sexta-feira, dezembro 02, 2016

Na despedida de Fidel

Acho estranho que quantos por cá ainda hoje se obstinam em defender a herança política de Fidel não consigam entender que muitos só toleraram o caráter ditatorial do regime cubano enquanto vivíamos num mundo bipolar, em que as ditaduras de direita eram estrategicamente protegidas, numa lógica anticomunista.

Desde que esse mundo acabou, que sentido tem defender a existência de um regime de partido único, sem uma única voz dissonante no parlamento, sem imprensa livre e com a dissidência a ser motivo para detenção imediata? E não deve haver nada mais parecido com uma prisão política de uma ditadura de direita do que uma prisão política de um regime que se afirme de esquerda.

10 comentários:

Joaquim de Freitas disse...

Oh Senhor Embaixador, O Senhor, que conhece muito melhor que eu o que se passou nos bastidores da Revolução Portuguesa, de 1975, (eu estava no estrangeiro), pensa realmente que aquela gente “patriota” que traçou a um certo momento uma fronteira ideológica entre o Norte e o Sul, a partir de Rio Maior, dizendo claramente que para Sul não era Portugal, assaltando e destruindo as permanências e as sedes do PCP, e por vezes mesmo do PS, em Braga e outras localidades, pensa realmente que seriam capazes de aceitar uma Revolução com cores mais “vivas” que as que finalmente tomaram o poder em Portugal?

Claro que não. Também é certo que os Portugueses, após cinquenta anos de forte contaminação religiosa e fascista, de pobreza e miséria, de analfabetismo e obscurantismo, de pouca ou nenhuma educação cívica e política, eram incapazes de tomar o caminho verdadeiramente revolucionário, que supunha reformas de fundo, e não só agrárias, mas uma refundação duma Nação com valores outros que os aplicados.

A única medida corajosa da Revolução foi de terminar a guerra colonialista, que sugava o sangue de Portugal, e impedia de alinhar ao lado das Nações democráticas, concedendo a liberdade na independência, àqueles que colonizou durante quatro séculos. E sem dúvida, de ter trazido a Liberdade aos Portugueses.

Mas quem aproveitou mais da Liberdade? A falta de medidas mais corajosas, deu o resultado que vemos hoje: - Portugal continua na classificação mais injuriosa, na cauda da Europa, e se não fosse o espaço Shengen, e graças à Revolução, que abriu as fronteiras da Europa aos corajosos jovens que partiram ao assalto do mercado do trabalho no estrangeiro, a situação seria ainda mais desastrosa. E pena é, porque os Portugueses têm qualidades de trabalho e coragem que podiam fazer muito bem a Portugal.

Fidel Castro cometeu erros de gestão enormes. Como Chavez. Mas ninguém lhe pode retirar o mérito de ter lutado contra o Império, durante meio século, e de ter conquistado para o povo Cubano a dignidade e a soberania, com a excepção de Guantanamo. Na pobreza, certo, mas na dignidade, apesar dos inimigos que o cercam de todos os lados.

A linha de demarcação de Rio Maior, para os Cubanos, situa-se em Miami. Com uma diferença fundamental: Se a Revolução Portuguesa, podia ver ao longe a esquadra americana para lá de Cascais, presente mas sem intervir directamente, a revolução Cubana viu a logo desembarcar na Baia dos Porcos. E nunca foi para mais longe que Miami.

Francisco Tavares disse...

Parece-me muito bem. Mas ser um pouco mais "abrangente" no texto não seria assim tão incorreto caro Embaixador. É que estamos a falar de uma ilha que foi sujeita a todo o tipo de "castigos" pela nação mais poderosa (ainda) do mundo, por acaso, seu vizinho. Mesmo depois do chamado fim da guerra fria. Porque não recordar o longo historial de terrorismo dos EUA, que também incluiu Cuba? Ou já se esqueceram do avião de passageiros de 6 de Outubro de 1976 (voo 455), a maioria jovens? E se falamos de democracia, que democracia é essa que permite que os seus governantes façam "coisas" como o que fizeram no derrube de Allende no Chile em 1973? Ou como fizeram em 2004 com o derrube no Haiti do presidente legitimamente eleito? E em 2009 nas Honduras? E em 2013 na Guatemala? Para não falar já dessa democracia que permite a destruição de grande parte do Norte de África (vd. Iraque, Líbia) e agora a Síria. Essa democracia, a dos EUA, onde se assiste diariamente a racismo puro e duro, pena de morte. E agora a 46 milhões dos seus habitantes que têm de recorrer a senhas de racionamento para sobreviverem (pode ser consultado no site do Supplemental Nutrition Assistance Program 'participation and costs'). O que não quer dizer que Cuba não possa e deva evoluir para um regime democrático, mas com um vizinho destes convém prevenir-se............o que Fidel fez, a bem do povo de Cuba.

Francisco Tavares disse...

Ainda sobre o suplemento alimentar a 46 milhões de estado-unidenses: tanto falavam das senhas de racionamento em Cuba e, agora, na Venezuela....................

Anónimo disse...

O PC diz que Fidel não deve ser considerado ditador. Salazar e Pinochet também não.

Francisco Tavares disse...

Ainda: "A revolução é uma ideia, não um compromisso. Esse país [antes de Fidel] era uma reverenda merda, não servia para nada. Quando chegou Fidel triunfou e converteu um país de chachada, de prostitutas, de vigaristas e de americanos em uma das nações mais importantes do mundo. As pessoas tiveram escolas, educação, todos esses universitários saíram da revolução"........."Havia leis nos Estados Unidos que permitiam que se matasse os homossexuais. Quantos homossexuais foram queimados em Espanha? Todos os países têm problemas. Trato de compreender as coisas." ... Norberto Fuentes dixit (entrevista em 28/11/2016 à cadeia COPE). Norberto Fuentes é um conhecido dissidente cubano.

