sexta-feira, agosto 14, 2015

As mulheres e a diplomacia

O jornal "O Sol" tem hoje um artigo com uma nota de estranheza pelo facto muitas das mulheres que concorrem ao exame em curso de acesso à diplomacia terem, de forma esmagadora, sido eliminadas na prova de cultura geral. Para além das habituais teorias (estúpidas!) da conspiração, importaria, de facto, tentar perceber a razão objetiva deste resultado. Serão as mulheres, em geral, menos conhecedoras das coisas da cultura comum do que os homens? Não sei responder e disse isso mesmo ao jornal.

A diplomacia abriu-se às mulheres, pela primeira vez, em 1975, no concurso em que eu próprio entrei para a carreira. Depois disso, o êxito masculino nos diversos concursos, foi quase sempre predominante. Curiosamente, num júri de que fiz parte, 20 anos mais tarde, em 1995, foram admitidas mais mulheres do que homens. E, neste ano de 2015, mais 20 anos decorridos, estou a coordenar um curso de preparação para o concurso. Dentre os alunos que foram selecionados até agora, as mulheres estão em grande maioria...

O artigo de "O Sol" tem uma falha importante. O título é "Elas não servem para diplomatas?" Talvez valesse a pena lembrar que a Secretária-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, uma embaixadora que é a figura mais elevada da hierarquia da carreira, é uma mulher... O artigo ficaria mais equilibrado se lembrasse isso, não acham?

10 comentários:

Jose Martins disse...

Senhor Embaixador,
Na minha, mais ou menos longa carreira de manga de alpaca, apenas servi uma senhora diplomata e na sua primeira missão no estrangeiro e sem conhecimento sobre o meio de Banguecoque.
Isto aconteceu em meados de setembro de 1997. Chefe de missão estava de férias em Portugal, quando de surpreza foi recebido um telegrama do Palácio das Necessidades que o ministro das Finanças, falecido, Sousa Franco, com uma pequena comitiva (onde incluído o Dr. Antunes Ferreira) vinha a Banguecoque participar na Reunião Ministerial Ásia-Europa.
A senhora ficou assustadíssima, como Encarregada de Negócios e natural, logo na sua 1ª missão a visita de um ministro, mas desde logo a sosseguei que tudo iria correr pelo melhor, dado que eu estava familiarizado com este género de visitas de individualidades do Governo Português já por vários anos.
A senhora com alguma humildade (coisa rara nos números 2 diplomatas) seguiu o meu conselho e a visita do ministro Sousa Franco correu pelo melhor.
Apenas um precalço foi de que a pier onde o avião iria parcar, foi trocado à última hora e tivemos os dois de correr pelo longo corredor até chegarmos à pier da Sala VIP, onde tinha acabado de chegar o ministro Sousa Franco, já sentado e sua comitiva, havia escassos minutos.
A senhora diplomata e a única que eu servi, como número 2, foi uma pessoa simpática e desempenhou a sua missão perfeitamente.
Saudações de Banguecoque

Anónimo disse...

Há tempos, por aqui, Seixas da Costa lembrava como sempre teve muitas mulheres em redor, designadamente nos postos e dossiês europeus.

Se se seguisse o olho sexista do autor da peça do Sol era caso para dizer que - com tão mau resultado apresentado - se calhar a porcaria de Europa que criaram prova que não servem, de facto, para a diplomacia. Nem elas, nem o Seixas, nem quem os supervisionava.

Anónimo disse...

O Sol está ao nível do Correio da manhã. A imagem que ambos possuem é abaixo de cão. Mas fez bem a Associação Sindical dos Diplomtas Portugueses esclarecer esta situação junto desse "jornal".

Anónimo disse...

Informar isso não equilibraria grande coisa; seria apenas a excepção que confirma a regra.. É um mundo masculino. Seria melhor que se assumissem de vez todas as particularidades da carreira diplomática, que a faz diferenciar-se do resto das carreiras da função pública.

Francisco Seixas da Costa disse...

Para quem saiba pouco sobre o acesso à diplomacia e as exigências da carreira, aconselho que leia isto: http://duas-ou-tres.blogspot.pt/2015/06/uma-carreira-diferente.html

Anónimo disse...

