sexta-feira, julho 12, 2013

Diplomacias

"E agora, como vai ser?" É uma sensação curiosa estar do "lado de cá", quando os embaixadores estrangeiros nos colocam esta questão, entre divertidos - não é o país deles... - e intrigados, perante a complexidade da situação política portuguesa.

Ontem, com esta ou outra formulação, a pergunta foi-me posta, bem mais de uma dezena de vezes, em duas ocasiões da "saison" diplomática lisboeta. A minha resposta foi, quase sempre, um modelo mais ou menos elaborado de um simples "sei lá!", seguido de uma tentativa de previsão da atitude dos protagonistas relevantes desta novela - que há dias parecia de tons brasileiros mas que, nas últimas horas, mostra tonalidades mais mexicanas. 

Da parte desses diplomatas sinto uma genuina perplexidade e interesse, desde logo porque sabem que as ocasiões de crise política são das poucas em que podem ter a certeza de que alguém lê, nas respetivas chancelarias, aquilo que escrevem de Lisboa - essa capital ensolarada e cálida para onde os enviaram, num país ameno e de sorriso triste que, à beira de um flagrante precipício, se dá ao luxo bizarro de fazer piruetas institucionais e se entretem em jogos de gestão do que resta do poder caseiro de decisão. 

Às vezes, desses amáveis interlocutores estrangeiros, pressinto uma interrogação sobre se haverá por aqui a consciência de estarmos a "brincar com o fogo", ao observarem alguns a não conseguirem escapar ao compulsivo e absorvente tropismo de trabalhar para a mera salvação dos seus lugares no pé-de-página da história da paróquia.

Saio sempre pouco alegre destas conversas. Depois, para me auto-sossegar, penso, cá para comigo, que, também eles, esses diplomatas estrangeiros, têm, lá por casa, questões tanto ou mais graves que as nossas. Mas logo caio em mim: com os problemas dos outros posso eu bem...

14 comentários:

Alcipe disse...

Podias escrever-nos o telegrama que farias se estivesses no lugar deles

margarida disse...

Do todo:

A conjuntura não é tão complexa quanto singular. E inspiradora.
Sucede que tal originalidade apenas será devidamente apreciada nos compêndios de História.

Da parte:

E não será por alijarmos fardos alheios o que nos possibilita continuarmos o caminho do nosso calvário?
Ou seremos tão-somente uns grandessíssimos comodistas?

Anónimo disse...

Boa sugestão a de Alcipe.
a) Rilvas

Joaquim de Freitas disse...

Não invejo a posição dos diplomatas portugueses no estrangeiro! Representar um pais à deriva, dotado dum governo sem credibilidade aos olhos do mundo inteiro e, primeiramente, dos Portugueses, um governo que manda pouco ou nada no seu próprio pais, que deve ser difícil de o representar!
Penso particularmente nos embaixadores de Portugal na América Latina, depois do acto "soberano" do Ministro Portas interditando o espaço aéreo português ao avião do presidente da Bolívia, Evo Morales ! Política estrangeira portuguesa , dirigida por um lacaio do Pentágono ! Miséria ! Portugal, que tem tantos dos seus filhos a viver nesse continente! Fica bem evidente que não seria o Ministro Português dos Negócios Estrangeiros que daria o direito de asilo a Snowdem ! A Venezuela, pais independente e soberano, deu-o!

margarida disse...

