terça-feira, abril 13, 2010

Açores (1)


Ontem à tarde, percebi melhor o conceito de periferia. Atrasos de aviões, quase nove horas de Lisboa a Angra do Heroísmo, mais de metade passada em aeroportos, ajuda a entender muita coisa. Quando, noutras eras, me empenhei bastante a defender o apoio europeu à nossa ultraperiferia atlântica, estava longe de supor que a iria experimentar desta forma. Há um preço que se paga por este isolamento e distância insular.

Há mais de dez anos que não vinha aos Açores. Impressionam as infraestruturas, o vento da modernidade, um certo ambiente já cosmopolita, embora atenuado por um saudável espírito de "vila".  

Em Ponta Delgada, não resisti e comprei o "Açoriano Oriental", o mais antigo jornal diário português. Olhando a "mancha", fiquei um pouco desiludido: está um jornal igual aos outros, até com um certa elegância gráfica, mas sem nada de singular. Tinha muito mais graça no passado, mas talvez esta evolução seja inevitável.

Uma última nota: andei uma vida a escrever "açoreano". Afinal é com um "i". Nunca é tarde...

7 comentários:

Helena Oneto disse...

Segundo as últimas notícias de Lisboa, ontem foi, para muitos, um dia cheio de desilusões e, aparentemente, para o Senhor também!

Adorava voltar aos Açores. Ando a dizer isto há anos.

Ricardo Alves Gomes disse...

Senhor Embaixador,

Elegi há dias as suas «Duas ou três coisas», que me permiti incluir na minha lista de blogues.

Vários são os "posts" que tenho lido com interesse, não podendo, contudo, deixar de registar e dar nota, de modo especial, ao relato sobre o seu regresso aos Açores, nomeadamente, às Ilhas da Terceira e São Miguel.

Isto, para lhe transmitir que entendo perfeitamente as sensações apreendidas que leva na bagagem, as quais, julgo, desdobam-se em duas questões:

- Só se percebe a realidade insular ultraperiférica do Arquipélago dos Açores quando com os pés assentes nestes torrões de lava e de "Spleen";

- Os ventos da maior aceleração da História, a que temos assistido por toda a parte desde o advento da globalização, também arremeteram o "anti-ciclone", abrindo as Ilhas ao Mundo, com tudo o que isso acarreta, fazendo-se sentir com particular acuidade nos meios mais remotos, onde, do lado das contrariedades, o "perigo" é visto como a importação inevitável dos "contras" estandardizados dos artifícios urbanos e a progressiva perda das "virtudes" identitárias, próprias de comunidades estruturalmente sólidas, tal como as conhecíamos.

Agora, imagine-se, Senhor Embaixador, em que cogita alguém que esteve cerca de 20 anos "no continente" e torna, não às "cosmopolitas e centrais" Terceira e São Miguel, mas ao extremo (literalmente) europeu das Flores e do Corvo, que delimitam a fim do velho continente e indicam o canal da américa... pese embora, ironicamente, esses vulcões adormecidos no meio do Atlântico, à luz da geo-política, constituam pedras basilares da centralidade lusa no contexto intercontinental.

Garanto-lhe que num dia de sol é mais propício tentar cogitar, quando as soberanas imponências naturais imperam e nos levam a crer que o Criador quando fez o mundo passou por aqui, não sem deixar um ónus - a obrigatoriedade de paciência, enquanto o céu não se descobre e torna azul, o verde não matiza e resplandece, e o horizonte-mar não apresenta perspectivas límpidas e vincadas.

Tal como as descrições sociais queirosianas mantêm actualidade, as observações açóricas dos irmãos Bullar, Vitorino Nemésio, Roberto de Mesquita ou Raúl Brandão permanecem incólumes.

Todavia, uma coisa é ter notícias deles, outra, bem mais telúrica, é ter experimentados motivos para ousar acrescentar-lhes um ponto.

Tenho a maior honra em endereçar-lhe o convite por esta via, oferecendo-lhe a franqueza dos meus modestos préstimos.

Aproveito este comentário, em jeito de "feeback" da partilha que aqui veio oferecer, para apresentar a Vossa Excelência, Senhor Embaixador, o protestos da minha mais elevada consideração,

Ricardo Alves Gomes

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Ricardo Alves Gomes: destes seus Açores, envio-lhe um abraço grato pela sua manifestação de atenção a este meu regular desabafo informático. Volto sempre aos Açores com imenso gosto.

