terça-feira, dezembro 17, 2013

Norte-Sul

No termo de janeiro de 2014, completarei um ano na direção do Centro Norte-Sul do Conselho da Europa. Foi uma experiência muito interessante, sem o menor encargo financeiro para ninguém (o meu trabalho foi "pro bono", desde a primeira hora), na chefia de uma estrutura que vai completar quase um quarto de século, desde sua criação. O Centro passa por um tempo de reflexão sobre o seu papel no quadro do Conselho da Europa, depois de alguns debates que se iniciaram antes da minha chegada. Os próximos dois anos serão essenciais para o desenho desse futuro.

O balanço da ação do Centro Norte-Sul é, a meu ver, muito mais do que simplesmente positivo. Ao longo destes anos, com diversos diretores e centenas de pessoas que passaram pelos seus quadros, o Centro revelou-se um excecional mobilizador de vontades, dispondo hoje de uma rede de contactos que é dificilmente substituível, no âmbito da atividade externa do Conselho da Europa. Isso aconselha a que o Centro, de forma cada vez mais integrada, responda como uma estrutura de relevo no âmbito da "política de vizinhança" da sua organização-mãe.

Mas faz o quê? esse Centro, perguntar-se-á o leitor menos atento. Ao longo dos anos, o Centro tem vindo a ser a "janela" do Conselho da Europa para o Sul. Num primeiro tempo, competiu-lhe "explicar" o Sul às opiniões públicas do Norte, sublinhando a importância da solidariedade à escala global, as relações de interdependência no mundo, as responsabilidades coletivas face às situações de desequilíbrio e desigualdade entre os povos. Com a passagem dos anos, o Centro voltou-se mais para esse próprio Sul e procurou ser útil, no seu seio, à construção de uma consciência democrática, à aculturação de um corpo muito vasto de direitos, dando como referente - mas não como "benchmark" impositivo - o trabalho magnífico que, desde 1949, o Conselho da Europa foi desenvolvendo, num universo que hoje envolve 47 países.

Hoje em dia, o centro Norte-Sul, utilizando o diálogo intercultural como instrumento de trabalho, promove ações ligadas à chamada educação global, ao reforço da cidadania democrática, ao apoio à organização e estruturação da sociedade civil, nomeadamente nos países do Magrebe, onde tem vindo a concentrar o essencial das suas ações. Os "alvos" prioritários atuais do trabalho do Centro são os jovens e as mulheres, procurando destacar e apoiar o seu papel nas muito diversas sociedades em que se inserem, tentando que governos, parlamentos e autoridades regionais e locais estabeleçam, por seu intermédio, com as estruturas da sociedade civil, uma relação institucionalizada cada vez mais eficaz.

Ontem, à volta de um almoço de Natal, esteve toda a nossa jovem, entusiasmada e muito feminina equipa. Desejei-lhes um ano de 2014 feliz e produtivo. A partir do final do próximo mês de janeiro, esse percurso vai ser prosseguido sob a orientação de um outro diretor. O meu mandato de um ano terminou e, infelizmente, não tenho disponibilidade pessoal para o renovar. Mas foi, como acima disse, uma bela experiência. Deixo no Centro bons amigos e não tenciono perder de vista a sua atividade no futuro.

16 comentários:

Isabel Seixas disse...

"o diálogo intercultural como instrumento de trabalho, promove ações ligadas à chamada educação global, ao reforço da cidadania democrática,"

Sem dúvida um trabalho meritório o do Centro Norte-Sul e mais uma experiência enriquecedora para Si sr. Embaixador, que soma e segue...

Anónimo disse...

Pelo que se lê nos jornais terá isso a ver com qualquer aventura política?

Anónimo disse...

Ao Norte, circunspecto e austero, é necessário fazer ver que a solidariedade é investimento e ao Sul que a austeridade é necessária se queremos ser solidários. Interessante a referência ao benchmark “impositivo” que terá a ver com o cuidado de não impor os regimes democráticos “tout court” no sul… (e.g. ex colónias)…
Excelente o objetivo do Centro e o importantíssimo cargo de V. Exa que nos orgulha!
(Desculpe lá! Que comparação com o andar a medir filas de camiões e contentores de laranjas…)
antonio pa

Defreitas disse...

Deve ter sido um ano excitante para o Senhor Embaixador, mas deve ter sido também necessário muita força de carácter para conservar a esperança no futuro perante as dificuldades que os países do sul enfrentam. Tenho uma grande admiração por aqueles que se dedicam à imensa tarefa de estreitar os laços entre o Norte e o Sul, na medida em que a globalização porta nela uma desigualdade que torna a cooperação mais difícil todos os dias. pelo menos, como a vejo.