Joaquim de Freitas disse...

Pobres argumentos…

« Nao sou antiCubano, sou antiCastrista, respondeu-me alguém num fórum…

Em 30 anos, nunca vi um antiCastrista levantar um dedo contra o embargo de Cuba aplicado pelos EUA, que faz mal a toda a população. Preferem evitar o tema e/ou pretender que é uma desculpa do governo. Há mesmo alguns que se regalam à ideia que o embargo possa arruinar o país para justificar, à contrário, o seu antiCastrisme.

Nunca vi um antiCastrista protestar contra os 3 000 atentados contra Cuba ‘ e mais ou menos o mesmo número de vítimas).

Nunca vi um antiCastrista protestar contra o asilo oferecido a Posada Carriles, em Miami, que fez explodir um avião civil cubano em pleno voo. Nunca vi um antiCastrista fazer o mínimo em favor do povo cubano, excepto para debitar o seu antiCastrismo em todas as formas.


alvaro silva disse...

Será que ele morreu mesmo? Quem viu o cadáver que "levante o dedo". Ou estamos perante uma saga semelhante á doutro sanguinário ditador , Hitler de seu nome de quem também ninguém o viu o cadaver. De Salazar, de Franco, do Chavez, de Mao, Estaline, Lenine Ou Mussolini todos viram o corpo e o respectivo ataúde. Do Fidel..... Nikles!

Anónimo disse...

Castro foi um ditador exemplar, que deixou como legado milhares de fuzilados no paredão de Havana, isto é um dado factual que não se pode negar. Os dissidentes que ousaram contestá-lo ou foram assassinados ou encarcerados.

Cuba tinha um sistema de saúde bastante desenvolvido antes da revolução castrista, a partir daí até hoje foi uma queda acelerada, com um aumento brutal da mortalidade infantil é uma diminuição da qualidade dos cuidados de saúde.

A Cuba castrista não é mais do que um dos países mais miseráveis do mundo.

Esperemos que seja possível a curto prazo permitir a instituição da liberdade em Cuba e o fim do pesadelo.

Castro deixa atrás de si apenas um rastro de sangue e d miséria.

Joaquim de Freitas disse...


Quando a ignorância e a desinformação chegam a este nível, no país onde nasci, tenho legitimas preocupações para o seu futuro. Eu sei que o passado é difícil e pesado a suportar, mas tanto, é demais. Pobre terra minha…

Joaquim de Freitas disse...

O blogue do Senhor Embaixador é um barómetro da moral, entre aqueles que saboreiam a morte de Fidel e os que o choram.
Cada um dá a sua opinião, o que é muito bem, mas sente-se bem que é difícil de ser objectivo e razoável com um tal personagem. Quem pode medir e como, o bem e o mal? Como apreciar o traço que ele deixa na História do planeta?

Cuba pertence aos Cubanos e eles serão os únicos que conseguirão fazer o balanço e tirar conclusões, mas, para nós, que não vivemos em Cuba, basta observar friamente os que choram o os que saboreiam no mundo para compreender o que é a Revolução cubana e o seu líder.

Em França, por exemplo, ouve-se e lê-se aqui e lá, a elite bem pensante de pseudos jornalistas totalmente desligados da realidade dos seus próprios povos que se permitem julgar e consolar o pobre pequeno povo cubano que não soube livrar-se do tirano.

Os filósofos autoproclamados que escrevem no ” Le Monde “sobre as violências do regime castrista nos anos sessenta quando a França torturava e matava milhares de argelinos.
Ou aqueles, mais tristes ainda, que sobre youtube se querem fazer testemunhas da verdade histórica, apoiando-se sobre anedotas de viagem.

Mas estes são menos virulentos que os anti comunistas primários que no “Fígaro” gostam de comparar Castro a Hitler ou que aceitam os testemunhos de descendentes de latifundistas expropriados pela revolução. Também os houve em Portugal…

Nos Estados Unidos, a direita e a extrema-direita clamam vitória, enfim, o tempo tendo conseguido o que eles tantas vezes fracassaram e durante tanto tempo.

Imaginemos as pipas de champanhe bebido pelos mafiosos e os delinquentes de Miami, incluindo aquele exilado que fez caiar um avião civil cubano, ou nos gabinetes do Mossad e da CIA que nunca conseguiram apanhar Fidel.

Mesmo o Sebastian Pinera , antigo presidente do Chile, que em 1998 reclamava a libertação e o regresso (do seu « estágio » forçado e “atormentado” em Londres !) do ex-presidente Pinochet, que tomava o chà com Thatcher,e que nos fala agora da herança sangrenta de Fidel… E preciso ter lata..esta direita reaccionária da América Latina;

Em contrapartida há os que choram, que se recordam. As populações negras da África do Sul e de Angola, quando o Ocidente fechava os olhos ao apartheid, os Cubanos vinham ajuda-los.

Compreende-se a amizade de Mandela, e dos Palestinianos, mas também os haitianos, os nicaraguanos, dezenas de países do terço mundo quie quando sofriam catástrofes naturais viam desembarcar centenas de médicos cubanos.
E os resistentes às ditaduras da direitalha da América Latina, que procuravam asilo em Cuba.

E os sonhadores e utópicos que viam em Fidel e em Cuba um modelo e a possibilidade de um mundo melhor.

Cuba, desde 1959, esteve do lado dos oprimidos e da moral.

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