Nota ao comentário de Joaquim de Freitas, por certo exarado sem ter tido acesso às últimas informações disponíveis, nomeadamente do ministro da pasta, nas quais se clarifica que o avião teve permissão de trânsito pelo território nacional, tendo sobrevoado a zona alentejana, até ao espaço aéreo de Porto Santo.
Sem querer exacerbar uma questão que tem demasiadas características, digamos, técnicas, é bom termos em mente quem são, de facto, os nossos grandes e tradicionais aliados.
E como diz o pragmático: "com os problemas dos outros posso eu bem".
Quanto a traidores, muito haveria a conversar.
A bem da civilização.

patricio branco disse...

começará portugal a ser um país falhado na europa?(ao lado da grecia)será o caso?
quase nunca foi um país exemplar no que respeita à governação e administração, mas agora como que tudo se esgotou, o sistema, os partidos, as funções administrativas, o dinheiro, o bom senso, o investimento, na verdade pt é ainda uma verdadeira democracia ou um simulacro, uma caricatura? etc

patricio branco disse...

há por aqui, nos comentários, uma proposta ou sugestão que apoio...

Joaquim de Freitas disse...

Os três países incriminados fizeram, de facto, marcha atrás rapidamente. A intenção existiu, pelo menos. O que é normal da parte de governos e duma Europa submetida à vontade dos Estados Unidos.
Quanto à "traição" , subentendida no seu comentário, creio que se refere àqueles que espionam vergonhosamente todos os seus aliados e amigos, como se vivêssemos de novo na guerra fria, e que Snowden , um herói dos tempos modernos, denunciou.
Esta espionagem é inadmissível e perigosa para os interesses dos Europeus, não somente para a segurança dos cidadãos mas sobretudo para as suas indústrias. Que os Americanos, aceitem de viver sob a férula do Patriotic Act desde a época de G.Bush , "c'est leur affaire" !

Joaquim de Freitas disse...

O meu comentário das 12.54 respondia ao comentário de Margarida,às 11.39 mais acima. Cumprimentos.

margarida disse...

Os EUA são e serão, até à constituição de uma nova ordem inter-galáctica, os melhores aliados da Europa.
Podíamos abrir uma frente de debate sobre o imenso carinho dos países ditos 'irmãos', mas é fim-de-semana e todos temos mais o que fazer.
Traidor é esse cidadão que se infiltrou numa organização que todos sabem não é exactamente caritativa e monástica e - não vamos ser ingénuos, não? -se dedica a espiar os outros (todos, pois claro), para defender valores supremos. Porque, tantas vezes, o inimigo está dentro.
E eis outro tema denso e complexo para comentários em blogues.
E os países da América Central e do Sul são tradicionalmente hospitaleiros de foragidos à injusta justiça, como se sabe. Pelo menos desde a segunda grande guerra, nein, herrn Freitas?
Mas o senhor Putin, esse paladino da liberdade de expressão, que foi funcionário dos escuteiros do país dele, tanto sabe disso que passa os dias a lavar as manápulas.
Mais realidade: é ver uns filmes.
Está tudo lá.

Joaquim de Freitas disse...

A Margarida de 19:57:

1°- Nenhum povo, por mais rico e poderoso que seja, e por mais sofisticados que sejam os meios tecnológicos de que dispõe, tem o direito de espionar a minha vida privada e prejudicar os meus interesses vitais e os dos meus.
Nenhum povo, em nome dos valores supremos que só ele decide quais devem ser, tem o poder de impedir ou pelo menos dificultar o desenvolvimento do continente onde vivo, a Europa, só por que esta quer seguir um modelo cultural, ético e social diferente.

A Europa pode ser um concorrente e mesmo um aliado, mas deve ser respeitado como tal.

E quem escreve isto é alguém que passou anos e anos em viagem e estágios de meses entre os EUA e a França, em trabalho profissional, numa firma de capitais americanos.

A Europa deve poder desenvolver-se num espirito de "partnership"e não ser submetida aos únicos desiderata dos EUA e da sua géopolítica que visa o controlo do mundo ocidental.
A noção de "aliado" supõe o
respeito dos valores supremos, como escreve, mas que não são sempre os mesmos para os Americanos e os Europeus.
A luta contra o terrorismo devia ter incitado os EUA a ajudar a Europa, e neste caso a França, contra Al Qaïda no Mali. Mas lá não havia petróleo como na Líbia ou no Iraque!