Os países do Sul são submetidos ao julgamento sem apelo dos mercados com uma vulnerabilidade visível a partir de Portugal , onde a situação é particularmente grave. A diferença dos níveis de vida é tal que as consequências humanas podem ser irremediáveis. A "evaporação" da juventude portuguesa e doutros países do Sul absorvidos pelo Norte, é uma das consequências do desequilíbrio actual.
Será uma geração perdida?

A este desequilíbrio se acrescenta a angustia do futuro. O êxodo maciço dos países do Magreb é um sintoma da falta de confiança.
Quantos países do Norte, Senhor Embaixador, têm realmente uma politica africana? O Senhor conhece melhor que eu o problema, mas a constatação que faço da desigualdade do mundo , a miséria que aflige os países do Sul, num mundo que nunca foi tão rico, tem a sua tradução politica : as primaveras que florissem e murcham rapidamente e a recusa das desigualdades que reúne hoje os manifestantes do Norte e do Sul .

No "bilan" do Senhor Embaixador não consta nenhuma reflexão sobre um aspecto que me parece importante nos tempos que vivemos que é o da religião, que afecta as relações entre o Norte e o Sul . Mas talvez este aspecto das relações Norte Sul não faça parte do programa do Centro.

Anónimo disse...

Se é certo que ninguém é insubstituível, a sua saída da direcção do Centro Norte-Sul será certamente uma grande perda para esta instituição. Lamento que não possa continuar esse trabalho, que além de muito útil deveria também ser muito agradável e cómodo, para mais instalado num belo palacete a dois passos de sua casa.
Mas fica-nos a certeza de que, quaisquer que sejam as suas próximas actividades, o Senhor Embaixador será sempre uma grande mais-valia para os objectivos que lhe caberão prosseguir.

Anónimo disse...

Acredito na sua boa vontade-diálogo-Norte-Sul.

Os tempos que vão correndo, demonstram que devido a "excessos religiosos" do dito Mediterrâneo do Sul, típicos da Idade Média Ocidental, passarão muitos décadas sem que a evolução intelectual, independente das tecnologias, consiga caminhar para um status quo eqilibrado, entre religião e poder único ou democrático.

Alexandre

Anónimo disse...

Vai-me desculpar o senhor Embaixador, mas continuo sem perceber o que faz essa entidade/organização/grupo. Percebi que "sensibiliza"...

Anónimo disse...

De facto, os tempos estão menos para coisas "pro bono" do que para outras...

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro António PA: as tarefas da vida profissional de cada um têm muitas faces. Nenhuma é mais digna que a outra. São diferentes.

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Defreitas: o diálogo interreligioso é uma das dimensões do diálogo intercultural. E está no eixo das preocupações do Centro Norte-Sul. Leia aqui: http://duas-ou-tres.blogspot.pt/2013/08/palestras-e-conferencias.html

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Anónimo das 10.44: obrigado pelas suas palavras. Faz-se o que se pode...

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Anónimo das 13.02: se colocar no Google a sua questão ela será respondida. Veja o site do CNS

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Anónimo das 16.04: vou continuar a fazer o que já fazia (coisas pagas e outras não pagas) e, para sua ilustração, vou envolver-me em outras atividades... "pro bono"! E esta, ein!?

Anónimo disse...

Portugal, Sul para o Norte, Norte para o Sul. Um total desnorte, esta esquizofrenia tão portuguesa de não se saber exatamente aonde pertencemos.
Neste momento, o Sul quer um novo Norte, o Norte receia o novo Sul, e Portugal tem cada vez mais um "Sul", muito populoso, e um "Norte", arisco, a querer cada vez mais por menos (que boa era a vida de Lisboa).
O nosso "Norte" já fala com sotaque arrastado "rrrr".
Por enquanto, e apesar de tudo, o Sul ainda nos considera confiáveis, parecidos ou irmãos. Têm-nos desculpado alguns disparates, como os amigos nos desculpam um ou outro deslize.
Mas a paciência tem limites e o mapa do Bernardo Pires de Lima tem muito que se lhe diga.

patricio branco disse...

há que fazer render ao maximo esses organismos que têm o seu bom papel mas por vezes estão um pouco marginalizados, ou esquecidos, etc, bom trabalho pois...

Anónimo disse...

É uma má notícia. Com uma nova composição da Assembleia Geral da Associação Sindical dos Diplomatas que deixa muito a desejar e que integra o pior do gamismo, com o site Notas Verbais em hibernação por motivos Mais-que-duvidosos, espera-se sinceramente que não venha a seguir a notícia da passagem à disponibilidade de Duas ou três coisas, a última réstea, o derradeiro sopro de liberdade no mundo concentracionário da diplomacia. Oremos.

Ainda Caminha

Foi um par de horas de conversa, na tarde de sábado, na Biblioteca Municipal de Caminha, tendo como anfitriã a vereadora da Educação, dra. L...