sábado, abril 10, 2010

1989

Pierre Grosser foi diretor do Institut Diplomatique do "Quai d'Orsay" desde a sua criação, em 2001. Tem uma importante obra publicada em temas internacionais e escreveu, há pouco, um livro fascinante, de que pouco se tem falado, sobre esse ano-charneira, em especial para a Europa: "1989 - L'année où le monde a basculé".

São muitas centenas de páginas, escritas num tom multidisciplinar ambicioso, que podem ler-se espaçadamente, como tenho feito, desde há semanas. Trata da Europa, mas igualmente das suas periferias, indo à raiz histórica das temáticas abordadas e procurando ligá-las nos seus contextos económicos, financeiros, sociais e até ecológicos. Sendo que a queda do muro de Berlim é talvez o pretexto central deste trabalho, o facto dele se alargar a outros domínios e cenários geopolíticos acaba por ter o mérito de relativizar a dimensão da unificação alemã e de nos obrigar a olhar um pouco mais longe.

As obras com grande abrangência transversal têm sempre lacunas. Neste livro, encontrei uma única referência a Francis Fukuyama e apenas duas notas curtas sobre Samuel Huntington. Se, no primeiro caso, "o fim da História" pode ser descartado, no segundo parece-me muito escasso o que foi citado. Mas, a meu ver, mais grave será Grosser nem sequer ter mencionado, uma única vez, nomes como Edward Said e, muito em especial, um autor sem o qual é difícil interpretar o século XX, Eric Hobsbawm. Porquê?

De qualquer forma, o saldo é amplamente positivo: estamos perante um livro muito interessante e muito clarificador. A ler.

5 comentários:

margarida disse...

(gosto de chegar aqui e .. .é outro dia. O salto temporal faz-me sorrir. O simbolismo. A magia.)

Nuno Sotto Mayor Ferrao disse...

Tomo nota desta obra de Pierre Grosser e da sua posição no mundo cultural francês, de que sou um profundo desconhecedor.

Sem dúvida que o ano de 1989 foi muito marcante na cena política internacional com os genésicos acontecimentos da queda do muro de Berlim e da repressão do protesto na Praça de Tiananmen.

Fukuyama fez furor no fim do século XX com a tese que nos citou, mas sem dúvida que a lucidez de S. Huntington e a magistral síntese do século XX de E. Hobsbawm, brada aos céus ignorá-las, em particular pela qualidade da magnífica obra "A Era dos extremos". Talvez, por detrás deste premeditado esquecimento de autores de outras Escolas epistemológicas esteja um excessivo bairrismo intelectual. Com efeito, a qualidade de um verdadeiro historiador mede-se pela riqueza, perspicácia e profundidade das suas sínteses. Se em Portugal A.H. Oliveira Marques foi um dos mestres desta arte, em termos internacionais E. Hobsbawm foi uma referência incontornável!! Tem toda a razão o seu pasmo, Embaixador Francisco Seixas da Costa, pelas ausências destas ancoragens bibliográficas.

Por mim, identifico-me mais com a metodologia e a epistemologia da Escola intelectual francesa, mas, não obstante, acho que devemos estar abertos aos contributos de outras perspectivas.

Saudações cordiais, Nuno Sotto Mayor Ferrão
www.cronicasdoprofessorferrao.blogs.sapo.pt

Anónimo disse...

"Rendo-me ó só sei que nada sei"

A minha esperança em relação ao Sr. é que não se tenha debruçado sobre as seguidoras de Nightingale...

Era para fazer um bacalhau/bombástico, mas vou ficar pelo assado com batata a murro e uns pimentitos...

Tenho pouco que pesquisar...
Oh!Margarida... Help Me
Isabel Seixas

margarida disse...

:) Isabel, confessei-me ignorante desde a primeira hora. Observo e apreendo o possível. Ou o essencial. Ou, mesmo, o suficiente. As escalas são múltiplas, tantas quanto os corações. Somos todos especialistas em alguma coisa. À volta o mundo gira vertiginoso; mantenhamos o equilíbrio. Entre a caneta e o bisturi.

Helena Sacadura Cabral disse...

Maggie e Isabel
Ser especialista de ideias gerais é uma profissão de grande futuro!

Fora da História

Seria melhor um governo constituído por alguns nomes que foram aventados nos últimos dias mas que, afinal, acabaram por não integrar as esco...