segunda-feira, agosto 30, 2010

A aposta

No palácio das Necessidades, sede do Ministério dos Negócios Estrangeiros, há um andar considerado mais "nobre", conhecido como o "terceiro andar" (na realidade é o 1º andar, para quem entra pelo largo do Rilvas). Nele têm os seus gabinetes o ministro e um secretário de Estado.

O acesso ao "terceiro andar" pode fazer-se por uma escadaria com corrimão de mármore e um confortável tapete (na imagem, à direita) ou, em alternativa e um pouco mais adiante, por uma escada mais modesta, que circunda um elevador.

Um certo ministro que, há muito, passou lá pelo MNE, decidiu, um dia, limitar o uso regular da tal escadaria a si próprio e ao secretário de Estado, para além dos respetivos visitantes oficiais. Ao que consta, não lhe agradava cruzar-se na escadaria com diplomatas ou pessoal técnico e administrativo, o qual, no seu entender, deveria utilizar as alternativas de acesso existentes.

Talvez por ter percebido que a passagem a escrito de uma tal determinação poderia tornar-se polémica, a decisão do ministro foi espalhada apenas de forma verbal, mas com indicação de ser para cumprir.

Um dia, o ministro cruzou-se na escadaria com dois diplomatas, que aparentemente haviam ignorado a sua determinação. Com ar grave, perguntou-lhes:

- Os senhores não ouviram dizer que eu dei ordens para não utilizarem esta escadaria?

Um dos diplomatas exclamou, em tom baixo, mais para o colega que o acompanhava:

- Pronto! Ganhaste a aposta!

- Que aposta? - inquiriu o ministro, com ar um tanto agastado.

O diplomata esclareceu:

- De facto, senhor ministro, essa ideia da proibição anda por aí. Mas eu apostei com este meu colega que devia ser um boato de algum inimigo seu, que tinha posto isso a correr para lhe prejudicar a imagem. É que eu não conseguia acreditar que o senhor ministro tivesse proibido a utilização desta escada. Mas, afinal, era verdade! Assim, perdi a aposta.

E, voltando-se para o colega, disse:

- Hoje pago eu o almoço.

Não consta dos anais da casa a reação do ministro.

Para a história, diga-se que a proibição se desvaneceu com o tempo, não necessariamente por virtude deste incidente, mas porque se terá provado impraticável. Como é óbvio, quem quiser pode hoje utilizar a tal escadaria.

11 comentários:

patricio branco disse...

um exemplo de arbitrariedade absurda a historia contada no comentário. E tambem um toque de cobardia, ao não assumir por escrito a decisão de interditar essa zona.
Algo quase paranoico por parte do ministro, num diagnóstico feito improvisadamente (a não ser que houvesse outras razões para proibir as escadas, como de segurança).
Correcta a atitude dos 2 colegas que ignoraram as ordens e deram uma lição ao ministro, ridicularizando-o.
boa história exemplar,

Anónimo disse...

Eu sei quem foi o ministro. Não se agora proibe campos de golfe

CSC

Janus disse...

INCRÍVEL!!!..........

Anónimo disse...

Caro Anómimo,

Bem me parecia que era esse ministro.... Só podia....

António Mascarenhas

Unknown disse...

Quase que jurava que essa "ordem" foi passada a escrito e afixada num placard do MNE. Admito que tenha sido uma gozação de algum patusco que a burocracia do MNE tomou por boa.

Anónimo disse...

Isto há cada "maduro"! E há quem os ature!
P.Rufino

Anónimo disse...

Julgo que a interdição é mais antiga mesmo que não fosse aplicada estritamente.
Não era conhecida como a escada dos Embaixadores (visitantes)?

Anónimo disse...

Na minha vida...
Isabel Seixas

Anónimo disse...

também é certo Senhor Embaixador e caros leitores que não devia ser agradével às visitas verem passar por essa escadaria as Sras. Continuas com tabuleiros e tabuleiros de almoços destinados às Senhoras Secretárias do 3º andar..

Anónimo disse...

Caro Anónimo/a,
Entre ver “contínuas com tabuleiros” e levar em cima com um “maduro” daqueles, prefiro as tais senhoras. Era menos indigesto, já que falamos de refeições.
P.Rufino

Mário Machado disse...

Por seu tempo em Brasília o Senhor Embaixador bem deve saber que por aqui proliferam medidas como esta. Todas publicadas e com ostensivas indicações e ninguém estranha.

Um atraso sem dúvidas.

Obrigado, António

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