2°- Os povos da América do Sul não são culpados do facto que certos regimes fascistas, no passado, por vezes postos no poder graças a golpes de Estado fomentados pela CIA, terem albergado nazis no fim da guerra de 1945. Alguns, alias, que tinham escapado graças à ajuda do Vaticano. Isto também está nos filmes. Em contrapartida, o assassino de Allende encontrou refugio durante semanas na GB graças a M. Thatcher!

3°- Putin e o KGB correspondem àquilo que mais detesto : a prepotência, a corrupção e o terror policial. A CIA é regida pela mesma doutrina. Mas, repito, que os Americanos aceitem de ser espionados e que as autoridades os espionem, não concede aos seus autores um certificado de democracia.

margarida disse...

Não é o'povo' que faz nada disso, são as organizações criadas em nome deste. E 'democracia' cada vez mais não passa de uma ideia.
Tudo o que escreve está muito bem, apenas se torna lírico, colidindo com a miserável realidade.
Acredita, deveras, que o mundo possa ser diferente, melhor?
Admiro-o e invejo-o.
E depois acusam-me de 'romântica'...

Joaquim de Freitas disse...

Não sei se o Sr. Embaixador vai permitir de continuar esta conversa. Haveria muito para dizer sobre o tema da democracia. O que me parece sem contestação, é que o povo se compõe de pessoas que , em princípio, devem agir em actos livres e responsáveis. Por isso mesmo em Roma, como em Atenas os escravos e as mulheres não votavam. Eram considerados como dependentes dum mestre ou dum marido. Por isso também os radicais recusaram o voto às mulheres que estimavam estar sob o jugo dos padres. Em Roma os mais ricos votavam os primeiros porque se considerava que tinham mais a perder e portanto mais a defender. O seu próprio interesse os responsabilizava. Este é um facto que podemos constatar também hoje.

Quando as questões não o motivam, o povo desinteressa-se. Precisa de estar concernido para descer à rua. Da mesma maneira, é preciso que tenha a impressão que a sua participação na vida política tenha um verdadeiro impacto para que se mobilize. E neste aspecto, em Portugal, há muito para fazer.

Tudo o que precede é coerente com o sentido da palavra poder que significa " ter a capacidade". Para que o povo, este conjunto de pessoas livres e responsáveis, seja efectivamente responsável, é preciso que ele "tenha a capacidade" por um lado de agir, e por outro lado de assumir;, isto é de poder responder. Podemos então passar às questões fundamentais: a quem o povo deve responder? Como colocar um acto político livre e responsável? Que significa para o povo ter a capacidade, ter a capacidade de quê?

Sabemos que para tomar uma decisão responsável é preciso ser-se livre. A condição da responsabilidade é a liberdade , e ter a possibilidade, ser capaz de escolher de colocar ou não este acto. Não há responsabilidade sem liberdade. Mas para poder exercer o seu poder, o povo deve ter acesso à verdade.
Correndo o risco que me acuse mais uma vez de lirismo, desde que a democracia existe, devo admitir que o acesso à verdade e a pesquisa do bem são enviesados. Já em Roma, para conseguir levar o povo, os cônsules falsificavam os auspícios, os senadores impunham aos seus clientes de votar como um só homem, (como em certos partidos hoje!).
As ditaduras e as monarquias faziam a mesma coisa. Mas a democracia, por vezes, transforma-se em demagocracia! E aqui estamos de acordo. Mas é por isso mesmo que devemos reagir e recusar actos dos regimes que sob o nome da democracia e dos seus valores tentam de impor uma ordem perigosa para as nossa liberdades. Para o que resta de democracia.

E mesmo se esta parece estar no seu leito de agonia e uma equipa médica incapaz ou corrompida a envenena todos os dias, o doente, eutanasiado, pode muito bem acordar de maneira violenta e dolorosa para todos.

Helena Oneto disse...

Por falta de tempo, so agora li os interessantíssimos comentários à volta da democracia e da liberdade que este post desencadeou.

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