir falta da Rosa das Castanhas.

(Nota: dedico esta nota a um conterrâneo que hoje cruzei na Tosta Fina e que me revelou ser leitor atento destes escritos sobre Vila Real)

sexta-feira, novembro 09, 2018

Marcelo

É pena que o país não revele mais orgulho pela excelente imagem que o nosso presidente da República deu ao mundo, na sua intervenção na Websummit. Interrogo-me sobre os Estados em que o respetivo titular seria capaz de ter uma prestação idêntica.

E eu não votei nele, note-se! 

Necessidades


Ontem, vi na net imagens da tomada de posse de vários diplomatas, homens e muitas mulheres, em cargos dirigentes do Ministério dos Negócios Estrangeiros. E fiquei intimamente muito satisfeito por neles ter encontrado diversos profissionais que, no passado, tive o gosto de chefiar, em funções muito diversas. Dá-me prazer pensar que alguma coisa eles terão levado de positivo desses tempos, que às vezes não foram nada fáceis, da mesma forma que eu pude beneficiar do seu trabalho e dedicação.

Quem me conhece - como essas pessoas conhecem - sabe que não sou de alimentar “grupos” ou “discípulos”, que não reuno com “equipas” do passado, que sou avesso a praticar o “networking” profissional, que não ando pelos corredores das Necessidades “à la recherche du temps perdu”. Mas eles também sabem, como meus amigos que todos ficaram, que fico muito agradado com o seu sucesso.

quinta-feira, novembro 08, 2018

O mundo avança

Há algumas décadas, as sufragistas eram consideradas umas tolinhas por lutarem pelo voto feminino. Há não muitos anos, Ribeiro Telles era visto como um lunático por tentar colocar na agenda política as questões ambientais. Há três anos, muita gente sorriu, condescendente, ao ver o PAN entrar na Assembleia da República. O que dirão no futuro?

Viseu celebra o Armistício



Celebrando o centenário do Armistício, que pôs termo à I Guerra Mundial, município de Viseu e a Liga dos Combatentes promovem um diversificado programa de eventos.

Nesse âmbito, no dia 16 de novembro, pelas 15 horas, no auditório do Instituto Politécnico de Viseu, falarei sobre "O mundo depois da Grande Guerra - as ilusões e as crises".

Os reinos vistos pela diplomacia

José de Bouza Serrano, embaixador, editou na "Esfera dos Livros" uma obra intitulada "As famílias reais dos nossos dias - tradição e realidade".

Tenho a meu cargo a tarefa de apresentar o livro, pelas 18.30 do próximo dia 27 de novembro

Fora da História

Seria melhor um governo constituído por alguns nomes que foram aventados nos últimos dias mas que, afinal, acabaram por não integrar as esco...