Ricardo Alves Gomes disse...

Os Açores estão longe de ser meus...
De resto, aquando da sua descoberta e povoamento, (lá está o factor geográfico), que aconteceu de nascente para poente, sendo primeiro descoberta Santa Maria, em 1432, durante muitos anos a Coroa referia-se "às sete ilhas dos Açores", pois as Flores e o Corvo (Grupo Ocidental) só foram descobertas mais tarde, em 1452, por Diogo de Teive.

Mais, a ideia de "Açores/Região" é algo muito recente. Só com a institucionalização da Autonomia, permitida pela Constituição de 1976é que foram extintos os 3 ex-distritos.

Ainda hoje, não obstante todo um lastro que une as 9 ilhas e que ganhou corpo em vários planos, concorrendo para a "harmonia" e coesão Regional, o certo é que a descontinuidade geográfica por 3 Grupos (de Santa Maria às Flores são cerca de 600 km com muita água pelo meio) nota-se em coisas tão simples como isto:

Em Lisboa, independentemente da ilha de origem, todos se consideram açorianos. Mas cá chegados, cada um deixa de falar em Açores e passa a dizer, "eu sou do Faial, ou da Graciosa" por exemplo.

Significa isto que os açorianos (excepto os micaelenses, por razões entendíveis e fáceis de perceber), primeiro são da sua ilha, depois são portugueses, e só depois é que são açorianos! Se é que se pode colocar a coisa assim.

Para terminar, aclaro, não depreendi das suas palavras no "post" qualquer enfado, antes pelo contrário.

O que tentei dizer no primeiro comentário, entre outros aspectos, foi isto - se sente a realidade ultraperiférica dos Açores estando em São Miguel ou na Terceira, o que não diria se fosse nas Flores ou Corvo...

Daí o "desafio" para quando tornar apontar agulhas para a parcela mais recôndita do Arqquipélago, de preferência num dia solarengo, caso o nosso MNE consiga "negociar" isso ao mais alto nível com São Pedro.

A haver velado enfado, é meu, assumo. Estes ventos, chuvas e nevoeiros (mais intensos este Outono e Inverno) dão cabo da paciência a um cristão.

Mas nem por isso o cristão que ora tecla renega à sua condição de "florentino", nem deixa de acusar uma certa tristeza quando comunga (para não dizer "oferece") uma ideia benquista à Região, e depois vê certas realizações consequentes por vezes
não contemplarem a "sua Florença".

Anónimo disse...

E o Exmo. Embaixador ajuda a pagar as despesas com o advogado para impugnar o concurso? É que muitos de nós somos da geração-500euros e é-nos difícil, se não impossível, conjugar o pagamento da renda de casa e alimentação e propinas com serviços de advocacia, por mais que tenhamos a razão e a lei do nosso lado, está a perceber?

Helena Sacadura Cabral disse...

Senhor Embaixador
Não sei que dizer perante os comentários de gente mais informada do que eu.
Só posso afirmar que conheço os Açores, tenho lá casa de família onde torno todos os anos, vou visitando sempre as várias Ilhas, adoro as gentes e o cuidado com que aquela terra é governada - não sou socialista nem conheço o Dr Cesar - e sempre senti os açorianos como portugueses que se orgulham de ser dos Açores.
Curiosamente, quando lá estou, sinto-me sempre como se ali tivesse nascido!
E esta sensação só a tenho lá, no Alentejo e na Beira. Sou portanto uma felizarda.
Mais, quando me perdem as malas ou os aviões se atrazam e espero horas, irrito-me muito menos do que quando isso me acontece nesta Europa à qual dizem que eu pertenço...

Julia Macias-Valet disse...

Esta historia de "e" e de "i" lembra-me aquela pergunta :
" -Sabem porque é que os alentejanos dizem LETE ?
-Porque tiraram o "I" p'ra prantar no CAFEI !

Os borregos

Pierre Bourguignon foi, ao tempo em que eu era embaixador em França, um dos grandes amigos de Portugal. Deputado à Assembleia Nacional franc...