Oh Anónimo das 16:01,
Está redondamente enganado! A Carreira Diplomática NÃO é um mundo masculino. Foi, sim, ao tempo da Ditadura Salarazista. Hoje, há inúmeras mulheres na Carreira, a exercer funções de relevo, quer nos Serviços Internos, quer nos Externos, como Embaixadoras, ou Cônsules. Sucede que, por vezes, em determinadas ocasiões, há concursos de ingresso em que o sexo masculino predomina e noutros acontece o exactamente o contrário. Nada tem de extraordinário. Quem concorre são pessoas, que, por qualquer razão, ou estão menos preparadas para aqueles exames, ou menos interessadas, enquanto outras estão mais. Hoje são mulheres, amanhã homens. No MNE não existe descriminação sexual. É algo absolutamente impensável! Nestas coisas, o melhor é não falar do que não se sabe. O artigo do Sol é uma porcaria. O que, aliás, não nos deve surpreender, vindo de quem vem. E como muito bem disse o autor deste Blogue, o mais alto lugar da Carreira Diplomática é exercido por uma mulher, no desempenho das funções de Secretária-Geral do MNE.
Não é forçando a entrada de mulheres, só para equilibrar a balança, que se obtém qualidade de quem vai, no futuro, desempenhar lugares de destaque no MNE, é sendo exigente nas provas de avaliação. Ingressa na Carreira quem tem melhores qualificações. Assim deve ser o parâmetro, não olhando aos sexos dos concorrentes. Pode muito bem suceder e porque não que num próximo concurso só entrem mulheres. E então o que diria essa "página de imprensa", o Sol? Por mim, não diria nada. Olho para os resultados e vejo: foram admitidos tantos adidos. Agora se são do sexo masculino, ou feminino, é irrelevante. Ninguém no MNE tem, ou teve alguma vez, a menor intenção de limitar o acesso das mulheres à Carreira.
a)Rilvas

Majo disse...

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~ Gostei de saber. ~
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Jose Martins disse...

Senhor Embaixador,
Respondo ao anónimo das 22.07
Claro que no tempo da Ditadura Salazarista a mulher em Portugal, ainda não tinha chegado à emancipação e mais para as lides de casa, tratar do marido e da preparação dos filhos.
Porém nessa altura havia cultura diplomática, séria e grandes embaixadores, portugueses, espalhados pelos 4 cantos do mundo.
Evidentemente de que nas Necessidades não existe descriminação sexual, mas existe, encoberto, o compadrio que muitos diplomatas que por lá andam a polir o fundo das cadeiras só pela influência de cunhas entrou no palácio e partiu para missões no estrangeiro que mais não foi do que fazer turismo.
Algumas mulheres diplomatas são excelentes profissionais, ambiciosas, dedicadas e de bom relacionamento com o pessoal menor.
Enquanto certos homens ao iniciarem a carreira, profissionalmente, são de uma tristeza infinita, que cheguei a dizer para os meus botões: “estes só entraram para a carreira diplomática de empurrão!”
O Palácio das Necessidades, depois das senhoras diplomatas tem muita senhora, funcionária, sem o estatuto de carreira, no serviço interno como no externo.
No meu tempo e quando ainda longe estavam as novas tecnologias de comunicação, tudo que saía para o exterior e entrava nas Necessidades era atravéz do fax e decifrado pela máquina, eram mulheres, funcionárias, que habilmente e com mestria operavam com esses intrincados objectos de comunicação.
Acredito (eu velho funcionário da mó de baixo do MNE) que as mulheres, no futuro, na carreira diplomata passarão as palhetas aos colegas “peneirentos” do sexo masculino.
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O jornal Sol é igual a outros “pasquins” necessita de vender papel com letras para governar o barco.
Saudações de Banguecoque

Anónimo disse...

José Martins tem a mesma mentalidade do Sol, um sexismo paternalista assente nas presumíveis diferenças em vez de na igualdade de género. Um barrete para a verdadeira igualdade.

Anónimo disse...

O Senhor Embaixador tem razão quando diz que no concurso de 95 ( o meu, por sinal) foram admitidas mais mulheres do que homens, se considerar admitidas como sinónimo de entrar efetivamente em funções/ sido confirmadas ( 20, contra 19 homens). No entanto, o número de homens e mulheres aprovados naquele concurso foi exatamente o mesmo ( 20/20). Acontece que um dos homens desistiu da carreira antes da confirmação ( curiosamente, voltou a candidatar-se, e a ser novamente admitido, dois concursos depois, e hoje é conselheiro de embaixada). Mas não há dúvidas que este fenómeno recente da disparidade é realmente intrigante e pouco simpático. Naturalmente, são absurdas quaisquer teorias da conspiração, até porque a prova que tem mais desproporcionalmente eliminado mulheres é a de conhecimentos gerais, uma prova de escolhas múltiplas, corrigida por uma máquina que não conhece a identidade ou o sexo do/a candidato/a.

Com os melhores cumprimentos e toda a consideração,

Luís Quartin Graça

Os EUA, a ONU e Gaza

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